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    Troca de mensagens põe em xeque isenção de fiscais da Stock Car

    PAULA CESARINO COSTA
    DO RIO

    29/02/2016 02h00

    Márcia Ribeiro - 11.ago.2013/Folhapress
    RIBEIRAO PRETO, SP, BRASIL, 11-08-2013, 10h: Corrida de Stock Car em Ribeirão Preto. (Foto: Márcia Ribeiro/ Folhapress, REGIONAIS)
    Carros da Stock alinhados no grid para prova em ruas do distrito industrial de Ribeirão Preto

    Entre piadas, brincadeiras e demonstrações de poder, uma conversa de comissários da Stock Car levanta dúvidas sobre a precisão de relatórios e a isenção de decisões que podem interferir no resultado final do campeonato da principal categoria do automobilismo brasileiro.

    A Folha teve acesso a uma troca de mensagens, por WhatsApp (serviço de comunicação eletrônica), de um grupo de comissários e auxiliares que atua no circuito.

    Com funções equivalentes às do árbitro de um jogo de futebol, os comissários (desportivos e técnicos) das corridas de Stock Car têm o poder de aplicar punições durante a prova, excluir ou desclassificar um piloto.

    A categoria é a mais antiga e a mais rica do automobilismo nacional. Criada em 1979, reúne os principais pilotos e tem hoje média de público de mais de 30 mil pessoas.

    Nas conversas, os comissários fazem ameaças e piadas.

    "Vamos desclassificar ele por alguma coisa na próxima etapa...", escreveu o auxiliar de comissário Paulo Ygor Dias em 7 de abril de 2015, referindo-se ao piloto Cacá Bueno.

    Dois dias antes, na corrida em Ribeirão Preto (SP), o piloto havia chamado os "caras da CBA" (Confederação Brasileira de Automobilismo) de "bando de imbecis", em conversa com a equipe que acabou vazando, depois que a bandeirada não foi dada por erro de uma comissária.

    A ameaça não se concretizou na corrida seguinte. O piloto foi suspenso por uma etapa e multado pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva do automobilismo, perdendo a liderança do campeonato.

    Pouco depois, na mesma conversa, o veterano comissário Clóvis Matsumoto, hoje fora da Stock Car, vangloria-se de ter impedido o mesmo Bueno de ser campeão.

    "Bom, na minha época o Cacá foi 3 vezes vice pq eu não estava a fim de deixar ele ser campeão! Kkk", escreveu.

    Ygor confirma: "Eu presenciei essa época do matsu... E tbm não faz muito que ele não foi campeão por uns pontinhos que tiramos dele...". Seguiram-se vários "kkk".

    Bueno foi vice-campeão brasileiro da Stock Car em 2003, 2004 e 2005, além de 2010 e 2015. Ele é pentacampeão da categoria (2006, 2007, 2009, 2011, 2012).

    Em 2004, com base em relatório dos comissários técnicos, os fiscais desportivos desclassificaram os pilotos da equipe Action Power, Cacá Bueno e Thiago Marques.

    Na época, Matsumoto disse que os carros infringiram artigo do regulamento e apresentaram irregularidade no posicionamento da bomba da direção hidráulica. A equipe contestou e recorreu da decisão, que foi mantida, acarretando perda de pontos.

    Foto: Duda Bairros/ Vicar, VENCER

    Bueno considera absurda essa punição. "Vendo essa conversa, me lembro de vários casos em que eles [os comissários] podem ter comprometido o resultado final do campeonato. Principalmente entre 2002 e 2005 e entre 2010 e 2013."

    Em 2010, houve polêmica em algumas etapas, como em Campo Grande (MS), quando quatro pilotos foram desclassificados (Ricardo Zonta, Daniel Serra, Cacá Bueno e Alexandre Negrão) e contestaram a decisão.

    Para o piloto e chefe de equipe Paulo de Tarso Marques, que atuou na Stock Car por 20 anos, essas autoridades acham que têm poder de polícia e não gostam de ser contestadas ou criticadas.

    A CBA argumenta que não é possível um comissário técnico inventar uma punição porque ele apenas fiscaliza se o regulamento é cumprido.

    Paulo de Tarso discorda. Para ele, os regulamentos têm muitos itens e não são precisos, o que dá margem a diferentes interpretações. "É possível provar tecnicamente que uma decisão de um comissário técnico foi errada."

    Para Cacá Bueno, hoje na equipe Red Bull, "é repugnante" o tom das conversas.

    "É um absurdo, porém, infelizmente, não me surpreende. Sempre tive suspeitas."

    Ele defendeu que os envolvidos sejam investigados "e banidos do esporte caso sejam culpados e que se apure se houve envolvimento de confederação e organizadores ou se isso partiu de atitude individual."

    O piloto Xandinho Negrão vê falta de profissionalismo e de treinamento dos comissários. Disse que, em 2010, foi desclassificado em quatro corridas -por motivos questionáveis, em sua avaliação.

    Átila Nunes, que deixou de vencer a etapa de Cascavel (PR) em 2013 por conta de punição, também pediu a profissionalização da categoria.

    Para Nelson Valduga, diretor da CBA, a suspeita é "gravíssima" e será instaurada uma sindicância para apurar os fatos. Mas afirmou que as decisões desses comissários são técnicas.

    Fernanda Freixosa/Vicar/Divulgação
    Thiago Camilo se recupera de Curitiba e fatura Corrida do Milhão. A Corrida do Milhão é mesmo de Thiago Camilo. Neste domingo (16) aconteceu a mais tradicional prova do calendário do Circuito Schin Stock Car e, com boa estratégia e bom desempenho, o titular da Ipiranga-RCM levou para casa o seu terceiro cheque gordo.
    Thiago Camilo se recupera de Curitiba e fatura Corrida do Milhão

    OUTRO LADO

    Tanto comissários como a Confederação Brasileira de Automobilismo (CBA) afirmam que não é possível que os comissários técnicos influam deliberadamente no resultado das corridas.

    O engenheiro Clóvis Matsumoto disse que a conversa foi feita em tom de brincadeira. Foi uma "molecagem".

    Ele afirmou que hoje a Stock Car é muito profissional, que os regulamentos evoluíram e que "não tem pegação no pé, não dá para inventar punições", uma vez que as questões são técnicas.

    Informou que atua na função desde 2002 e que nunca viu "nenhum comissário punir piloto por implicância".

    Paulo Ygor Dias, auxiliar de comissário na Stock Car, também disse que a conversa tinha "tom de brincadeira". Para ele, o trabalho dos comissários é baseado em regulamentos técnicos e é acompanhado pelas equipes.

    Afirmou ainda que Cacá Bueno já teve problemas "com itens em desacordo com regulamentos" em outras categorias. Disse que alguns pilotos ficam questionando todo o tempo, inclusive sobre outros carros. "Assim como ele [Cacá Bueno] xingou a gente [de imbecis], eu posso achar que ele é chato."

    Existem dois tipos de comissários, os desportivos e os técnicos. Os desportivos são os que têm a responsabilidade de aplicar sanções e o fazem baseados também em relatórios preparados pelos comissários técnicos.

    Nestor Valduga, diretor de competição da CBA e presidente do CTDN (Conselho Técnico Desportivo Nacional), disse que vai apurar os fatos. "Instauraremos uma sindicância, embora não tenha havido perda de pontos."

    Para ele, a avaliação dos comissários técnicos é quase um ciência exata. Disse que não há dúvida nas decisões. Ele admite que existe alguma deficiência, mas "nas decisões dos comissários desportivos, porque são subjetivas".

    Esclareceu ainda que Matsumoto é "engenheiro capacitado, com um ótimo currículo e, até hoje, nunca chegou à CBA algo que desabone o trabalho dele". Disse ainda que "Paulo Ygor é auxiliar técnico, não tem nenhum poder de indicar irregularidades técnicas."

    STOCK CAR SOB SUSPEITA - Mensagens de comissários em grupo de Whatsapp indicam que pilotos teriam sido prejudicados

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