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    Campeonato Paulista

    Jovem volante do Santos, Thiago Maia vara madrugadas de sexta rezando

    GUILHERME SETO
    DE SÃO PAULO

    01/05/2016 02h00

    A carne de Thiago Maia não é fraca. Atlético, famoso, bem de vida, o roraimense de 19 anos passa distante da linha dos boleiros ostentadores, que marcam presença em baladas da moda exibindo brincos cravejados de diamantes e correntes platinadas.

    Titular do Santos que disputa a final do Paulista neste domingo (1º) contra o Audax, em Osasco, Maia evita os "pecados" nas suas noites de sexta-feira. Na companhia do centroavante Ricardo Oliveira, pastor da evangélica Assembleia de Deus, ele viaja de Santos para a capital para passarem a madrugada cantando hinos e orando em uma igreja paulistana, ao lado de outros fiéis.

    "Vamos para o monte, um lugar mais alto em São Paulo, e depois chegamos 'varados' para treinar no sábado. Oramos, cantamos hinos, louvamos a Deus da meia-noite às 7 da manhã. Existe muita inveja sobre quem está no futebol, então temos que estar sempre em oração", conta, acrescentando que não fica cansado por isso, mas motivado.

    Paulo Zogaib, fisiologista com passagens por Corinthians e Palmeiras e atualmente coordenador da medicina esportiva do Esporte Clube Pinheiros, não vê maiores problemas com o hábito de Maia.

    "Claro que prejudica a recuperação do corpo. Mas tem o outro lado da moeda, o emocional, o que chamamos de 'efeito placebo'. Ele se sente bem com isso, motivado. Caso ele fosse proibido de fazer isso, provavelmente pensaria que estava traindo Deus ou algo do tipo e ficaria triste. Além disso, como os treinos aos sábados costumam ser mais leves, ele pode compensar ao longo do dia, dormindo na concentração", explica.

    Para Maia, foi a fé que o salvou da rotina sofrida de sua infância e adolescência, quando passou fome e dormiu no chão logo após chegar a São Paulo, aos 13 anos.

    "Morei por um tempo com um casal de amigos na Penha [em São Paulo] e dormia em um colchão de ar, que furou. Eu não tinha dinheiro para comprar cola ou remendo, então dormia nele murcho. Acordava todo dolorido. Nessa época, não sabia cozinhar, e tentei aprender sozinho. Queimei arroz, linguiça e não tive mais o que comer...", relembra. "Mas tudo bem. Jogador de futebol tem que ter história para contar."

    Outra força estruturante para o jogador está em Boa Vista, onde foi criado. Nas férias, ele viaja à capital de Roraima para encontrar seu pai e demais familiares.

    "Não tem muito o que fazer, mas conheço todos os pontos lá. Abro mão de ir para a Disney e para Paris nas minhas férias para ir para Roraima. Eu me sinto bem."

    Lá ele revive os tempos em que jogava futebol na rua, descalço, e andava de bicicleta escondido da mãe, a "rígida" Vanda.

    "São Paulo é muito perigosa. Eu era mais moreno em Roraima, de ficar debaixo do sol, na rua, brincando. Fiquei mais branquinho aqui, de ficar dentro de casa."

    Com multa rescisória de € 50 milhões (R$ 220 milhões) e salário de cerca de R$ 200 mil —muito mais que os R$ 70 mensais que recebia do São Caetano no início de sua passagem pelas categorias de base de clubes paulistas—, hoje ele desfruta do conforto financeiro pagando as passagens aéreas para que os amigos de sua terra natal venham visitá-lo.

    "Já fiquei muito sozinho na vida. Se eu tenho condições de escapar disso hoje, então eu procuro aproveitar"

    Recatado, Maia também se distrai indo à Vila Belmiro assistir aos jogos dos garotos das categorias de base.

    "Eu ficava empolgado demais quando algum [jogador] profissional me assistia treinando. Tento dar uma força para os meninos, porque a vida no futebol não é fácil". " T Maia", como é chamado pelos garotos da base, diz que não gosta de "festas ou baladas."

    Outros apelidos que a garotada lhe dirige são "véio" e "gato". É uma brincadeira comum no futebol: quando um jogador muito jovem impressiona pelo talento, é chamado jocosamente de "gato", em referência àqueles que falsificam documentos para serem registrados como mais jovens do que são.

    Maia diz que é devido à sua beleza, da qual ele é o maior devoto. A todo tempo, ele faz troça ao dizer que é conhecido no clube como "bonito", "lindão", rendendo-se ao "pecadilho" da vaidade.

    "Sou muito vaidoso, mesmo. Às vezes, levo duas horas para me trocar, principalmente escolhendo roupas", diz, apontando Neymar como principal referência estética.

    "Às vezes ele exagera no estilo, mas está sempre na moda. Eu costumo usar preto ou branco, porque eu suo muito. Então, é uma tática minha para esconder."

    Em campo, ele se espelha no meia espanhol Iniesta e no volante e zagueiro argentino Mascherano, do Barcelona, com o qual ele vê semelhanças no poder de marcação. No Santos, Maia é o líder de desarmes, com média de mais de três por jogo. Torcedor do Paris Saint-Germain, ele se vê na Europa com 21 ou 22 anos.

    Sobre o Audax, Maia tem duas análises: a de adversário e a de torcedor de futebol.

    "Temos que tomar cuidado, já perdemos para o Ituano [em 2014].No treino, simulamos um jogo contra eles [Audax] e já foi chato. Imagina no jogo? Eles não guardam posições, o goleiro sai muito da área Fizeram uma campanha maravilhosa. É um estilo muito bonito e impressionante", diz.

    Para ele, o Santos está trilhando um caminho parecido.

    "O Audax lembra muito futebol europeu, com muita troca de passes. O Dorival estudou muito lá fora e está pensando nisso também. Nossa posse de bola tem aumentado cada vez mais [7% em relação à média de 2015, com 57% por jogo]. E o Dorival passa muitos vídeos do Bayern de Munique para a gente, é muito fã do Pep Guardiola."

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