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    João Havelange (1916 - 2016)

    João Havelange, que presidiu Fifa de 74 a 98, morre aos 100 anos no Rio

    DE SÃO PAULO

    16/08/2016 08h55 - Atualizado às 09h40

    O ex-presidente da Fifa João Havelange morreu nesta terça-feira (16) aos 100 anos, no Rio de Janeiro. Ele estava internado desde a semana passada no Hospital Samaritano com pneumonia.

    O ex-presidente da Fifa já havia sido hospitalizado no Rio pelo menos cinco vezes desde 2012. A mais recente foi há pouco mais de um mês, quando ficou internado entre os dias 2 e 5 por causa de um quadro de pneumonia.

    Em uma nota curta, o Hospital Samaritano informou que o ex-cartola "faleceu no início da manhã de hoje" e que se "solidariza com familiares e amigos do dirigente esportivo". A causa da morte não foi informada.

    Já o Fluminense decretou luto e ofereceu o salão nobre do clube para o velório. Havelange foi atleta e torcedor do tricolor carioca.

    Em 2014, Havelange ficou no hospital em razão de uma forte gripe —recebeu tratamento de antibióticos na veia.

    Dois anos antes, o ex-dirigente também esteve internado por dois meses por causa de uma infecção. Neste período, o ex-presidente da Fifa foi duas vezes para a unidade coronariana do hospital.

    TRAJETÓRIA

    Política expansionista, busca por mercados pouco explorados, alianças questionáveis, escândalos e um pesado (e sujo) jogo político de bastidores, marcas das duas décadas e meia de administração Havelange, continuaram por anos presentes no órgão.

    Único presidente não europeu da história da Fifa, o ex-cartola brasileiro dobrou o número de seleções na Copa do Mundo e criou os Mundiais de categorias inferiores para cumprir a promessa que lhe assegurou vários votos na eleição de 1974: dar espaço para países subdesenvolvidos.

    Joseph Blatter fez o mesmo. Viu no futebol feminino um grande filão, fez nascer competições globais sub-17 e sub-20 para mulheres e entregou a organização delas para nações do porte de Trinidad e Tobago, Tailândia e Nova Zelândia.

    Também estendeu os tentáculos da Fifa para o Mundial de Clubes e o futebol de areia, como seu antecessor havia feito com o futsal.

    A última escolha de sedes da Copa do Mundo mostra como Havelange está enraizado na Fifa. Ao eleger Rússia e Qatar para 2018 e 2022, a entidade repetiu (de forma mais pesada) o que havia feito com os EUA em 1994: escolheu quem tinha dinheiro e vontade de investir no futebol.

    O processo deflagrou denúncias de possível compra e venda de votos. Foi o que também aconteceu na reeleição mais recente de Blatter, no ano passado —quando ainda era presidente, antes dos escândalos de corrupção que devastaram os comandos das principais entidades do continente americano e da Fifa. O oposicionista Mohamed Bin Hamman foi acusado de ter praticado "jogo sujo" no pleito.

    Foi justamente Havelange quem iniciou a era de grandes disputas pela presidência da Fifa. Antes dele, o processo eleitoral era quase como um duelo de lordes.

    Para conquistar o cargo, o ex-cartola utilizou todas as armas que tinha em mãos.

    Presidente da CBD (Confederação Brasileira de Desportos), arranjou uma partida da seleção brasileira, que era representada pelo Atlético-MG, com a Iugoslávia. Com isso, a equipe europeia conseguiu zerar os jogadores suspensos para a disputa da Eurocopa.

    Também cobrou cachê abaixo do normal para um amistoso contra a Tunísia e organizou, em 1972, uma versão reduzida da Copa do Mundo, em que pagou valor acima do mercado para trazer ao Brasil seleções de países periféricos do mundo da bola.

    Para sustentar a campanha de Havelange à Fifa, a CBD fechou aquele ano com deficit semelhante ao custo da sede da entidade, levantada pelo dirigente em 1966 e que carregava seu nome.

    "O senhor Havelange está realizando uma campanha política como se estivesse disputando a presidência dos Estados Unidos", afirmou Stanley Rous, antes de ser derrotado.

    Mal sabia ele que aquela eleição ditaria os rumos da Fifa até os dias atuais.

    Cronologia - Havelange

    100 ANOS NA SOLIDÃO

    Havelange visitou 186 países, atravessou de carro a fronteira entre as duas Alemanhas na era da Guerra Fria e comandou a Fifa por mais de duas décadas (1974-98) durante a transformação do futebol em uma indústria bilionária.

    Nos últimos anos, não escondia de ninguém que pretendia comemorar seu centenário na tribuna do Maracanã assistindo à abertura da Olimpíada.

    Maior cartola da história do esporte brasileiro, João Havelange completou 100 anos em maio bem longe dos holofotes, preferindo o isolamento. Sem aceitar convites para eventos públicos, ele passou o dia com familiares no seu apartamento em Ipanema, zona sul do Rio.

    "Ele não quer contato com ninguém. O mundo deu voltas. O doutor João quer ser esquecido", afirmou à época Irene Lima, secretária particular do dirigente há 56 anos.

    Com problemas de locomoção, o carioca filho de belgas passou seus últimos dias de vida em casa, realizando sessões de fisioterapia e evitando encontrar amigos.

    Desde 2011, Havelange optou por se afastar da vida pública após autoridades começarem a revelar oficialmente sua relação com o escândalo da ISL, antiga empresa de marketing da Fifa acusada de repassar propinas a cartolas.

    Na época, o ex-atleta de polo aquático (disputou os Jogos de 1936 e 1952) renunciou ao cargo de integrante do COI (Comitê Olímpico Internacional) temendo ser banido. A entidade queria analisar um relatório elaborado pelo Comitê de Ética sobre o caso ISL.

    Por consequência, deixou de ser membro do conselho executivo do Comitê Organizador da Rio-2016. Ainda é membro nato do COB (Comitê Olímpico do Brasil).

    PRESTÍGIO EM QUEDA

    A partir daí, o prestígio do cartola despencou. No ano seguinte, em 2012, a Justiça da Suíça concluiu que o assunto era de interesse público e revelou que ele e Ricardo Teixeira, seu ex-genro e então presidente da CBF, receberam propinas milionárias em vendas de direitos de mídia de torneios da Fifa -cerca de R$ 45 milhões.

    Em 2013, Havelange renunciou à presidência de honra da Fifa. Dias depois, relatório assinado por Hans-Joachim Eckert, presidente da câmara de adjudicação do Comitê de Ética da entidade, classificou de "reprovável" a conduta do cartola no caso ISL e disse que o dinheiro teria que ser devolvido aos cofres da entidade, o que não ocorreu.

    Após deixar COI e Fifa, o cartola praticamente desapareceu. Começou a enfrentar problemas de saúde, parou de nadar diariamente e passou a conviver com críticas.

    Em 2015, o Botafogo passou a chamar de Nilton Santos o estádio olímpico erguido para o Pan de 2007 que levava o nome do dirigente. Dona do espaço, a prefeitura aceitou, embora tenha mantido o decreto que nomeava o local.

    O nome do cartola na arena também é omitido pelos organizadores dos Jogos do Rio. No site do evento, eles chamam o Engenhão apenas de Estádio Olímpico.

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