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    Após cirurgia, Arthur Zanetti repensa adeus por feito em Tóquio-2020

    PAULO ROBERTO CONDE
    DE SÃO PAULO

    25/09/2016 02h00

    Na manhã gelada da terça-feira (20), o técnico Marcos Goto confere a elasticidade e os saltos de um sem número de ginastas mirins no ginásio que comanda no número 2680 da av. Presidente Kennedy, em São Caetano do Sul, na Grande São Paulo.

    Seu principal pupilo o observa, mas distante do tablado e do aparelho que o projetou no cenário esportivo nacional e internacional.

    Arthur Zanetti, 26, está recostado à parede. Em vez dos trajes típicos de ginasta, veste moletom e calça jeans.

    Não se trata de rebeldia ou folga. Ele está proibido, até janeiro, de chegar perto das argolas que lhe renderam, respectivamente, ouro e prata nos Jogos Olímpicos de Londres-2012 e do Rio-2016.

    Zanetti se submeteu a uma artroscopia no dia 25 de agosto para corrigir rompimento de tendão no ombro esquerdo. Na intervenção de uma hora e meia, o médico Benno Ejnisman raspou os fiapos de tendão remanescentes e pregou o tecido no osso de novo.

    No local da operação é possível ver quatro pequenos furos, que lembram o ginasta da dor que sentiu antes do Rio e de sua real condição agora.

    Acostumado a fazer reversões, crucifixos e elevações nas argolas, ele está limitado a sessões de fisioterapia e leves exercícios de amplitude e força. "Só consigo fazer isso, ó", afirma, ao elevar o braço esquerdo à frente do peito.

    Em 2010, ele já havia feito o mesmo procedimento, entretanto no ombro direito.

    A inatividade momentânea de agora lhe rendeu acréscimo de dois quilos —dos 62 kg habituais pulou para 64 kg.

    Goto sabia da gravidade da lesão no ombro do pupilo antes dos Jogos do Rio, mas ele e a fisioterapeuta Maria Eugênia Ortiz fizeram uma espécie de pacto. Resolveram não dizer ao atleta, que amenizava as dores à base de anti-inflamatórios —"eu achava que era uma dorzinha".

    "Não daria para fazer uma cirurgia a dois meses dos Jogos do Rio. Ficamos quietos", confidencia o técnico.

    Zanetti competiu na Olimpíada com ligamentos rompidos e o tendão descolado do osso. Ainda assim, terminou em segundo, atrás do grego Eleftherios Petrounias.

    A cirurgia feita apenas quatro dias após o fim do megaevento, tomada em consenso, poderia definir que rumo sua carreira tomaria. Antes mesmo de ela ser definida, ele já cogitava uma aposentadoria.

    "Passava de tudo na minha cabeça. Treinar por treinar eu não queria. Cheguei a pensar que depois do Rio iria me aposentar, não queria mais. Depois voltava atrás", lembra, sentado na sala onde faz fisioterapia no ginásio.

    A medalha reacendeu um pouco da velha resolução.

    E a faca, que poderia atrapalhar-lhe os sonhos, contribui para empolgá-lo. Zanetti acredita que a pausa veio em um momento propício para alguém cujas últimas férias foram gozadas em 2012.

    Uma conversa sincera com Goto também ajudou a demover qualquer ideia de aposentadoria. "Disse que ele ainda tem muito chão pela frente. 30 anos [idade que Zanetti terá em Tóquio] é o auge da força do homem. Ele vai disputar medalha tranquilamente", conta o treinador.

    TRÍPLICE COROA

    A chance de conquistar uma terceira medalha olímpica é o maior combustível para resgatar a motivação de Zanetti. Simplesmente porque, se o fizer, escreverá seu nome na história do esporte.

    A prova de argolas faz parte do programa dos Jogos desde a primeira edição, em Atenas-1896. Ficou ausente só quatro vezes (1900, 1908, 1912 e 1920).

    Ao longo destes 120 anos, nenhum ginasta subiu ao pódio em três ocasiões na especialidade. Zanetti quer ser o pioneiro. Até hoje, ele e outros 12 atletas amealharam duas medalhas no aparelho.

    "Sem dúvida é uma motivação. Três medalhas em três edições de Olimpíada, será fantástico", diz o paulista.

    Goto é mais enfático. "Nosso objetivo é sempre fazer história. Poucos atletas no país têm três medalhas em três Olimpíadas diferentes. Queremos isso", acrescenta.

    Para não debilitar um corpo já flagelado por lesões, a dupla quer iniciar o ciclo em um ritmo moderado.

    Nos primeiros meses de 2017, os treinos aos sábados, cumpridos religiosamente nos últimos dois anos, não serão mais tão frequentes.

    Competições serão escolhidas com ainda mais rigor porque, segundo Goto, a ideia é "não forçar a barra" e crescer nos últimos dois anos do ciclo. Ele também quer que o pupilo treine outros aparelhos e não apenas argolas, como foi nesse ano de Rio-2016.

    O Mundial de 2017, em Montréal (CAN), será disputado com discrição, e os esforços acabarão dirigidos para a edição de 2019, em Stuttgart (ALE), classificatória para Tóquio-2020, e para o Pan de Lima, no mesmo ano.

    Zanetti afirma que deseja obter os bicampeonatos do Mundial (já foi ouro em 2013) e do Pan (venceu em 2015).

    Enquanto não pode se pendurar nas argolas para começar a busca por eles, pelo menos uma medalha ele já garante em seu peito.

    "Vou tatuar a medalha de prata que conquistei no Rio. É um marco do que fiz e do que farei na minha vida."

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