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    Tragédia em voo da Chapecoense

    Moradores de Chapecó lotam estádio e cantam em memória às vítimas do voo

    JULIANA GRAGNANI
    ENVIADA ESPECIAL A CHAPECÓ (SC)

    01/12/2016 02h00

    Os gritos de guerra da Chapecoense davam conta de que o time estava lá, jogando. Da arquibancada, os torcedores gritavam "Força, Chape!", "É campeão!", "Time de guerreiro", mas, no lugar dos jogadores do clube, estavam seus familiares, chorando sua perda.

    A noite desta quarta (30) foi iluminada por milhares de torcedores que fizeram vigília na Arena Condá, em Chapecó (SC), erguendo seus celulares enquanto se abraçavam.

    A homenagem era para os 71 mortos na queda do avião que levava o time da Chapecoense, delegação e jornalistas na madrugada desta terça-feira (29), na Colômbia.

    Gritos de guerra foram cantados espontaneamente: "Vamos, Chape, nós te apoiaremos até morrer". O estádio, com capacidade para 22.600 pessoas, lotou, todo verde.

    Os cantos reverberaram no estádio por uma hora, e então os torcedores fizeram um minuto de silêncio e assistiram a uma cerimônia religiosa. Vibraram com a volta olímpica das crianças da escolinha da Chapecoense e dos jogadores que não estavam no voo e de Fabiano, que foi do clube e está agora no Palmeiras.

    Raul Arboleda/AFP
    People take part in a tribute to the victims of a plane crash in the Colombian mountains that killed 71 and virtually wiped out the Brazilian football team Chapecoense Real, at the Atanasio Girardot Stadium in Medellin, Colombia, on November 30, 2016. Colombia was investigating Wednesday what made a charter plane crash into the country's northwestern mountains, killing 71 people including most of a Brazilian football team and 20 journalists. / AFP PHOTO / STR / RAUL ARBOLEDA ORG XMIT: RAM023
    Menino acende velas em homenagem às vítimas do acidente com a delegação da Chapecoense

    No centro do gramado, onde havia um altar (com a taça do Campeonato Catarinense, conquistada neste ano), familiares se emocionavam.

    De joelhos, amparada pelo marido, a advogada Emanuele Schardong, 28, estava aos prantos. Filha de Fernando Schardong, narrador da Rádio Chapecó, ela olhava em direção à cabine dele, com a luz acesa. "Não dá para acreditar que é verdade", dizia ela, que, com a família, se mudou do Rio Grande do Sul para Chapecó por causa do trabalho do pai, em 2006.

    Essa onda verde já havia tomado a cidade pela tarde, mas com o verde veio também o preto, de luto. O simples "oi, tudo bem?" perdeu sua função fática: não, não está tudo bem, dizem os moradores de Chapecó, cidade encravada no oeste catarinense.

    Desamparados, os moradores vestiram a camisa do time e penduraram símbolos de luto em suas casas e comércios. No carro de bombeiros, um detalhe: faixas pretas nos retrovisores.

    Em um hotel, atendentes confeccionam pequenos broches pretos e verdes para colocar na lapela. Manequins não são mais visíveis nas vitrines, cobertas por largas faixas de luto. Quem não está com a camisa do time dá um jeito de usar algo verde.

    "Meu filho de quatro anos me perguntou:'mãe, a Chape morreu?'. Eu não falei nada para ele, mas ele está vendo tudo que está acontecendo", lamentava, na tarde desta quarta (30), a professora Cristiane Moreira, 37, vestindo a camisa do time, com Leonardo no colo, também usando a sua. Ao falar sobre a tragédia, ela começou a chorar, cobrindo os olhos com óculos escuros.

    Se parte da cidade está em silêncio, a região no entorno da Arena Condá é só ruído. Um trânsito atípico surge ali, onde torcedores se reuniram desde cedo, sem saber o que fazer. Penduram homenagens nas grades, passam horas apenas observando o gramado, chorando.

    Jogadores

    No vestiário, familiares dos jogadores mortos no acidente recebem atenção de profissionais da saúde. Mais de 200 pessoas já foram atendidas.

    Quando os portões da ala sul do estádio se abriram, às 15h, com a chegada de carreta escoltada por policiais, a torcida correu em direção ao portão. Ouviam-se gritos de "é só uma simulação". É que alguns dos torcedores chegaram a pensar que já se tratava da chegada das vítimas.

    Segundo a assessoria do clube, os corpos serão trazidos a Chapecó, onde haverá uma homenagem, e depois levados para suas cidades, se assim for o desejo dos familiares. Ainda não se sabe quando isso ocorrerá.

    "De repente, por causa desses filhos amados, Chapecó apareceu no cenário", diz Maria Helena Franco, professora titular da PUC-PR e coordenadora do laboratório de luto da universidade. "As pessoas ficam desorientadas. E as crianças vão viver talvez sua primeira perda importante. É essencial que esse sofrimento seja validado, reconhecido."

    "A gente fica sem chão", diz o estudante Ezequías Weber, 14. "Meus pais me acordaram, ligamos a TV e ficamos assistindo. Depois, na escola, oramos para que encontrassem mais sobreviventes."

    "Essa daí nem queria ver TV", fala o aposentado Jodelcir Pereira, 64, apontando para a neta, Larissa, de 11 anos. Ela ouve o avô e responde: "É que a Chapecoense sempre esteve lutando e agora... isso". A irmã de um ano e seis meses, Mirella, brinca com velas em cima de uma caixa de areia, homenagem improvisada no estádio.

    Foi na escolinha da Chapecoense que o jogador de futebol João Antonio Appi, 18, começou a praticar o esporte. De repente, perdeu os ídolos. Estava em Mogi Mirim (SP), onde joga no centro de treinamento, quando soube da notícia. "Torço para a Chapecoense desde que nasci", diz. "A tragédia pode ser uma oportunidade para os jovens jogadores do time ajudarem a reerguê-lo. Seria honroso."

    Colaborou RAFAELA MENIN

    Tragédia em voo da Chapecoense

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