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    Aposentado, Elano diz que CBF precisa ouvir jogadores para o bem do futebol

    EDUARDO RODRIGUES
    DE SÃO PAULO

    18/12/2016 02h00

    Sentado em uma cadeira na sacada de seu prédio em Santos, Elano decidiu que era hora de encerrar a carreira de jogador e seguir o caminho que indiretamente já fazia dentro de campo: o de auxiliar técnico. Aos 35 anos, o ex-meia teve trajetória vitoriosa no futebol, onde ganhou praticamente tudo que disputou em clubes e na seleção.

    No mesmo assento que tomou a resolução de parar, revelou à Folha que a única mágoa que teve nos 15 anos de carreira aconteceu no clube pelo qual ele tem o maior carinho, o Santos. Também criticou a CBF e pediu mais diálogo para a entidade que comanda o futebol nacional.

    "A CBF, às vezes, toma decisões em três quatro [pessoas]. Eu acho que alguns atletas precisam estar juntos para serem ouvidos, os treinadores, os presidentes"

    Ao se despedir dos gramados como jogador, Elano diz que ter uma lamentação na carreira: não conseguir jogar com o ídolo Romário.

    *

    Folha - O que te fez pensar em parar de jogar?

    Elano - Eu tinha uma proposta para sair. Equipes do Brasil e um ou dois times de fora no ano passado, mas eu não queria mais largar o Santos. Eu já tinha saído três vezes e queria permanecer aqui como atleta. Este ano o presidente [Modesto Roma Júnior] me fez o convite para eu continuar trabalhando no clube.

    Ele me ofereceu um cargo na base do clube, o que seria muito bom, mas falei: 'presidente, o meu desejo é trabalhar como auxiliar e posso estar perto da base tentando ajudar o Dorival'. Então, a decisão de eu parar veio de uma situação fantástica de permanecer no clube.

    Como foi a decisão?

    Recentemente, fui jantar com o presidente novamente e tinha de decidir até 4 de dezembro, o que seria meu último jogo do Brasileiro. Fiquei aqui [na sacada do prédio] umas três, quatro noites fazendo orações. Uma madrugada estava orando e olhando para a frente e aí veio muito concreto no meu coração de eu ser auxiliar. Levantei no outro dia, liguei para o presidente e falei 'eu aceito'.

    Quer virar técnico?

    Eu quero me preparar. Requer tempo. Se no futuro eu tiver uma grande oportunidade, tudo no seu tempo, sem pular etapas, eu não descarto ser treinador.

    O que mudaria no futebol?

    A profissionalização dos árbitros acho extremamente importante. A tecnologia no pênalti, no impedimento, para que um time não seja prejudicado. A gente sabe que não é difícil, tem coisa que é simples, mas que tem que vir de cima para baixo. Nós que somos atletas tentamos, mas não conseguimos mudar, porque não temos o poder.

    Temos o poder de se manifestar, de falar, um poder muito grande de se unir e mudar, mas a hora de bater o martelo não somos nós. Tem o presidente, o vice, o diretor, os conselheiros, muita gente que coordena. Eu faço até um apelo: nós atletas temos que continuar próximos mesmo quando acaba a carreira da gente. O futebol precisa da gente. Se temos algumas ideias e achamos que vai ser positivo para o torcedor, para o nosso clube, para o futebol, nós temos que lutar por essas posições.

    Quais as diferenças entre o técnico europeu e o brasileiro?

    O treinador europeu tem mais controle sobre o clube. Ele tem toda autoridade de fazer aquilo que ele entende dentro do clube. Já no Brasil os treinadores têm dificuldade para administrar esse trabalho fora do campo. Infelizmente, a gente só vê aqueles treinadores que ganham, que dão certo, mas trabalhei com alguns que não ganharam tanto e foram positivos pra caramba para mim.

    Recentemente, Vanderlei Luxemburgo e o Renato Gaúcho disseram que não tinham nada para aprender lá fora.

    Não concordo. Há muita coisa para aprender sim. Sempre há coisas para a gente aprender em qualquer lugar. A Europa tem muita coisa boa.

    O que você pensa sobre a CBF?

    Eu acho que ela pode contribuir de forma melhor para os clubes. O diálogo é importante. A CBF, às vezes, toma uma decisões em três quatro, ou só entre eles. Eu acho que alguns atletas precisam estar juntos para ser ouvidos, os treinadores, os presidentes. Tem que haver essa harmonia.

    Leva mágoas de alguém?

    Não. Não tenho mágoa de ninguém nem de nada. Um fato que me deixou assim... Foi quando eu saí do Santos [em 2012] para o Grêmio. Eu achei que nunca mais voltaria [para o Santos]. O ano seguinte, para mim, foi muito doloroso. Eu senti bastante aquilo. Desde que voltei, depois daquele um ano no Grêmio, já estava resolvido [com o Santos], estava em paz.

    Mas foi um baque naquele momento que eu saí, foi muito triste da maneira que aconteceu.

    Quais problemas foram esses?

    Eu convivi com o clube aqui em 2000 e vi uma dificuldade muito grande e vi coisas parecidas [em 2012]. E eu comentei: 'Vocês [diretoria, na época presidida por Luiz Álvaro de Oliveira] estão fazendo coisas que podem prejudicar o clube no futuro e eu não concordo com isso'. Eu estava passando por um problema, passei a eles e não ofereceram ajuda.

    No dia seguinte o meu salário estava no principal jornal aqui de Santos. Eu sentei com eles e falei que eles não estavam sendo sinceros nem homens comigo. E um dos funcionários que trabalhava no Santos há três meses falou para mim que eu não poderia fazer nada e nem falar, porque o Santos me pagava em dia.

    Aí eu falei 'você está aqui há três meses. Você nem sabe como é a história do clube. Você não tem esse direito de falar isso para mim. Levanta dessa cadeira que você está sentado. Olha para aquele outro lado, que é o campo sintético. Eu cheguei daquele lado lá. Hoje você está sentado ai balançando, bonitão, debaixo do ar-condicionado. Eu não posso ter construído tudo isso aqui, mas pode ter certeza que dez tijolinhos desse hotel eu ajudei. Eu sou funcionário do clube que faço bem pelo clube. Vocês estão fazendo mal para um funcionário. Vocês daqui dois anos não estão mais aqui, e o clube vai continuar'.

    E aconteceu. A bomba que estourou, as contratações que fizeram e aí o Santos está.

    O que gostaria de ter feito e não fez?

    O que eu não consegui foi ter jogado com o Romário. É que eu joguei com todos. Com o Ronaldinho Gaúcho, o Ronaldo, o Kaká, o Robinho, o Neymar, o Rivaldo, o Cafu, o Roberto Carlos, o Alex, o Adriano. Só faltou o Romário.

    -

    RAIO-X

    NASCIMENTO
    14.jun.1981 (35 anos), em Iracemápolis (SP)

    CLUBES
    Santos, Flamengo, Grêmio, Shaktar (UCR), Manchester City (ING), Galatasaray (TUR) e Chennaiyin (IND)

    TÍTULOS
    Pelo Santos: Libertadores (2011), Brasileiro (2002/2004); Pela seleção brasileira: Copa América (2007) e Copa das Confederações (2009)

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