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    Futebol prospera em meio a grave crise financeira na Venezuela

    ALEX SABINO
    DE SÃO PAULO

    20/03/2017 02h00

    Juan Barreto/AFP
    Brazilian Chapecoense Niltinho (R) vies for the ball with Juan Arango of Venezuelan Zulia Fc during their Copa Libertadores football match in Maracaibo, Venezuela on March 7, 2017. Chapecoense plays its first Libertadores Cup match with 22 new players, since November 2016 airplane tragedy. / AFP PHOTO / JUAN BARRETO ORG XMIT: VEN1473
    Juan Arango, do Zulia, da Venezuela, durante partida contra a Chapecoense, na Libertadores

    A Venezuela vive uma grave crise social e econômica. Mas enquanto a inflação chegou aos 800% ao ano e o Produto Interno Bruto recuou 18,6% em 2016, a liga de futebol do país vive o melhor momento de sua história.

    A média de público cresceu, ídolos como o meia Juan Arango foram repatriados, os direitos de televisão para o campeonato nacional nunca valeram tanto e, a partir da próxima temporada, o torneio será organizado pela associação do Futebol Venezuelano (FutVE), a liga de clubes. Empresários compraram equipes e começaram a investir na infraestrutura. Tudo isso por causa do dólar.

    "Os presidentes dos times, na maioria, são jovens empresários com uma crença no país e que apostam no crescimento do futebol", disse George Antar à Folha. Ele é presidente da FutVE e dono do Deportivo La Guaira.

    A evolução é turbinada pela oportunidade financeira. Por decisão do governo, os clubes foram autorizados a comprar a partir de 2016 dólares pelo câmbio oficial do Cencoex (Centro Nacional de Comércio Exterior). O mesmo já acontecia nas ligas profissionais de basquete e beisebol. É uma chance para os empresários obterem a moeda americana pela cotação oficial e depois colherem os lucros no mercado paralelo.

    Pelo índice da Cencoex, US$ 1 compra 704 bolívares, a moeda venezuelana. No mercado paralelo, usado ilegalmente por quase todos os moradores do país, varia entre 2,8 mil e 4,2 mil bolívares.

    Dois donos de clubes disseram à Folha que a diferença tornou o futebol uma área atrativa para qualquer empresário na Venezuela. É possível recuperar o investimento e lucrar em menos de seis meses. Os direitos de transmissão dos jogos deste ano foram vendidos por US$ 4 milhões e pagos na moeda americana. Na conversão pelo câmbio oficial, os clubes dividiriam 2,8 bilhões de bolívares. Pelo paralelo, o valor saltou para até 16,8 bilhões de bolívares.

    Disseram que eu estava na pior - Futebol venezuelano cresce em meio a crise; investimentos, em bilhões de bolívares

    "Há os direitos de televisionamento, as premiações da Confederação Sul-Americana e, principalmente, as vendas de jogadores para o exterior. Tudo isso é em dólar. E um dólar que pode ser convertido rapidamente em bolívares no mercado negro. Se você tem bons contatos, pode ainda conseguir apoio de governos estaduais e locais", disse um dono de equipe sob anonimato por temer represálias do presidente Nicolás Maduro.

    Um dos exemplos é o Carabobo, que participou da segunda fase da Libertadores. A Fundaporte, autarquia do governo de Carabobo, tem participação na equipe, mas o dono é Jimmy Ayoubissa, também proprietário de sete empresas registradas em Miami.

    "O empresário que está no futebol venezuelano vê que esta é uma área com muito potencial", afirma Antar.

    Nas quatro primeiras rodadas, a média de público foi de cerca de 4.400 pessoas. É a melhor marca desde que o torneio se tornou profissional, em 1957. A média do Estadual do Rio em 2016 foi de 3.905 pagantes. As voltas de jogadores que passaram pela seleção venezuelana como Yohandry Orozco, Maestrico Gonzalez e Juan Falcon também chamaram a atenção.

    Média de público - Em milhares de torcedores

    Nenhuma contratação, porém, foi mais badalada do que o retorno ao país de Juan Arango, 36. Com 127 jogos pela seleção e 23 gols, ele é o maior jogador da história do futebol local, e também foi seduzido pela possibilidade do lucro no câmbio. Desde 2015, é um dos acionistas do Zulia, ao lado do ex-técnico da Venezuela César Farías.

    "Há um trabalho de base, não apenas a questão financeira. Nós queremos crescer e criar um vínculo com as pessoas", disse Farías, hoje técnico do The Strongest (BOL).

    Apesar do fluxo de capital privado, a participação do poder público está vivo na ligação com dirigentes. Adelis Chávez, presidente do Zamora, é irmão do presidente Hugo Chávez, morto em 2013.

    Um benefício a longo prazo para o futebol local é o aumento no investimento nas categorias de base.

    Em janeiro, o Atlético Venezuela vendeu o volante Yangel Herrera para o Manchester City (ING) por 2 milhões de euros. A negociação rendeu ao clube 8,9 bilhões de bolívares (no paralelo). A ajuda de custo média dos atletas da base no país é 63 mil bolívares por mês.

    No futuro, o boom pode render -além de dinheiro para os empresário- uma evolução para a única seleção que disputa as eliminatórias da América do Sul a não ter conseguido se classificar para uma Copa do Mundo.

    Editoria de Arte/Folhapress
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