• Esporte

    Sunday, 28-Apr-2024 23:04:12 -03

    Campeonato Brasileiro 2017 - Série A

    Inquestionável no Corinthians, Fábio Carille diz que unanimidade o assusta

    ALEX SABINO
    DE SÃO PAULO
    LUCIANO TRINDADE
    DO "AGORA"

    28/07/2017 02h00

    Marcelo Justo/Folhapress
    Técnico do Corinthians Fábio Carille durante entrevista no CT do clube
    Técnico do Corinthians Fábio Carille durante entrevista no CT do clube

    Fábio Carille, 43, tem viva na memória a primeira experiência como treinador. Foi assustadora. Interino em 2010, teve de dar instruções para o Corinthians que tinha Ronaldo e Roberto Carlos.

    "Ficava pensando: 'o que vou falar para esses caras?'", relembra sete anos depois.

    Em outro nível, ele admite, em entrevista à Folha, ser assustador o que vive hoje. Efetivado sob desconfiança no final de 2016, se tornou unanimidade. Campeão paulista, líder do Brasileiro e classificado para as oitavas da Copa Sul-Americana, Carille diz ser abordado na rua por torcedores de outras equipes.

    A solução que encontrou para isso foi passar a maior parte do dia no CT do clube. Chega antes das 8h e não tem hora para ir embora.

    Homem de hábitos simples, ligado à família e com sonhos de colocar em prática projeto social em Sertãozinho (335 km de São Paulo), conta ter um desejo para o futuro: trabalhar no Japão. Não por causa do futebol. Quer viver a cultura oriental.

    "Não agora", deixa claro.

    Por enquanto, tenta ampliar a invencibilidade de 31 jogos do Corinthians, a segunda maior da história do clube.

    *

    Folha - Como é ser uma unanimidade?
    Fábio Carille - A unanimidade me assusta. Impressiona que não são só os corintianos elogiando. Há torcedores de outros times que chegam em mim, querem tirar foto, autógrafo. Falam: "torço para outro time, mas parabéns pelo seu trabalho, pela sua conduta". Prefiro não pensar nisso. Por isso entro no CT às 7h30 e depois não tenho horário para sair, vou direto para casa.

    Fala-se que todos os candidatos à presidência do Corinthians podem chegar a consenso para renovar seu contrato, não importa quem ganhe a eleição em 2018.
    É difícil chegar a esse consenso. Mas analisando tudo o que acontece, é natural. Qual presidente não vai querer dar continuidade a um trabalho com tudo o que aconteceu até agora? Muito se falou que neste ano o Corinthians não ia ganhar nada, que eu não ia durar três jogos, que era sério candidato a cair no Brasileiro. Nada afetou minha convicção, minha ideia de trabalho. É natural a renovação de contrato. Se vai acontecer, não sei.

    Em que momento você percebeu que o time daria mais certo do que se esperava?
    Na Flórida [durante a pré-temporada] fiquei muito feliz com o que vi. Eu sabia que o trabalho seria bem feito. Não imaginava que seria com títulos, nem com início de Brasileiro desse jeito. Mas sabia que teria organização, comprometimento dos atletas.

    Um susto que o Corinthians teve foi na segunda rodada do Paulista, contra o Santo André (derrota por 2 a 0 no Itaquerão). Como foi aquela noite pós-resultado?
    Saí chateado com o placar, mas feliz com o rendimento. Finalizamos 29 vezes contra duas do Santo André. Fiquei mais chateado com a derrota para a Ferroviária porque não jogamos nada. Já saí preocupado após vitórias.

    Qual vitória do Corinthians não lhe deixou satisfeito?
    Um jogo bem recente do Brasileiro: contra o Cruzeiro em casa. Não achei que merecemos a vitória. Achava o empate mais justo. O Cruzeiro foi superior no segundo tempo. Saí satisfeito com o resultado, não com o rendimento.

    O Corinthians vive uma fase encantada, mas futebol tudo muda em pouco tempo. Está pronto para a crise?
    Eu me sinto preparado. Em oito anos aqui como auxiliar, vi de tudo. Foram oito títulos e decepções também. Esses oito anos foram preparação tanto para as coisas boas como para as coisas ruins.

    Como foi a primeira vez que entrou em campo e ouviu a torcida gritar seu nome?
    A primeira experiência foi de muitas noites sem dormir. Em 2010, antes da chegada do Tite. Dava preleção para Ronaldo e Roberto Carlos. Pensava: "o que eu vou falar para esses caras?" A grande emoção foi a final [do Paulista] contra a Ponte Preta. Na hora da volta olímpica, a torcida do gritando "Carille" foi uma emoção muito grande.

    Você conseguiu se emancipar da imagem do Tite?
    Isso é porque nunca escondi. Sempre disse que a linha de trabalho é a mesma, que a conduta é igual. O meu jeito de ser é muito parecido com o do Tite. Sou abençoado por ter trabalhado cinco anos e meio com um cara que considero muito parecido comigo.

    Quando era jogador, em 2005, você recusou oferta do Inter para não ficar longe de casa e foi para o Monte Azul, na segunda divisão do Paulista.
    Teve isso. Eu trabalhei até os 19 anos em uma usina. Ganhava três salários mínimos. O Sertãozinho me ofereceu contrato para jogar futebol: meio salário mínimo. Eu não queria ir porque ajudava em casa. Meu pai disse: "vai que eu me viro aqui". Começou assim. A minha sogra faleceu em 2011 com mal de Alzheimer. Foram 18 anos de doença, os últimos 11 anos de cama. Minha mulher cuidou dela. Eu recusava, por exemplo, proposta para ganhar R$ 25 mil no Criciúma e ficava no Monte Azul para receber R$ 3 mil e ficar perto dela, mas fazendo o que eu queria. Sou assim. Não me arrependo de nada. Sou família.

    Tem projetos em Sertãozinho?
    Tenho uma escolinha. Estou com 200 alunos pagantes. Mas há espaço para fazer um projeto social. Preciso esperar a boa vontade do governo. Já tenho as empresas que vão me ajudar com tudo. Quero tirar crianças da rua e ensinar fundamentos do futebol.

    Você tem curiosidade de trabalhar no Japão?
    Tenho.

    Pelo futebol ou pela cultura?
    Pela cultura. Fiquei 15 dias no país no Mundial em 2012. Me encantei com a educação. Não há cesto na rua e você não vê lixo jogado. Tomara que na minha carreira eu possa viver aquela cultura. Não agora... Vida de técnico é tão ruim que quero ficar mais 25 anos.

    Edição impressa
    [an error occurred while processing this directive]

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024