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    F-1 era um restaurante estrelado e virou um fast-food, diz Ecclestone

    GISELE VITÓRIA
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    11/11/2017 02h00

    Bruno Santos/Folhapress
    Bernie Ecclestone, ex-executivo da F-1, durante entrevista para a Folha
    Bernie Ecclestone, ex-executivo da F-1, durante entrevista para a Folha

    Bernie Ecclestone pede picanha bem passada. O garçom volta com um espeto feito especialmente para ele. A esposa do empresário, a advogada brasileira Fabiana Ecclestone, 39 anos, faz outro pedido. Que seja servida a geleia de pimenta que o marido come com a carne.

    A rotina de Ecclestone continua sendo a mesma de sempre quando vem ao GP Brasil de F-1. A diferença é que pela primeira vez o empresário está em São Paulo sem ser o todo poderoso do evento.

    Após vender a FOM (Formula One Management), dona da categoria, por US$ 8 bilhões (cerca de R$ 26 bilhões) para a Liberty Media, dos Estados Unidos, ele foi surpreendido com um afastamento do cargo de presidente da empresa, em janeiro.

    Aos 87 anos, ganhou um alto posto no conselho da companhia, mas diz que nunca foi ouvido. O combinado era que Ecclestone ficaria por mais três anos na presidência da FOM.

    "Sempre cuidei da F-1 como um restaurante três estrelas do Michelin [três estrelas é o grau máximo do guia francês que avalia restaurantes]. Não acho certo cuidar da F-1 como um fast-food.", afirma à Folha.

    O empresário critica o Brasil, onde tem uma fazenda de café. Em 2016, sua sogra brasileira foi sequestrada.

    "Parece que todo mundo no Brasil é corrupto. Vocês precisam de um Putin [presidente da Rússia]. Ele resolveria tudo", diz o empresário.

    *

    Folha - O senhor se sentiu enganado com a quebra do acordo que garantia a sua permanência à frente da F-1?
    Bernie Ecclestone - Se tivesse me sentido enganado, teria lidado com isso. São coisas que acontecem na vida. Vendi o negócio, mas continuo na companhia, numa posição mais alta. Suponho que eu seja um conselheiro. Talvez eles não soubessem como pedir para eu me retirar e uma forma de fazer isso foi me dar uma função superior. O Chase Carey -atual presidente da FOM- quis o meu lugar. Eu lhe disse: "Você comprou o carro, então dirija."

    O que o senhor queria dizer às pessoas da Liberty Media e ainda não disse?
    Talvez você não queira publicar. Eles devem acordar. Não tenho nada contra eles. Lamento por eles. É mais ou menos como você dar um trabalho de médico para um dentista fazer. Sempre tentei cuidar da F-1 como se fosse um restaurante três estrelas Michelin. Não acho certo cuidar da F-1 como se fosse um fast-food. É o padrão na América. É muito inferior ao da F-1. Todo mundo que está envolvido em F-1 nos últimos 40 anos espera um padrão mais alto.

    O que eles estariam errando?
    Eu tocava o negócio para produzir resultados financeiros. Eles não parecem preocupados em produzir lucros. Este ano, todos os contratos que foram originalmente feitos por mim estão válidos. Pelo que sei, não há contratos novos. E estão tratando a F-1 como um show. Olhe a corrida nos Estados Unidos. Puseram garotas com shorts e pompom. Nós tínhamos garotas com shorts mais curtos, mas não em frente ao público.

    Aceitaria voltar?
    Depois de mais de 40 anos no comando, não gostaria de voltar tendo que perguntar para os donos como devo fazer, como um pistoleiro. Você é contratado para matar alguém e aí tem que perguntar: o que devo fazer?

    Considera que houve desrespeito com o senhor?
    Se meu trabalho não fosse bom, eles não teriam comprado a companhia. Fiquei surpreso [com a demissão].

    O senhor declarou que deve ser levado a sério o risco da Ferrari sair da categoria. Teve alguma informação privilegiada?
    A saída da Ferrari deve ser levada à sério com certeza. O atual presidente da Ferrari Sergio Marchionne é um pouco diferente do presidente anterior. Ele também quer fazer da Ferrari mais lucrativa, como eu tentava fazer com a F-1. A F-1 é Ferrari e a Ferrari é F-1. Se eles mexerem muito com as regras em relação aos motores, eles são capazes de sair.

    O senhor chegou a afirmar que ajudava a Ferrari a ganhar. O que quis dizer com isso?
    Qualquer coisa que eu pudesse fazer para ajudar a Ferrari, eu fazia. O sr. [Enzo] Ferrari me ajudou muito.

    Que tipo de ajuda?
    Nada que prejudicasse ninguém. E se prejudicasse, eu não iria lhe contar. Os outros times entendem que precisam da Ferrari.

    Quais são os riscos do GP Brasil de F-1 acabar?
    Os contratos vão até 2020. É difícil dizer o que vai acontecer depois. Para a corrida poder continuar em São Paulo, a cidade terá que dar recursos para o GP Brasil ser mantido. O prefeito João Doria está tentando vender o autódromo. Será bom vender para alguém preparado. Há duas coisas importantes para F-1: pilotos campeões mundiais ou bem sucedidos. E a Ferrari. Isso mantém viva a F-1. Não há mais um piloto brasileiro fantástico. E se não tiver a Ferrari, não faz sentido haver F-1 aqui.

    O que mudou na sua rotina durante os GPs de F-1?
    Depende do GP e dos relacionamentos. Costumo ser bem tratado. Não faço ideia se sou persona non grata. Nunca sou ouvido pelos novos gestores. Eles sabem o que eu tenho a dizer. Mas não precisam da minha ajuda.

    Por que vendeu a F-1?
    Achamos que era o momento correto. Talvez tenhamos errado. Não me arrependo.

    O que tem feito com os cerca de US$ 8 bilhões que recebeu pelo negócio?
    Fizemos compras hoje. Vamos passar mais tempo na Suíça. Quero expandir nosso hotel em Gstaad.

    Casado com uma brasileira, o senhor acompanha as notícias sobre o país?
    É difícil acompanhar. Todo dia acontece alguma coisa. Parece que todo mundo no Brasil é corrupto. Pela imprensa, passa a ideia de que a briga é política.

    Do que o Brasil precisa?
    O Brasil precisa absolutamente de alguém como [Vladimir] Putin [presidente da Rússia]. Ele resolveria tudo.

    Putin é um líder muito controvertido.
    Mas ele funciona. Ele lidaria com as pessoas que fazem mal ao país de uma forma que elas não ficariam tão felizes.

    Faz um ano e meio que aconteceu o sequestro da mãe de sua mulher.
    A pena de 14 anos de prisão que os sequestradores tiveram mostra que o sequestro não é um mau negócio no Brasil. Esperávamos 20 anos.

    Como o sequestro mudou a vida de vocês?
    Mudou por causa da família de Fabiana. Os pais dela passaram uma temporada em Londres. Agora voltaram. O juiz tomou a decisão com base nas informações do processo. Imagine que eles mandaram um e-mail para Fabiana dizendo: "Escolha a música que você quer que toquemos para sua mãe. Vamos matá-la agora." [A mulher de Ecclestone, Fabiana, interrompe o marido e afirma: "É difícil para o juiz avaliar essa tortura. Ele leu um e-mail. Mas imagina o que sentimos com minha mãe desaparecida por oito dias, lendo e-mails como esse e assistindo a um vídeo de uma pessoa sendo decapitada? Eu estava do outro lado do mundo, com instruções para não vir para o Brasil, porque poderia ser uma quadrilha internacional e eu poderia ser sequestrada também."]

    Quem é o maior o piloto de todos os tempos?
    Alain Prost.

    Quem vence a corrida no domingo 12?
    Talvez Sebastian Vettel. O campeão já foi definido. Ele tem chance.

    Como vê o futuro de Lewis Hamilton?
    Pelos próximos cinco anos, ele será o favorito. Ganhará novos campeonatos.

    O senhor visitou Schumacher depois do acidente?
    Eu não o visito nem faço perguntas. É muito triste. Quero lembrar dele como ele era.

    NA TV
    Treino classificatório do GP Brasil
    14h Globo

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