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    Novatos olímpicos lutam contra o amadorismo para ir a Tóquio-2020

    PAULO ROBERTO CONDE
    DE SÃO PAULO

    25/12/2017 02h00

    Cinco esportes ganharam há pouco mais de um ano o privilégio de fazer parte do acirrado programa dos Jogos Olímpicos na próxima edição, em Tóquio, em 2020.

    No Brasil, contudo, o ingresso no exclusivíssimo clube não conferiu novo status.

    Escalada esportiva, caratê, beisebol/softbol, skate e surfe -quinteto que estará no Japão- lidam com uma realidade de amadorismo no país.

    As confederações que os regem são compostas basicamente de voluntários, se pagam com taxas de inscrição de campeonatos e nunca tiveram patrocínios vultosos.

    A partir de 2018, passarão a receber verba da Lei Piva, já que foram recentemente filiadas ao COB (Comitê Olímpico do Brasil). A lei repassa 2,7% da arrecadação bruta das loterias para o esporte.

    No próximo ano os cinco ganharão R$ 719.696,97 de forma direta, e poderão apresentar projetos adicionais para a campanha para 2020.

    Ainda assim, consideram haver pouco tempo para capitalizar o investimento.

    A ABEE (Associação Brasileira de Escalada Esportiva) é sediada na casa da presidente, a ex-atleta Janine Cardoso, que também faz as vezes de diretora-executiva. Mais quatro pessoas, voluntárias, ajudam na direção.

    Ela festeja uma conquista obtida recentemente, que foi comprar uma impressora para a entidade, que nasceu em 2014, como uma dissidência da Confederação Brasileira de Montanhismo e Escalada.

    Parece pouco, mas o universo da escalada é tão rarefeito que vale como pódio.

    "A nossa movimentação financeira é R$ 15 mil por ano. Com isso pagamos a federação internacional (750 euros) e organizamos competições", afirmou Janine à Folha.

    O montante vem dos cerca de cem atletas profissionais registrados na ABEE em ginásios pelo Brasil, que pagam uma taxa anual de R$ 140. Ela também aceita doações. Os principais polos do esporte estão em MG, SP, PR e RS, cujos atletas dominam os rankings profissional e amador.

    Com o repasse da Lei Piva, Janine quer alugar uma sede, contratar um treinador-chefe, um gerente de projetos, remunerar a si e a equipe e enviar atletas para etapas da Copa do Mundo. "Já pus muito dinheiro do bolso nesse esporte", disse, em alusão ao investimento que fez para fundar a entidade.

    Motivada, ela afirmou que, apesar da dificuldade, é possível ter ao menos um atleta do país em Tóquio –os mais cotados são Felipe Ho e Cesar Grosso. Haverá só 20 vagas para cada gênero nos Jogos, e os brasileiros competirão contra todos das Américas por elas.

    A prova olímpica será um combinado das disputas de velocidade, boulder (rotas realizadas em um determinado intervalo de tempo) e dificuldade. Os pontos vêm da soma de desempenhos nas três categorias.

    TRANCOS E BARRANCOS

    É pouco provável que brasileiros vão a Tóquio no beisebol e softbol, que foram do programa olímpico até 2008.

    Os torneios devem ter oito equipes apenas. No caso do beisebol, dois classificados sairão do campeonato Premier 12 -espécie de Mundial- e outros seis de seletivas.

    O Brasil brigará com potências da região como EUA, Cuba e Panamá por duas vagas, e a chance é ínfima até para o mandatário da CBBS (confederação nacional de beisebol e softbol), Jorge Otsuka.

    Os esportes sob sua tutela tenta se reestruturar no Brasil. A entidade, que recebeu verba da Lei Piva até os Jogos de Pequim, tem só três funcionários: Otsuka, um diretor técnico e uma secretária.

    "Vamos aos trancos e barrancos", disse o presidente, que se divide entre a CBBS e sua corretora de seguros.

    O que lhe dá sobrevida é a parceria com a MLB (liga americana de beisebol), que ajuda a manter jogadores em um centro de treinamento em Ibiúna -o CT é bancado pela Yakult (R$ 30 mil mensais).

    A CBBS organiza um campeonato brasileiro, chamado de Taça Brasil, todos os anos, mas ele é praticamente bancado pelos 16 clubes participantes -as taxas de inscrição vão para a confederação.

    Para economizar, a definição do título é toda feita em um só final de semana.

    No último dia 17, em São Paulo, Marília venceu a Medicina USP por 14 a 4 e conquistou a competição. A Toyota patrocinou o torneio.

    Embora já tenha rendido ao Brasil 35 medalhas em Jogos Pan-Americanos, o caratê não vê situação mais fácil.

    Segundo o diretor técnico William Nascimento, a situação da CBK (confederação brasileira) é de "muita dificuldade financeira", e isso impacta diretamente os atletas, que têm de pagar do bolso passagens para competições sul-americanas e até campeonatos mundiais.

    No máximo, a confederação consegue bancar hospedagem e taxa de inscrição.

    Sem patrocinadores, a CBK se vale de receita obtida com exame de faixa dos praticantes para, entre outras coisas, manter sua sede em Fortaleza, que tem seis funcionários. Para outorgar uma faixa preta, ela cobra R$ 450.

    Nascimento disse que ao menos vários competidores recebem o Bolsa Atleta.

    "A ideia é que, a partir de agora, eles não tenham mais que pagar", afirmou.

    SKATE PENSA EM 5 PÓDIOS; SURFE VÊ VERBA INSUFICIENTE

    Skate e surfe são esportes nos quais o Brasil tem tradição de conquistas internacionais, mas internamente há muito a fazer.

    Reconhecida na última semana pelo COB, a CBSk (Confederação Brasileira de Skate) não possui sede, funcionários ou nem mesmo um portal oficial no ar.

    Porém, quer se alicerçar no status de seus representantes para vingar. Em setembro, Bob Burnquist foi eleito presidente e indicou Sandro Dias, o Mineirinho, como diretor de esportes.

    A CBSk quer lançar um circuito profissional no país, com diversas etapas, em 2018. "Buscamos patrocinadores e temos a ambição de ser o esporte com mais medalhas em uma só Olimpíada [do Brasil]. Queremos cinco", disse o vice da CBSk, Eduardo Musa.

    Em 2017, o Brasil obteve pódios em eventos internacionais com Pedro Barros, Letícia Bufoni e Kevin Hoefler. "Nossa pretensão é contar com 0% de dinheiro público e estruturar a seleção. O skate nunca precisou da CBSk para viver."

    Na teoria, o mesmo se aplicaria ao surfe, já que o Brasil tem vários nomes na elite da liga mundial, como Gabriel Medina e Adriano de Souza, que se mantêm no circuito sem ajuda de confederação.

    Porém, a confederação brasileira vai no sentido oposto. Adalvo Argolo, seu presidente desde 2010, disse que a entidade cuida só de categorias de base. Sem patrocínio, faz a montagem das seleções de júnior, mas em geral os atletas bancam as suas viagens.

    Mesmo com a Lei Piva ele acredita ser difícil implementar mudanças, embora Medina tenha expressado desejo de ir a Tóquio.

    "Com R$ 719 mil, não há condição de fazer nada no sentido de levar seleções para Mundiais."

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