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    Copa de 1950: 'Nunca esqueci a vibração do gol brasileiro'

    ARMANDO FREITAS FILHO
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    12/07/2014 00h01

    No dia 16 de julho de 1950, com 10 anos, acordei cedinho e já me vesti todo: camisa branca de manga comprida para disfarçar os braços magros, calças curtas azul-marinho com suspensórios, meias brancas e sapatos pretos.

    Esse figurino era mais ou menos comum para os meninos da minha idade. A bermuda não existia e o tênis era só para fazer ginástica ou jogar bola. Depois do café com leite reforçado e dos sanduíches de queijo sem manteiga escondidos numa sacola, lá fui eu, levado por meu pai no seu carro Standard Vanguard, e acompanhado por minha prima, ver o Brasil ganhar do Uruguai na final da Copa, no Maracanã -o maior estádio do mundo- novo em folha, com capacidade para 200 mil pessoas.

    Ela até me disse: "Presta atenção no que vai ver, pois Copa no Brasil só no ano 2000", o que naqueles anos significava um tempo impensável. A possibilidade de perdermos a partida não era nem considerada.

    Quando a bola rolou, a tarde de julho era quase fria. O jogo não tardou a esquentá-la. Para nós o empate era suficiente, segundo o regulamento do torneio daquela época. O primeiro tempo foi corrido sem muita chance de gol, mas logo no começo do segundo, Friaça, nosso ponta-direita, abriu o placar em chute cruzado que Máspoli, formidável goleiro uruguaio, não conseguiu defender. Gritei e pulei tanto que arranhei minha perna na beirada metálica das cadeiras azuis numeradas. Nada é igual a ouvir seu grito ampliado por tantos outros, a sentir o que tantos -era todo o mundo- sentem no corpo e na alma.

    Mas um pouco depois os uruguaios empataram e viraram o jogo, com Schiaffino e Ghiggia. Era inacreditável, era impossível aquilo. Aquele coro gigantesco de vozes calou fundo de repente e, quando o juiz inglês Mr. Reader soprou o apito final, a enorme multidão saiu muda. Assim como a vibração sonora de alegria do gol brasileiro nunca me saiu da cabeça, a mesma coisa aconteceu com o silêncio perfeito e doloroso. Então a vida era assim? Era. Mas, pelo menos, agora eu sei: ninguém ganha ou perde para sempre.

    *

    1950
    URUGUAI 2x1 BRASIL

    O dia mais traumático do futebol brasileiro era 16 de julho de 1950. Na final da Copa, a seleção, que havia vencido a Suécia por 7 a 1 e a Espanha por 6 a 1, perdeu para o Uruguai por 2 a 1, de virada, em pleno Maracanã. O trauma, conhecido por Maracanaço, ficou para trás na última terça, quando tomamos de 7 a 1 da Alemanha, no estádio do Mineirão. Foi o Mineiraço.

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    ARMANDO FREITAS FILHO é poeta

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