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    Filme sobre garotos gays pode ser visto até por homofóbicos, diz diretor

    GUILHERME GENESTRETI
    DE SÃO PAULO

    10/04/2014 03h13

    "Hoje Eu Quero Voltar Sozinho" é um filme gay. "Mas gay para ser visto até pelo mais homofóbico dos homofóbicos", afirma o diretor, o paulista Daniel Ribeiro, 31.

    "É doce, tem mais a ver com o amor entre duas pessoas do que com o sexo entre dois caras", diz o cineasta, também autor do roteiro sobre o romance entre dois garotos adolescentes.

    O filme, que estreia hoje, é seu primeiro longa-metragem e já saiu do último Festival de Berlim com dois prêmios: o Fipresci, da crítica, e o Teddy, para produções gays, ofuscando nessa categoria o também brasileiro "Praia do Futuro", de Karim Aïnouz.

    Antes de entrar em cartaz, a produção, orçada em R$ 2,6 milhões, já tem 154 mil fãs no Facebook, graças ao sucesso do curta que originou tudo: "Eu Não Quero Voltar Sozinho", visto mais de 3 milhões de vezes no YouTube.

    As duas obras têm os mesmos personagens, mas em tramas ligeiramente diferentes. Leo (Ghilherme Lobo) é um garoto cego, encurralado entre a família superprotetora e os valentões da escola. Sua única companhia é Giovana (Tess Amorim).

    Recém-chegado ao colégio, Gabriel (Fabio Audi) aos poucos conquista a atenção do protagonista, entre excursões da escola, lições de casa em dupla e dancinha ao som de Belle & Sebastian.

    O vínculo entre os dois cresce sem que a homossexualidade seja uma questão.

    "Ser gay não é um problema para os personagens, mas fora do filme eu queria que o público se perguntasse por que se identifica com a história mesmo quando não é gay", afirma Ribeiro.

    A ideia de criar um personagem cego serve de metáfora para falar da origem da sexualidade, conta o cineasta. "É alguém que nunca viu um cara e mesmo assim se apaixona por um, sem escolha."

    Na contramão de produções recentes, o filme não mostra cenas de sexo e não tem nudez.

    "É importante que haja filmes que explicitem o sexo entre dois homens, como 'Tatuagem' [de Hilton Lacerda] e 'Praia do Futuro', mas eu quis esvaziar essa questão," diz Ribeiro.

    A abordagem light não impediu que o curta enfrentasse algumas dificuldades em 2011. No Acre, a sua exibição em escolas públicas, dentro de um programa educativo de direitos humanos, foi cancelada depois de queixas de pais de alunos.

    Eduardo Anizelli/Folhapress
    Daniel Ribeiro, diretor de 'Hoje Eu Quero Voltar Sozinho
    Daniel Ribeiro, diretor de 'Hoje Eu Quero Voltar Sozinho'

    TIETAGEM

    Os atores dizem que são reconhecidos por aí desde o lançamento do curta, há quatro anos. "São adolescentes vindo dizer como o filme mexeu com eles", afirma Fabio Audi, 26. Ele estudava cinema à época em que fez o teste para entrar no elenco.

    Mesmo em Berlim e em Guadalajara, no México, onde o filme também levou um prêmio, os garotos chegaram a ser apontados na rua.

    "Alguns achavam que eu era cego de verdade", afirma Ghilherme Lobo, 19, estreante no cinema. Ele aprendeu a ler em braile para o papel.

    Daniel Ribeiro, que já dirigiu o programa "Viva Voz", no canal GNT, e o projeto "Música de Bolso", pretende seguir com temática gay.

    Seu primeiro curta, "Café com Leite" (2007), também premiado em Berlim, já rondava esse universo.

    "Ninguém pergunta a um diretor por que seus personagens são todos héteros, mas sempre me perguntam porque só retrato gays. Quero que no futuro digam com espanto: 'Vai fazer um filme com personagens heterossexuais?'"

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