"Entredentes" tem seu melhor naquilo que já estava na gênese da montagem, no primeiro encontro de atores e diretor, há dois anos: a caracterização que Ney Latorraca fez de um menino, exigindo de sua mãe um tênis.

A cena não está na peça, mas é nessa capacidade de brincar que a encenação é bem-sucedida. Gerald Thomas revolve à exaustão o talento do ator para achar graça onde ela parece inexistir. Sobretudo, consegue dar forma ao duo cômico de Ney e Didi, nomes dos personagens de Latorraca e Edi Botelho.

Remetendo às duplas do cinema mudo e de Beckett, mas também a "Seinfeld", os atores jogam conversa fora sobre a saúde de Latorraca, o Oriente Médio, qualquer coisa.

	Divulgação
	O ator Ney Latorraca caracterizado como judeu ortodoxo

Didi cobra repetidamente que não saem do prólogo. É o que permite desenvolver sua comédia sobre o nada, mas aos poucos o espectador concorda: Quando vão parar de arranhar a superfície?

A duração é um problema. "Entredentes" se estende muito além de "O Gordo e o Magro" ou da meia hora das séries cômicas de TV. Outro é que Thomas, como autor, não parece mais ter as certezas que demonstrou um dia.

A atriz Maria de Lima faz, expressamente, sua voz no palco, intervenção enriquecedora na rotina cômica. Mas os discursos afetadamente geopolíticos vão da ligeireza à obviedade e frustram.

De todo modo, perto de produções recentes, é um renascimento para Thomas, inspirado pelos talentos da dupla e de Maria. E sua cena segue bem emoldurada, pela trilha musical e sobretudo pela cenografia: uma vagina gigante que remete ao renascimento de Latorraca, depois de uma crise de saúde, e também às rachaduras nos muros políticos e religiosos, por onde vaza vida.

ENTREDENTES
QUANDO sex. (18/4) e sáb., às 21h, dom., às 18h; até 11/5
ONDE Sesc Consolação, r. Dr. Vila Nova, 245, tel. (11) 3234-3000
QUANTO de R$ 7 a R$ 35
CLASSIFICAÇÃO 16 anos
AVALIAÇÃO bom