• Ilustrada

    Saturday, 18-May-2024 21:05:01 -03

    PUC veta locação a filme sobre anos 1980, dirigido por Marina Person

    GABRIELA LONGMAN
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    19/04/2014 03h46

    Quando resolveu escrever o longa-metragem "Califórnia" sobre adolescentes nos anos 1980, a roteirista e diretora Marina Person pinçou nas próprias lembranças as questões que tumultuavam a juventude no período: as Diretas Já, o pós-Punk e o aparecimento da Aids.

    Não esperava, porém, que alguns dos tabus comportamentais daquele momento pós-Ditadura ainda rondassem no ar e ficou surpresa quando uma das locações previstas para as filmagens, a PUC-SP, negou a utilização de seu espaço no último momento por um veto da entidade religiosa mantenedora, a Fundação São Paulo.

    Uma negociação por e-mail entre a produtora Mira Filmes e o departamento de marketing da universidade estabelecia a duração das filmagens (cinco dias), os espaços que seriam utilizados (uma sala de aula, um banheiro, o pátio e a quadra) e o valor a ser pago pela locação (R$ 12 mil).

    Aline Arruda/Divulgação
    Clara Gallo no papel de Estela, numa cena de 'Califórnia', dirigido por Marina Person, sobre a juventude os anos 1980
    Clara Gallo no papel de Estela, em cena de 'Califórnia', dirigido por Marina Person, sobre anos 1980

    A PUC-SP recebeu uma apresentação de 14 páginas contendo um descritivo do filme, elenco, e currículos dos principais envolvidos e conduzia o processo normalmente. O espaço em questão seria o colégio onde estuda Estela (Clara Gallo), a protagonista.

    "A reitora concordou, mas ainda precisamos do aval do padre, secretário-executivo da mantenedora", dizia o e-mail final do acerto de detalhes. A negativa viria poucos dias depois em e-mail assinado pelo pró-reitor de Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, Antonio C. Gobe.

    "Internamente foram canalizados esforços no sentido de aprovar a liberação do espaço para sua locação e gravação", escreve Gobe em e-mail ao qual a Folha teve acesso. "O corpo da reitoria se empenhou diretamente junto a Fundação São Paulo [] Apesar de todos os esforços e argumentações empregadas para a concretização desta parceria, a Secretaria Executiva da Fundação São Paulo (instância máxima da universidade) negou o pedido frente à abordagem declarada na sinopse do filme."

    A sinopse apresentada dizia pouco: "O ano é 1984. Estela vive a conturbada passagem pela adolescência. O sexo, os amores, as amizades; tudo parece muito complicado. Seu tio Carlos [Caio Blat] é seu maior herói e a viagem à Califórnia para visitá-lo, seu grande sonho. Mas tudo desaba quando ele volta magro, fraco e doente. Entre crises e descobertas, Estela irá encarar uma realidade que mudará, definitivamente, sua forma de ver o mundo."

    Embora não estivesse escrita literalmente, a referência à Aids se fazia clara na própria sinopse e em textos sobre o contexto histórico que acompanhavam o material. "Eu queria entender como esses jovens que são filhos da geração do amor livre, da pílula, da liberação da mulher iniciaram a vida sexual junto à descoberta da Aids. Foi um pouco a história da minha geração", diz a diretora.

    O filme não tem nenhuma referência à Igreja ou à Universidade e nenhuma cena envolvendo sexo, violência ou uso de drogas seria rodada no ambiente escolar. Por meio de suas diferentes instâncias, PUC-SP e Fundação São Paulo dizem que a sinopse não influiu e que a recusa foi fruto de um mal-entendido interno leia aqui.

    Passada a decepção da equipe com a negativa, as cenas em questão foram rodadas num grande colégio de elite na zona oeste de São Paulo, que leu todo o roteiro, dialogou com a equipe cobrou apenas custos de manutenção. Atualmente em montagem, o filme tem sua estreia prevista para 2015.

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024