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    Embargo afeta cinema em Cuba

    VICTORIA BURNETT
    DO "NEW YORK TIMES", NA CIDADE DO MÉXICO

    22/04/2014 07h19

    Em termos de Hollywood, a mudança seria mínima. No entanto, para o cineasta cubano Miguel Coyula, acostumado a lidar com orçamentos pequenos, os US$ 5.200 (R$ 11.500) obtidos em um site de financiamento foram cruciais para fazer seu filme de ficção científica.

    Com o dinheiro, angariado no site de financiamento Indiegogo, ele comprou equipamentos de iluminação, uma Steadicam e um tripé para seu filme, "Blue Heart" [Coração Azul].

    O Indiegogo, porém, suspendeu a campanha em agosto e congelou o dinheiro após verificar que transferir fundos para Cuba ou para um residente cubano violaria o embargo econômico imposto pelos Estados Unidos.

    "Foi como se puxassem meu tapete", disse Coyula. "Foi aí que percebi que estava realmente sozinho e o quanto é difícil fazer um filme em Cuba, pois tanto o governo cubano quanto o americano criam obstáculos."

    Alexandra Halkin, diretora da Iniciativa para Mídia das Américas, disse que o financiamento coletivo havia aberto uma brecha —embora por breve tempo— em um país no qual há poucas fundações sem fins lucrativos para financiar as artes e escasso apoio do governo.

    Como há fontes não americanas disponíveis, Cuba produz filmes em parceria com empresas de países como Espanha, França e México, ou com financiamento, por exemplo, da Ibermedia, um programa com patrocínio estatal da Espanha para financiar filmes latinos.

    Mas ficou bem mais difícil obter dinheiro da Espanha devido à crise econômica. E os EUA seriam um "financiador natural" do cinema cubano, comentou Halkin, em vista da história partilhada dos dois países.

    O cinema cubano mudou muito nos últimos anos. O papel do Estado diminuiu, a tecnologia digital viabilizou produções independentes e a internet abriu vias para o financiamento.

    Um número crescente de filmes cubanos selecionados para festivais internacionais é feito com pouca ou nenhuma ajuda financeira de órgãos estatais.

    Especialistas em cinema cubano dizem que o embargo está entravando o crescimento de um cinema cada vez mais independente do Estado e que apresenta com frequência uma reflexão realista da vida cubana ou ridiculariza o governo.

    Filmes como "Pablo" (2012), de Yosmani Acosta, sobre a violência doméstica, e "Chamaco" (2010), de Juan Carlos Cremata, sobre a prostituição masculina, falam sobre temas debatidos nas ruas, mas raramente na mídia.

    O filme "Memories of Overdevelopment" ["Memórias do Superdesenvolvimento"], feito por Coyula em 2010, tem uma cena em que o protagonista fala para uma bengala com cabeça de cão como se estivesse se dirigindo ao ex-ditador Fidel Castro.

    "Minta mais para mim", diz. Em uma exibição em Havana, o público irrompeu em aplausos.

    A lei americana determina que americanos só podem fazer um filme em Cuba como parte de um projeto de pesquisa. "É absurdo não termos legislação para produtores independentes", disse o diretor Esteban Insausti.

    O fato é que a ameaça de ser alvo de um processo do Departamento do Tesouro e a enorme burocracia para obter uma permissão são suficientes para desencorajar muitas organizações.

    Ubaldo Huerta, que geriu uma plataforma de financiamento coletivo, disse não acreditar que o embargo visava impedir os projetos. "Nós somos danos colaterais", ponderou.

    Segundo especialistas, agora a indústria cinematográfica americana anseia por usar a ilha como locação e pelo contato com cineastas cubanos.

    "Aqui nos EUA estamos impossibilitados de ter contato com jovens muito talentosos", disse Ann Marie Stock, diretora de estudos de cinema e mídia no College of William and Mary em Virgínia, autora de um livro sobre cinema cubano independente.

    "Esses cineastas irão longe em suas carreiras, mas graças a empresas de produção espanholas e mexicanas, não a empresas americanas. Estamos perdendo oportunidades em termos econômicos e criativos."

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