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    Crítica: Carola Saavedra deixa zona de conforto e dialoga com o teatro

    BEATRIZ RESENDE
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    24/05/2014 02h15

    Carola Saavedra, com três romances e um livro de contos publicados, já apresenta um caminho traçado com marca própria. Duas constantes transitam por sua obra: a referência, geralmente indireta, aos laços com seu país de nascimento, o Chile, e o uso de estratégias narrativas que procuram romper com a escritura romanesca tradicional.

    Diga-se de passagem que, por vezes, o uso de recursos que pretendem deixar evidente o que há de ficção no ficcional, como um narrador em primeira pessoa masculino, nem são necessários diante do tecido narrativo forte que vem construindo.

    Por tudo isso, é interessante o movimento de deslocamento de uma zona de conforto que "O Inventário das Coisas Ausentes" provoca em sua produção.

    Eduardo Anizelli/Folhapress
    A escritora Carola Saavedra na festa do Prêmio São Paulo de Literatura, em 2011
    A escritora Carola Saavedra na festa do Prêmio São Paulo de Literatura, em 2011

    A narrativa se divide em uma parte mais longa, e uma segunda, breve. Narradores, tempos e espaços se misturam, personagens vão e vêm, com eventuais modificações em suas identidades.

    A mulher chamada Nina surge desde o início, identificada pelo homem que será seu parceiro no amor/desamor que atravessa o livro.

    Livro
    O Inventário Das Coisas Ausentes
    Carola Saavedra
    O Inventário Das Coisas Ausentes
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    A Nina é atribuída uma família que veio do Chile, pai e avô fortes e positivos, esboço de personagens que poderiam fazer girar em torno deles outras ficções.

    A segunda parte é a narrativa do grande conflito que atravessa a literatura desde Sófocles, Shakespeare até Kafka: a impossibilidade de relação entre o filho e o pai e do pai com o pai dele. Avô analfabeto, pai rico e culto, filho absolutamente medíocre.

    Na construção do romance, Carola Saavedra opta por um modelo que vem aparecendo em outras formas de arte contemporânea, como o teatro ou artes visuais, onde o processo é mais importante do que o resultado final, que pode até não existir.

    É o material da carpintaria, o provisório da instalação, o texto ou a imagem que vão se reconstruindo à medida em que são apresentados ao observador, ao público, que constituem a obra.

    Aqui, os livros possíveis importam mais do que o livro que temos. Não é fácil, mas é uma tentativa interessante de diálogo com o que é prática artística de nossos dias.

    BEATRIZ RESENDE é professora titular de poética da UFRJ.

    O INVENTÁRIO DAS COISAS AUSENTES
    AUTORA Carola Saavedra
    EDITORA Companhia das Letras
    QUANTO R$ 34,50 (128 págs.)
    CLASSIFICAÇÃO bom

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