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    Primeira mostra póstuma de Niemeyer contrapõe criações clássicas a inéditas

    SILAS MARTÍ
    DE SÃO PAULO

    03/06/2014 02h06

    Numa sala toda branca, do chão ao teto, estão maquetes no mesmo tom de obras de Oscar Niemeyer, da Pampulha à Catedral de Brasília. Elas parecem surgir do nada, quase camufladas no branco, como se mais potentes como ideias do que como prédios.

    De certa forma, a primeira grande mostra póstuma dedicada ao arquiteto, morto aos 104 em dezembro de 2012, transforma agora o Itaú Cultural, em São Paulo, numa espécie de laboratório de ideias.

    Nesse ambiente, suas construções se tornam um pouco mais assombrosas do que quando vistas na paisagem real. Perdem o peso do concreto para exaltar a leveza dos traços do arquiteto —que fazia questão de manter certa austeridade nos desenhos, com poucas linhas.

    Divulgação
    Catedral de Brasília, obra de Niemeyer construída em 1958
    Catedral de Brasília, obra de Niemeyer construída em 1958

    Logo na primeira sala, está um rolo de 12 metros de papel com desenhos que Niemeyer fez diante da câmera para um documentário. Ele revisitava a própria obra enquanto ia descrevendo cada um daqueles projetos.

    Do lado oposto da sala, estão mais 20 desenhos que formam uma espécie de resumo de sua obra, de projetos construídos, como a sede do Partido Comunista Francês, em Paris, e o Museu de Arte Contemporânea de Niterói, a outros nunca executados, como um museu em Caracas.

    "É uma história da arquitetura contada por ele, uma espécie de testamento", diz Lauro Cavalcanti, curador da mostra. "Isso é tudo aquilo que ele achava que deveria ser lembrado na obra dele. É o Oscar visto por ele mesmo."

    E, nessa visão, a obra construída tem a mesma relevância de projetos que nunca saíram do papel. Daí a força da mostra, que põe em paralelo a obra já realizada e aquilo que poderia ter sido e não foi, reunindo um poderoso acervo de projetos inéditos.

    Entre eles, estão o desenho de uma casa circular que ele projetou para ser seu endereço de veraneio e nunca construiu, a sede da Companhia Energética de São Paulo, que une dois terrenos distintos por meio de uma passarela, um projeto para uma casa de concertos no Rio e uma das 12 versões do Auditório Ibirapuera.

    Mas também chamam a atenção seus momentos de devaneio, que dão pistas sobre os rumos que sua arquitetura pioneira poderia ter tomado num futuro distante.

    UNIVERSO SCI-FI

    Num exercício digno de ficção científica, Niemeyer fez nos anos 1960 uma série de desenhos imaginando um mundo novo em que árvores cresceriam em ritmo ultraveloz, cápsulas antigravidade substituiriam os elevadores nos prédios e todo o conhecimento seria transmitido por eletrodos colados à cabeça.

    Brasília, antes de construída, talvez tivesse o mesmo ar de ficção científica nos planos do arquiteto, mas passou a ser realidade concreta.

    Divulgação
    O arquiteto Oscar Niemeyer, tema de mostra agora no Itaú Cultural
    O arquiteto Oscar Niemeyer, tema de mostra agora no Itaú Cultural

    "É interessante ver aquilo já consagrado à luz das experimentações", diz Pedro Mendes da Rocha, arquiteto da mostra. "Seu trabalho está sendo redescoberto em suas minúcias e pela sua riqueza."

    Na mesma veia futurista de Brasília e de seu universo sci-fi, Niemeyer também desenhou uma cidade revolucionária para o deserto do Neguev, em Israel, que acabou nunca saindo do papel.

    Era uma enorme esplanada, no estilo da capital federal, com a diferença de que os carros circulariam por vias subterrâneas, deixando o nível da rua para pedestres. Nenhuma distância seria maior do que 500 metros e todas as casas dariam para jardins.

    Outro projeto nunca construído e que também pode ser visto na mostra, de um centro comercial na Argélia, antecipa a criação das ilhas artificiais que se multiplicaram depois pelo Oriente Médio.

    Dos mais ousados planos urbanos a prédios isolados que se tornaram ícones da arquitetura mundial, Niemeyer foi se revelando ao longo da vida um mestre da criação de espaços que arrebatam pela crueza e pela simplicidade.

    "Existe a genialidade de prédios com volumetria exuberante soltos na paisagem, mas há ao mesmo tempo joias incrustadas no tecido urbano", avalia Mendes da Rocha.

    OSCAR NIEMEYER
    QUANDO começa nesta quarta-feira (4), às 20h; de ter. a sex., das 9h às 20h; sáb. e dom., das 11h às 20h; até 27/7
    ONDE Itaú Cultural, av. Paulista, 149, tel. (11) 2168-1776
    QUANTO grátis

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