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    'Brasil só valoriza artista morto', diz diretor Neville D'Almeida

    MARCO RODRIGO ALMEIDA
    DE SÃO PAULO

    02/07/2014 02h19

    Tranquilidade é uma sensação rara no cinema de Neville D'Almeida, tanto nos enredos dos filmes quanto na própria feitura deles.

    Por isso é bastante apropriado o título da retrospectiva dedicada ao cineasta que começa nesta quarta (dia 2) em Brasília: "Cronista da Beleza e do Caos".

    A programação inclui trabalhos raríssimos, e bastante conturbados, do diretor. "Jardim de Guerra" (1970), seu primeiro longa, foi proibido pela censura e nunca exibido comercialmente no Brasil.

    Editoria de Arte/Folhapress

    Produzido em plena ditadura militar, conta a história de um jovem acusado de terrorismo que acaba preso e torturado por uma organização de extrema direita.

    Mais rocambolesco ainda foi o percurso de "Mangue-Bangue" (1971). Rodado em apenas uma semana na zona de prostituição do Rio, o filme é um painel delirante das tensões do período, como a repressão policial e a liberdade sexual.

    Com medo da ditadura, Neville levou os negativos para a Inglaterra e depois para os EUA. O filme ficou esquecido nos arquivos do MoMA, o museu de arte moderna de Nova York, por quase 40 anos, só sendo localizado em 2010.

    "Sempre procurei fazer nos meus filmes um retrato vivo do período em que foram realizados. Independente da ditadura, da censura. Muitas vezes, acabei pagando um preço por isso", diz o diretor.

    Mesmo os filmes que Neville conseguiu lançar com êxito no Brasil passaram por alguns percalços.

    "A Dama do Lotação" (1978) teve, segundo o diretor, sete minutos cortados pela censura -todos de cenas de sexo e nudez. Inspirado em texto de Nelson Rodrigues e protagonizado por Sônia Braga, fez 6,5 milhões de espectadores em 1978 -é a terceira maior bilheteria do cinema nacional. De "Rio Babilônia" (1982) foram censurados quase 15 minutos.

    Os longas e curtas reunidos no festival serão exibidos em cópias razoáveis, mas desgastadas pelo tempo, conta o curador Mario Abbade. Somente "Mangue-Bangue" foi restaurado, por conta do MoMA. Neville conta que há anos tenta, sem sucesso, captar verba para restaurar seus filmes e lançá-los em DVD.

    "O Brasil só valoriza artista morto. Para conseguir restaurar e fazer DVD de seus filmes, você precisa morrer. Foi assim que ocorreu com Glauber Rocha, Joaquim Pedro de Andrade e outros diretores. Os EUA têm mais interesse por meus filmes do que o Brasil", reclama o cineasta.

    FESTIVAL NEVILLE D'ALMEIDA
    QUANDO de 2 a 20 de julho
    ONDE Centro Cultural Banco do Brasil de Brasília (SCES trecho 02, lote 22; 61 - 3108-7600)
    QUANTO R$ 2 e R$ 4
    Confira a programação no site em bb.com.br/cultura

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