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    Opinião: No Romance e na poesia, Ariano foi mais longe que no teatro

    BRÁULIO TAVARES
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    23/07/2014 19h56

    O romance e a poesia de Ariano Suassuna são menos conhecidos do que o seu teatro, mas é neles que o escritor foi mais longe e mais fundo na experimentação com a linguagem e na produção da "realidade transfigurada" que ele defendia como um dos pontos essenciais de sua criação.

    O "Romance d'A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta" (1971), sua obra em prosa mais conhecida, reúne sátira literária, crônica histórica, romance picaresco e tragédia sertaneja, numa colagem de estilos e de gêneros como só o romance moderno comporta.

    É o volume inicial de uma trilogia projetada que prosseguiu com "História d'O Rei Degolado nas Caatingas do Sertão: Ao Sol da Onça Caetana" (1977) e "História d'O Rei Degolado nas Caatingas do Sertão: As Infâncias de Quaderna", publicado em folhetins no "Diário de Pernambuco" (1976-77).

    Outro romance, fora desse conjunto, é "A História do Amor de Fernando e Isaura" (escrito em 1956, publicado em 1994), uma versão nova do mito de Tristão e Isolda, ambientado quase todo nas rotas do rio São Francisco.

    Também difere dos outros no tom dramático, na voz narrativa e no ritmo, que não é febril, delirante e galhofeiro como na "Pedra do Reino", mas lírico, pausado e intimista. A poesia de Suassuna pode surpreender os leitores do seu teatro, que em geral não encontrarão nela a dicção popular, o humor e a fácil comunicação de sua obra cênica.

    É uma poesia que em seu núcleo mais substancial tem forte influência simbolista, dicção elevada, concentrada em formas fixas clássicas como o soneto e a oitava. As paisagens e a fauna do sertão são usados para evocar sensualidade, misticismo e fatalidade cósmica.

    A coletânea organizada por Carlos Newton Júnior, "Poemas" (1999), recolhe os textos mais importantes, inclusive os que foram objeto de edição à parte na série das "Iluminogravuras", em que texto e ilustração (do próprio autor) se fundem num conjunto onde não se podem separar as fontes clássicas e eruditas e a inspiração popular.

    Suassuna foi também um agitador cultural com ideias claras e posições firmes, sempre defendidas com ardor, humor e envolvimento pessoal.

    Seus artigos na imprensa (colaborou no "Diário de Pernambuco", na Folha e em outros veículos) são essenciais para o estudo de sua visão do mundo e de suas ideias estéticas e literárias.

    O "Almanaque Armorial", também organizado por Newton Júnior (2008), reúne artigos de jornal e alguns ensaios literários mais longos e estruturados sobre artes plásticas, literatura, política, história e cultura brasileiras.

    É uma das melhores portas de entrada para o pensamento crítico do autor.

    BRÁULIO TAVARES é escritor e compositor, autor de "Histórias para Lembrar Dormindo", entre outros, e publica no blog Mundo Fantasmo.

    Fernando Mola/Editoria de arte/Folhapress

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