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    Crítica: História de cangaceiro é metáfora da política em filme

    ELEONORA DE LUCENA
    DE SÃO PAULO

    29/07/2014 12h07

    No final dos anos 1930, o Brasil transitava do agrário para o urbano. Getúlio Vargas modernizava o país. Em Sergipe, o grupo de Lampião e Maria Bonita era desmantelado. Perseguido, um jovem sobrevivente do cangaço resolve migrar para São Paulo.

    Aqui, vira peão de obra. Como tem alguns anos de estudo, o trabalho engrena e ele começa a ser cooptado pelos patrões. Com a morte do pai, sua trajetória sofre nova reviravolta. Ele retorna ao sertão e envereda pela carreira política.

    São tempos tumultuados, que deságuam na inauguração de Brasília. O filme "Aos Ventos Que Virão", que coloca no seu título o lema da nova capital federal, faz da história desse personagem uma metáfora das marchas e contramarchas da política nacional. Inspirado numa história real, a obra expõe os dilemas de um neófito candidato idealista e as travas do coronelismo, que insiste em sufocar mudanças.

    Hermano Penna, seu diretor, já percorreu as entranhas políticas e ideológicas do sertão de meados do século passado em "Sargento Getúlio", seu primeiro longa, de 1983. Tendo como alicerces a obra-prima do romance homônimo de João Ubaldo Ribeiro e a atuação vigorosa e precisa de Lima Duarte, a fita arrebatou 22 prêmios.

    "Aos Ventos Que Virão" não tem a mesma força daquele filme precioso, mas prende o olhar logo na primeira cena, que exala ares de cinema novo. Em preto e branco, um boi é esquartejado na praça da cidade interiorana. A morte do bicho, cercado de crendices, tenta significar a superação do atraso.

    O longa segue picotando, talvez em demasia, a história do protagonista Zé Olímpio, interpretado por Rui Ricardo Diaz (que viveu Lula nas telas recentemente). O personagem escapa da caricatura ligeira, e o diretor foge, felizmente, de padrões globais de pasteurização novelesca no cinema.

    Na incipiente democracia, o ex-cangaceiro desafia o coronel local e se desespera com trapaças e injustiças. Volta o fantasma da saída violenta do modelo de Lampião. A construção de uma metrópole moderna e futurista é insuficiente para derrubar os sempre poderosos oligarcas. Fica para depois.

    AOS VENTOS QUE VIRÃO
    DIREÇÃO Hermano Penna
    PRODUÇÃO Brasil, 2013
    ONDE Caixa Belas Artes e Espaço Itaú Frei Caneca
    CLASSIFICAÇÃO 14 anos
    AVALIAÇÃO bom

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