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    Quebrada paulistana leva gíria de pipa, candomblé e flashmob à Bienal

    RAFAEL GREGORIO
    DE SÃO PAULO

    01/09/2014 03h00

    "Best-seller da quebrada", no mito local, após sua estreia esgotar as 500 cópias em dois meses, Luan Luando, 26, lança em breve seu segundo livro, "O Relo". A obra sucede "Manda Busca" e será seguida de "Tá na Mão", em trilogia que evoca gírias de empinar pipa, brincadeira ainda comum no Campo Limpo, região sul de São Paulo.

    Thiago Vinicius da Silva, 25, voz da Agência Popular de Cultura Solano Trindade, emociona-se ao falar dos poetas, bailarinos, músicos e grafiteiros do lugar onde cresceu.

    "Penso no meu irmão, morto pela polícia em uma 'saidinha' de banco. Tiramos a comunidade das páginas policiais e colocamos nas de cultura", afirma.

    Artistas de zonas pobres da capital estão na 31ª Bienal. Como na performance "Treme Terra Esculturas Sonoras", no domingo (7), do grupo de Aderbal Ashogun, que une percussão, poesia e candomblé em "flashmob ancestral".

    "Não é possível explicar os tempos atuais só com polos 'formais' de arte", afirma o francês Benjamin Seroussi, 34, curador associado.

    A ponte com os extremos da capital foi obra do Educativo, órgão da Fundação Bienal que mantém ações didáticas. Já a favela do Moinho, coprotagonista da onda social, foi apresentada pela artista Graziela Kunsch ao espanhol Pablo Lafuente, 38, um dos curadores.

    Após meses de visitas, ele identificou "uma potência criativa que escapa aos nossos olhos". Para operá-la, diz, foi preciso chamar reforços.

    EXTREMOS

    Um deles é a Solano Trindade. Desde 2009 no Jardim Maria Sampaio, na zona sul, ajuda artistas em fomento, produção e comercialização.

    Como Luando, leitor de Leminski e Manoel de Barros que despontou no Sarau do Binho. Os versos o levaram ao exterior pela primeira vez, em maio, quando 180 poetas "periféricos" foram à Feira do Livro de Buenos Aires.

    Robson Padial, 49, o Binho, também foi à Argentina. Há dois anos, quando a prefeitura fechou o bar onde ele fazia a reunião, os cerca de mil colaboradores da Solano Trindade ajudaram a mantê-la em teatros e praças, unidades do Sesc e eventos, como a Bienal do Livro e, agora, a de arte.

    Além dele, a Bienal terá 19 atos de poesia, teatro, dança e funk indicados pela Solano Trindade. Em setembro, um destaque é o balé da Associação Capão Cidadão, com meninas de cinco a 16 anos.

    MOINHO

    Arte e política também andam juntas na parceria entre projeto Comboio e Movimento Moinho Vivo, que atuam na favela do Moinho, no centro de São Paulo. O lugar terá workshops de arte e um sarau no desfecho, em dezembro.

    "Nossa arte é a informação ao mundo sobre o que acontece aqui", define o urbanista Caio Castor, 31, do Comboio. Desde 2010, o grupo fez melhorias em ocupações de sem-teto até se fixar no Moinho, onde Castor hoje reside.

    Em janeiro, o projeto criou um parque, o Vermelhão, em área destruída no último incêndio. A Bienal vai render reforma do campo de futebol.

    O social reverbera em artistas da mostra, como Armando Queiróz, que aborda questões indígenas, o coletivo Mujeres Creando, de enfoque feminista, e Juan Pérez, cujo filme "Letra Morta" foi feito em Cidade Tiradentes.

    A articulação de tradição e rua evoca os choques entre pichadores e a Bienal de SP, em 2008, e a de Berlim, em 2012. Esta curadoria, porém, não se intimida. "Esta é a Bienal do conflito, vemos nisso algo transformador. Não deve ser apagado, mas preservado", diz Seroussi.

    Confira a seguir a agenda completa das atividades promovidas pela Solano Trindade.

    *

    Treme Terra Esculturas Sonoras
    Domingo, 7/9, 16h
    Aderbal Ashogun há vinte e dois anos promove ações de articulação entre artistas plásticos, mestres de cultura popular e sacerdotes de povos e comunidades tradicionais. Sua obra mais conhecida, "Treme Terra Esculturas Sonoras", é uma performance que mescla percussão, poesia e a cultura do candomblé. A apresentação integra a inauguração da 31ª Bienal.

    Sarau da Kambinda
    Quarta-feira, 10/9, 19h
    Sarau que mira exaltar poetas e artistas que integram movimentos sociais periféricos e que invocam as matrizes africanas.

    O Menor Sarau do Mundo
    Domingo, 14/9, 16h
    Intervenção poética de um minuto de vinte segundos na qual o poeta Giovani Baffô, acompanhado de um público de até três pessoas sob um guarda-chuva, declama três poemas curtos autorais.

    Balé Capão Cidadão
    Domingo, 21/9, 16h
    Apresentação do grupo de 80 bailarinas de cinco a 16 anos da ONG Capão Cidadão, que promove oficinas de diferentes linguagens da dança para crianças e adolescentes na comunidade do Jardim Valquíria.

    Sarau A Plenos Pulmões
    Quarta-feira, 24/9, 19h
    Organizado por Marcos Pezão e dona Otília, acontece há mais 15 anos, sempre sob o mote de usar a literatura para reduzir a distância entre os habitantes de São Paulo.

    Sarau O que Dizem os Umbigos
    Domingo, 28/9, 16h
    Sarau que critica a cultura de massa televisiva e tecnológica e outros elementos que contribuem para o entendimento do mundo sob ângulos estritamente individuais e egoístas.

    Grupo de Teatro Quereres
    Domingo, 5/10, 16h
    Exibição do conjunto de jovens de 15 a 21 anos que, nascido como laboratório experimental em 2005, aborda temas como a sexualidade.

    Praçarau
    Quarta-feira, 8/10, 19h
    Sarau ao ar livre realizado na zona sul, o Praçarau também se desdobra em atividades de música e dança, além de performances.

    Sambaqui + Coral Guarani Xondaro + Vamos Brincar
    Domingo, 12/10, 16h
    Em programação que cita o Dia das Crianças, os membros mais velhos da aldeia Guarani Xonadro apresentam cânticos religiosos infantis que falam do mito da Terra Sem Mal, lugar sagrado para o povo Guarani. Também haverá apresentações da Comunidade Cultural Sambaqui e do projeto Vamos Brincar.

    Narra Várzea
    Domingo, 19/10, 16h
    Na atração, o público é estimulado a jogar o futebol com suas próprias regras e sob comentários poéticos, remetendo aos primeiros clubes de várzea no Brasil.

    Sarau Poetas Ambulantes
    Quarta-feira, 22/10, 19h
    Inspirados nos vendedores ambulantes que circulam dentro dos coletivos oferecendo mercadorias, os Poetas Ambulantes oferecem poesia falada e escrita em troca de atenção, emoção e interação. Este sarau começa já no trajeto ao Pavilhão da Bienal.

    Batalha de MCs TSP
    Domingo, 26/10, 16h e domingo, 9/11, 16h
    O TSP se define como um coletivo de propagação cultural com foco na cultura do hip hop e nas batalhas de MCs, quando rappers duelam em versos improvisados.

    Sarau Poesia na Brasa
    Domingo, 2/11, 16h
    Neste sarau, tambores africanos e oralidade são os principais elementos da roda.

    Sarau Preto no Branco
    Quarta-feira, 5/11, 19h
    Jovens de até 21 anos recitam versos de forte crítica social contra desigualdade, corrupção e preconceito.

    Barracão Cultural Capoeira Etnia
    Domingo, 16/11, 16h
    Performances de capoeira, dança coco, cacuriá e o maculelê do Barracão, movimento de resistência dentro da Ocupação Dj Lah, no Capão Redondo.

    Sarau Paumarino
    Quarta-feira, 19/11, 16h
    Oriundo do Círculo Palmarino, uma corrente política do movimento negro atuante desde 2006.

    Sarau do Binho
    Domingo, 23/11, 16h
    Desde 2004 reúne poetas, cantores, músicos, atores, artistas populares e a comunidade da periferia; um marco da cultura popular paulistana.

    Núcleo de Dança Pelagos
    Domingo, 30/11, 16h
    Apresentação do projeto formado por jovens de 15 a 18 anos do Campo Limpo.

    Sarau Versos em Versos
    Quarta-feira, 3/12, 19h
    Apresentação do sarau que acontece mensalmente no Espaço Comunidade, na zona sul de São Paulo.

    Bonde Sak Funk
    Domingo, 7/12, 16h
    No encerramento da Bienal, a dupla de rappers MC Spyke e MC Preto apresenta repertório que aborda desde problemas sociais até o funk ostentação.

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