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    Crítica: Lançado em livro, 'Diário da Dilma' é patrimônio nacional

    BARBARA GANCIA
    COLUNISTA DA FOLHA

    18/10/2014 02h49

    10 DE OUTUBRO. Bem que mamãe me disse que parasse com essa mania de assistir televisão de tarde. Mas é que aqui no palácio tem o pacote completo da Net, não consigo resistir —especialmente ao programa com aquelas quatro peruas matraqueando. Tem uma lá, ex-pinguça, que me lembra muito a Ideli. Bastou contrariá-la que a tipa já sai querendo puxar um facão.

    Olha só: eu sei que escorreguei na guacamole. Talvez, se não tivesse perdido a paciência com essa rotina insuportável de reuniões diárias, as coisas tivessem tomado outro viés. Quem já não mandou todo mundo pastar ao ser flagrada numa reunião ministerial lendo a "Contigo" escondida na pasta da ata?

    Fato é que o Lula me garantiu que eu podia deixar tudo na mão do João Santana, que ele era o cara. Senti firmeza. E o Kamura ainda mandou vir do Japão um visagista que, disse-me, foi o camarada que inventou o look do Kazuo Ohno no teatro Kabuki.

    Divulgação
    Diário Da Dilma', de Renato Terra
    'Diário Da Dilma', de Renato Terra

    Mas é inegável que minha expressão mudou da água pro volume morto, né? Nos debates, perto de mim, a Marina não parecia um Niki Lauda?

    Bem, todo esse esforço, quatro anos de clausura sem vitrine de shopping, sem chopinho tirado na hora e cá estamos nós empatados com Chucky, o Coxinha Assassino (aquele sorriso glacial e o olho vidrado já me fizeram acordar gritando).

    Mas, enfim, que será, será, como dizia a Doris Day. O Brasil pode não ter percebido (inclusive por conta deste enorme nariz de cera, termo jornalístico usado para definir uma introdução longa e cheia de embromação) que o maior legado do meu governo não terá sido a geração de 5 milhões de empregos nem a empoderação da mulher ou o fato de que eternizei a moda da manguinha três quartos.

    Não. Seguindo conselho de mamãe, resolvi reproduzir o exemplo de grandes estadistas como Getúlio Vargas, George Washington, Anne Frank e Alice B. Toklas (faltou checar as duas últimas porque estou com oito pés atrás com o IBGE) e registrei todos os meus dias na presidência em um diário que poderá servir às futuras gerações.

    Para tanto, contratei como "ghost writer" (chique!) um jovem que passava pelo corredor do Alvorada assim que cheguei ao palácio. Logo me dei conta de que era um rapaz de bem, chama-se Renato Terra, é pontual, e concordou em tomar meus depoimentos a partir de minha agenda oficial do dia, sem fazer juízo de valor que fosse me comprometer.

    Longe de mim sair do governo cheia de processos, feito aquele pobre assessor do FH, que levou anos até provar que sapo não é jacaré.

    O trabalho fluiu bem e o Renatinho nem cobra caro. Eu leio eventualmente o que ele escreve, para não me aporrinhar.

    E o pessoal mencionado no "Diário da Dilma", que passou a ser publicado na revista "Piauí" (está na cara que não foi o João Santana que lançou a publicação. Quem escolhe um nome desses para uma revista?), começou a simpatizar tanto com a prosa, que vira e mexe se ufanam por ser citados.

    Eu posso? Parece que a Graça até recorta e guarda partes do diário. E o Lobão, o muso, não o cantor que não vê um pente desde que o RPM se separou, fica todo todo a cada vez que eu falo dele.

    Diário da Dilma
    Renato Terra
    livro
    Comprar

    Porque dizem que o diário é a primeira coisa que todos leem assim que abrem a "Piauí", a informação mais importante deste texto —que presta homenagem a um dos humoristas mais engraçados do país, autor também do blog "The Piauí Herald"— é que o "Diário da Dilma" está sendo lançado em livro pela Companhia das Letras, numa edição primorosa com ilustrações do Caco Galhardo que dialogam com o papo da presidenta transcrito por seu "ghost writer".

    Atenção, Roger, do Ultraje a Rigor, Ronaldo Fenômeno e até mesmo você, candidato Aécio Neves: ainda está em tempo de mudar seu voto em nome de uma causa maior, a sobrevivência de um patrimônio nacional.

    Senhores, eu vos conclamo a votar na presidenta Dilma para que o diário escrito pelo megafabuloso super-rei do fino humor, Renato Terra, não deixe de existir.

    Duvidam? Então comprem o livro e depois a gente volta a conversar sobre a publicação mensal na "Piauí".

    DIÁRIO DA DILMA
    AUTOR Renato Terra
    ILUSTRAÇÕES Caco Galhardo
    EDITORA Companhia das Letras
    QUANTO R$ 39,50 (256 págs.)
    AVALIAÇÃO ótimo

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