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    Grupo encara cinco horas e meia de filme

    MORRIS KACHANI
    DE SÃO PAULO

    30/10/2014 02h30

    Por que mesmo que um filme deveria durar duas horas?

    As críticas falavam em temporalidade dilatada, saturação, enquadramento à distância, pausas racionais, ordem inconsciente. O próprio diretor, o filipino Lav Diaz, que já produziu filmes com quatro, oito ou 11 horas de duração, assim se referiu a seu modo de fazer cinema, em entrevista ao "New York Times": "Ele é longo e livre. A natureza é o grande ator".

    E ainda acrescentou: "Eu prefiro que cinco pessoas assistam a meus filmes do que 1 milhão". Encerrou a entrevista brincando que ainda faria um filme de 40 horas...

    De uma forma ou de outra, este era, afinal, o preâmbulo para quem quisesse encarar "Do que Vem Antes", maratona —ou épico, melhor dizendo—, de cinco horas e meia, em preto e branco e sem trilha sonora, sobre os impactos da ditadura e da guerra civil em um vilarejo no meio da floresta tropical.

    Enquanto as câmeras da CET começavam a registrar o acúmulo de vias congestionadas na cidade, às 17h50 de terça (28), 23 pessoas chegavam à sessão do MIS (Museu da Imagem e do Som). Parte já era fã de sua obra, que ganhou retrospectiva na Mostra do ano passado.

    Como o infectologista Artur Timerman, que se encantara com "Norte" (2013). "O tempo não é um problema. É um cinema que faz você pensar o que se passa na cabeça dos personagens."

    Ou Carmen Ortiz, 45, pesquisadora da Faculdade de Medicina da USP, que já deve ter gasto dois ou três dias de sua vida assistindo aos filmes de Diaz, e levou à sessão castanhas, uvas passas, biju com chocolate e suco.

    A discussão antes de o filme começar era se haveria intervalo. Um assistente da Mostra avisou: "O diretor não quer que o ritmo do filme seja quebrado, mas mandou dizer que se precisar ir ao banheiro OK, o filme estará te esperando".

    Muita gente saía apressada para ir ao banheiro. Claro que alguns tiraram um cochilo durante a exibição. E, dos 23, 19 ficaram até o final, já perto da meia-noite.

    "Minha mente não sentiu o tempo passar. Mas a coluna está doendo bastante. Tirando o físico, valeu a pena", afirmou a bancária Mariana Pasquetto, 32. Para o artista plástico Nuno Cassola, "foi quase um Ulysses', do Joyce".

    Se as pessoas ficam seis horas assistindo a "Breaking Bad" e "Mad Men", por que não a Lav Diaz? Verdade que a somatória dos diálogos devem corresponder a um episódio dos seriados americanos.

    Aí é uma questão de estilo pessoal. Se você for do tipo que "não consegue desligar" ou acha um porre contemplar por cinco ou dez minutos o gado pastando na telona, melhor encarar o rush do trânsito com seu WhatsApp e o Facebook fervendo.

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