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    Opinião: Chega de clichê tropicaliente

    07/11/2014 02h00

    ERIKA PALOMINO
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    deixamos de ser fashionistas vira-latas e aprendemos a usar criações brasileiras com algum orgulho

    Quando se comemora 20 anos de "calendário oficial", quem não estava lá mal faz ideia de como um ato aparentemente simples de firmar datas, juntar pessoas, parecia (e era mesmo) tão complicado.

    Naquele cenário, os lançamentos de uma temporada podiam durar até três meses. Complicação inerente ao Brasil de hoje, até: organizar. No caso, sincronizar toda uma indústria, inventar um modelo de evento, profissionalizar atividades e funções. Paulo Borges, com inabalável determinação, foi lá e fez o que ninguém tinha tido a energia ou a paciência de fazer.

    Ao criar para uma audiência cada vez maior, estilistas deveriam calar a máxima então vigente: "Moda brasileira é só cópia", sob a pressão de mostrar que tinham algo legítimo e próprio a contar para o mundo.

    Players importantes se voltaram para a cultura brasileira, na tentativa de achar inspiração em raízes que, a bem da verdade, por serem populares, ainda não refletiam suas verdadeiras vontades.

    Em outras pontas, alguns estilistas tentavam impor (e impuseram, por fim) uma linguagem mais regional, outros traçavam um caminho saído do underground, e que também foram absorvidos pelo mainstream.

    Não fizemos um movimento como o dos japoneses, o dos belgas, nem o "Made-in-Italy" ou o "ready-to-wear" americano. E se lá no anos 1990 já nos perguntávamos se existiria uma identidade brasileira de moda, a pergunta que não cala ganhou distintos contornos: quando um criador brasileiro desfila fora do Brasil hoje, ele é menos um brasileiro do que um estilista. E o que o mercado espera dele é uma entrega real, criativa, usável, inspiradora e inspirada. Se ele nasceu aqui, tanto faz, ainda que de quando em quando o pessoal goste de uma referência à terra natal do designer. Isso, de qualquer designer. Não só dos brasileiros.

    O mercado brasileiro quer quase a mesma coisa: a mídia especializada espera criações próprias, em sintonia com mesmas silhuetas, proporções e tendências do restante do cosmos, mas sem referências muito literais –ao menos na passarela.

    Os consumidores, por sua vez, querem preço/qualidade, neste momento em que tanto é alto o preço do produto nacional quanto o que pagam as marcas para produzir.

    Deixamos de ser vira-latas fashionistas, ao longo desses 20 anos, e aprendemos (a elite também) a consumir com algum orgulho o que é criado pelos brasileiros, enquanto as ruas continuam a se apropriar com veloz voracidade dos modismos das novelas.

    Neste panelaço, entrou a relevância da manufatura, e com ela as emergentes marcas mineiras –soberanas em bordados, brocados, malhas. Tire do molho clichês tropicalientes e acrescente ingredientes como a extraordinária soberania dos fabricantes de biquínis e de jeans (que conhecem como poucos as curvas do corpo feminino) e, por fim, finalize com a ginga da mulher brasileira, esta sim, pimenta que só nesta terra nasce.

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