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    Fenômeno 'Serial' reconstitui investigação falha de assassinato

    GABRIELA SÁ PESSOA
    DE SÃO PAULO

    01/12/2014 02h00

    Na atual era de ouro da TV americana, uma das mais comentadas novidades de 2014 no mundo do entretenimento é um seriado ao qual, literalmente, ninguém assistiu.

    Trata-se da audiossérie "Serial", idealizada pela jornalista americana Sarah Koenig, que investiga a possibilidade de o julgamento real de um assassinato ter sido injusto.

    Elise Bergerson/The New York Times
    A jornalista Sarah Koenig em gravação de um episódio de 'Serial', em Nova York
    A jornalista Sarah Koenig em gravação de um episódio de 'Serial', em Nova York

    Dividida em nove capítulos, a produção foi ao ar semanalmente de 3 de outubro a 20 de novembro no site serialpodcast.org e no iTunes. Tudo de graça, ainda disponível para quem quiser ouvir.

    "Serial" chegou a ser o quinto podcast mais ouvido no iTunes no Brasil, apesar de os episódios de, em média, 45 minutos estarem em inglês.

    No mundo, já teve mais de cinco milhões de downloads. Somando smartphones e web, cada capítulo tem, em média, 1,5 milhão de ouvintes. É a mesma audiência de um episódio da bem sucedida "Louie", série de comédia exibida pelo canal pago FX.

    "Quando vi os números, meu queixo caiu", disse Koenig ao "New York Times".

    O podcast reconstitui a investigação da morte da estudante Hae Min Lee, 17. Ela foi assassinada na tarde de 13 de janeiro de 1999, em Baltimore, no Estado de Maryland.

    Koenig abriu os arquivos do processo quando, há pouco mais de um ano, recebeu uma carta de Rabia Chaudry. A remetente é amiga da família de Adnan Syed, ex-namorado de Lee, condenado à prisão perpétua pelo crime.

    Chaudry se recusava a acreditar que um garoto bom e adorado pela comunidade, como Syed, hoje com 35 anos, teria sido capaz de estrangular e esconder o corpo da ex-namorada em um terreno baldio. Pediu que a repórter desse uma olhada no caso, até então esquecido do noticiário.

    QUEM MATOU...?

    Fisgada pela história, Koenig seguiu o rastro da polícia e reviu o álibi do condenado. Ela leu páginas e páginas de cartas e relatórios, teve acesso aos diários da vítima, ouviu gravações dos depoimentos à polícia (que reproduz na audiossérie) e entrevistou algumas dezenas de personagens ligados ao caso.

    Inclusive o próprio Syed, com quem conversou em um sem número de ligações para o telefone do presídio. "Passamos ao menos 30 horas no telefone, mais do que já falei na vida com muitos amigos", diz a repórter, no sexto episódio.

    O tom subjetivo com que a jornalista alinhava as informações -algumas delas, inéditas- faz com que a imaginação do ouvinte acompanhe cada ponto em sua linha de raciocínio. Até mesmo porque o roteiro e parte da apuração vão sendo construídos ao longo da temporada.

    Ela teve uma epifania ao se deparar com as inconsistências do inquérito. Sem nenhuma evidência física, a acusação se baseou apenas no testemunho de um colega do réu e em gravações telefônicas questionáveis.

    Existe, como ela descobre, uma possibilidade concreta de Syed não ser inocente, mas há também uma chance de que outros dois suspeitos tenham cometido o crime.

    Até o fim da temporada, nem mesmo Koenig podia afirmar se a condenação de Syed fora justa. "Seria ótimo escrever uma história e tirar um inocente da cadeia", disse à "Time". "Não é o que consegui. De forma alguma."

    O mistério em torno de quem matou Hae Min Lee segura o suspense dos nove capítulos, aguardados ansiosamente pelo público. Cada episódio tem um clímax no final, com novas testemunhas e fatos que sustentam (ou não) a culpa de Syed.

    A estrutura mistura a apuração jornalística de "A Sangue Frio", livro de Truman Capote, com a estrutura fragmentada das séries para a TV, como a recente "True Detective", da HBO, e a clássica "Twin Peaks", dirigida por David Lynch e com nova temporada prometida para 2015.

    A Folha tentou entrevistar Koenig, mas a produção de "Serial" afirmou que a agenda está lotada até o fim do ano. Até lá, ela está comprometida com a segunda temporada, confirmada na quinta (27).

    Sem um grande patrocinador, a próxima leva de episódios foi financiada coletivamente, com doações do público pela internet.

    Os episódios devem ir ao ar no começo de 2015, mas ainda não se sabe se o enredo continua noir. Em entrevista ao site americano Vulture, Koenig disse que continuar falando sobre crime é praticamente caso encerrado em "Serial".

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