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    Crítica: América incapaz de se ver e se pensar é representada em 'Foxcatcher'

    INÁCIO ARAUJO
    CRÍTICO DA FOLHA

    22/01/2015 02h02

    Duas cenas definem "Foxcatcher". Na primeira, logo na abertura, Mark Schultz, campeão olímpico de luta, fala a uma plateia desinteressada e semideserta sobre o valor de sua medalha de ouro.

    Na outra, pouco depois, Mark desembarca na suntuosa propriedade da família Du Pont, onde pontifica o quaquilionário John Du Pont, apaixonado por luta olímpica e pelos valores da América.

    John pretende fazer de Mark a estrela de sua equipe de wrestling (luta greco-romana) e levar os EUA a uma vitória na Olimpíada de Seul-1988, e, no mais, afirmar-se como técnico.

    Scott Garfield/Divulgação
    Steve Carell em cena do filme
    Steve Carell em cena do filme

    Uma parte considerável do filme de Bennett Miller consiste em desenvolver as relações entre esses dois solitários, atravessadas por outros dois personagens: Dave, o irmão mais velho de Mark, e Jean, a mãe de John.

    Com Dave, John disputará a condição de mentor espiritual de Mark. Situação meio complicada, pois Dave é quem se ocupou da educação de Mark desde a infância.

    Com Jean, John manterá uma relação de amor e distância, já que ela aprecia cavalos (ele os despreza) e despreza as lutas (ele as vê como aquilo que deve servir de exemplo e inspiração para os jovens).

    A evolução das relações interpessoais justifica as indicações ao Oscar de roteiro original e direção, bem como as de ator (Steve Carrell, como John) e ator coadjuvante (Mark Ruffalo, como Dave). Mas não explicam sua exclusão da categoria de melhor filme.

    A explicação, talvez, deve ser buscada no caráter corrosivo do longa, pois seu coração são os "valores da nação". Não importa muito quais sejam eles, e sim a maneira como são vivenciados pelos dois protagonistas.

    Mark ostenta uma versão infantil do patriotismo: medalhas de ouro, orgulho nacional. John os carrega em sua forma demencial: esses valores, cultivados na história dos EUA, traduzem-se em poder (bélico, econômico) e dominação (interpessoal). São um vazio que John sobrepõe a seu próprio vazio existencial.

    Essa América incapaz de se ver e se pensar é a que Miller representa em 'Foxcatcher'.

    No mais, o filme tem um subtítulo brasileiro que não faz sentido: "Uma História que Chocou o Mundo". O mundo não tomou grande conhecimento dos fatos narrados. Talvez eles sejam, tal como traduzidos pelo filme, mais representativos de impasses vividos pelos EUA hoje.

    FOXCATCHER
    DIREÇÃO Bennett Miller
    ELENCO Steve Carrell, Channing Tatum, Mark Ruffalo
    PRODUÇÃO EUA, 2014, 14 anos
    QUANDO estreia nesta quinta (22)
    AVALIAÇÃO ótimo

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