Paulo Szot estava em casa. Na acústica aconchegante do Theatro São Pedro, seus graves robustos e agudos límpidos circulavam pela plateia antes de atingirem cada um em sensação, emoção e reflexão.
O regente Luiz Fernando Malheiro parecia se divertir e a jovem Orquestra do Theatro São Pedro (muito bem ensaiada) mostrou que a grandiosidade de Mahler (1860-1911) e Wagner (1813-83) cabem no palco discreto da Barra Funda.
A carreira de Szot é a prova de que há conciliação técnica para os mundos aparentemente díspares do musical e do canto lírico. Sua voz passa pelos diferentes registros com nuances particulares, e com controle total da carga teatral e poética dos textos.
O concerto de domingo (8) integra uma série criada como parte da reestruturação do teatro promovida por Malheiro.
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Paulo Szot, ganhador de um Tony Award, se apresentou no Theatro São Pedro |
Elogiado tanto na Broadway quanto no Metropolitan Opera –com programações voltadas a públicos diversos na cidade de Nova York–, Szot havia cantado em São Paulo em 2014 como parte do elenco de "Candide", de Leonard Bernstein (1918-1990), com a Osesp.
Há quem não aprecie os recitais com trechos de diferentes óperas –o que seria o mesmo que fazer cenas descontextualizadas de diferentes peças de teatro. Mas, se o objetivo é apreciar os dotes de um artista convidado, não há melhor meio.
Em uma casa dedicada à voz, seria importante utilizar legendas não apenas nas óperas, mas também em recitais especiais –ainda mais em um programa cantado em alemão, italiano e russo.
As quatro canções do ciclo "A Trompa Mágica da Juventude", de Mahler, são pura curtição sonora. A orquestração sedutora, a ironia das "notas erradas", a independência dos naipes e a evocação dos toques militares seriam a matriz da música futura do compositor tcheco, a começar por "Antonio de Pádua Pregando aos Peixes", base do "Scherzo" da "Sinfonia n.2".
A ária de "As Bodas de Fígaro", de Mozart (1756-91), ópera montada pelo São Pedro no final do ano passado, foi um dos momentos mais aplaudidos da tarde.
De família polonesa, Szot canta à vontade em russo, o idioma de sua estreia como protagonista em Nova York. A bela ária de "Eugene Onegin", de Tchaikovsky (1840-1893), poderá ser conferida este ano em São Paulo (a obra será montada pelo Municipal em maio próximo).
Depois da abertura instrumental de "La Traviata", de Verdi (1813-1901), a ária "Era un Tramonto d'Oro", no genuíno italiano do brasileiro Carlos Gomes (1836-1896), arrebatou a plateia (e foi repetida como bis ao final). É música simples e, por isso mesmo, o intérprete tem mais espaço para mostrar sua musicalidade.
E, por fim, Wagner: o prelúdio orquestral do terceiro ato de "Lohengrin" e uma complexa cena de "A Valquíria". Ao que se saiba, é a primeira vez que Szot se aventura nesse repertório pesado e escuro. Ele parece estar se preparando para novos desafios.
PAULO SZOT
AVALIAÇÃO muito bom