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    Vídeos do YouTube inspiram filme sueco sobre tragédia íntima

    RODRIGO SALEM
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE LOS ANGELES

    05/03/2015 02h48

    Turistas almoçam em um restaurante ao ar livre nos alpes franceses. De repente, explosões ativam uma avalanche e, o que deveria ser a "limpeza" de pista para os esquiadores, quase inicia uma tragédia: a torrente de neve parece sair do controle e os turistas correm em busca de refúgio. Segundos depois, voltam constrangidos.

    A cena mais impactante de "Força Maior", longa do sueco Ruben Östlund, vencedor do prêmio do júri da mostra Un Certain Regard, no último Festival de Cannes, propõe ao espectador uma sequência de filme-catástrofe. A tragédia que se forma é íntima, porém não menos devastadora que um desastre natural.

    Ao abandonar sua família na mesa do restaurante, Tomas (Johannes Kuhnke) quebra o estereótipo do "macho protetor". Quando retorna, sua mulher, Ebba (Lisa Loven Kongsli), mal consegue encará-lo, e todo o relacionamento é colocado em xeque.

    Divulgação
    Cena do filme sueco 'Força Maior'
    Cena do filme sueco 'Força Maior'

    "Uma das primeiras coisas que investiguei foi quais emoções sucedem situações extremas", conta o cineasta sueco. "O número de divórcios aumenta depois de uma experiência assim. A pessoa afetada olha para o lado e pensa: 'Não quero viver com alguém que não age como um herói'."

    Östlund, contudo, trouxe a inspiração de um lugar muito óbvio e, por muitas vezes, renegado por cineastas: a internet. Ex-diretor de filmes esportivos de esqui, ele pegou emprestada a cena da avalanche de um vídeo postado no YouTube. "Há diversos momentos extraordinários filmados por amadores no mundo", explica. "Toda vez que escrevo uma cena, pesquiso no Google algum vídeo."

    O momento em que seu protagonista desaba em lágrimas por não suportar o desprezo da mulher vem da pesquisa "o pior choro masculino da história". O ônibus quase matando turistas saiu de "motorista espanhol idiota quase mata turistas".

    "É bastante similar ao meu filme", diverte-se Östlund, que foi indicado ao Globo de Ouro de filme estrangeiro e foi pré-indicado ao Oscar 2015. "Posso 'roubar' o que quiser para meu filme."

    Mas o sueco de Gotemburgo diz que a inspiração final para o roteiro veio de um amigo próximo que "fez muita merda na vida e se arrepende". "Ele falou: e se o pai fugir e deixar a mulher e os filhos para trás, mas precisar voltar e encará-los?" E foi assim que criei o roteiro".

    "Nos desastres marítimos, a maioria dos mortos são mulheres e crianças, enquanto os sobreviventes são mais do sexo masculino", diz. "Neste tipo de situação, podemos agir de forma egoísta, quase primitiva. Bate de frente com a ideia de herói do cinema."

    "Força Maior" não tem nada de hollywoodiano. Examina expectativas sociais e de gênero e faz a pergunta que poucos conseguem responder: como você agiria em uma situação de perigo extremo?

    "Tenho duas gêmeas pequenas e sei que é importante para nossas mulheres falarmos que as protegeríamos em uma avalanche", afirma Östlund. "Mas não tenho certeza do que faria, porque o que estaria em jogo seria o instinto de sobrevivência, que não é algo que pode ser levado como hipótese. Espero tomar a atitude de proteger minha família, mas não tenho certeza. Ninguém tem." (Rodrigo Salem)

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