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    Crítica: Butusov, como Stanislavski, redescobre 'A Gaivota'

    NELSON DE SÁ
    DE SÃO PAULO

    07/03/2015 13h00

    Os diretores Antunes Filho, 85, e Zé Celso, 77, não arredaram pé da apresentação para convidados de "A Gaivota", que terminou por volta de 1h30 de sexta-feira, cinco horas depois de começar.

    A atitude é um tributo à encenação do colega russo Yuri Butusov para o grande clássico moderno, ao frescor que trouxe para um texto que ambos e boa parte da plateia conheciam bem demais.

    Em uma peça sobre o próprio teatro, com atrizes e dramaturgos como protagonistas, Butusov se dá a liberdade de tratar o original como se estivesse num ensaio, sem compromisso com produto final.

    Ekaterina Tsvetkova/Divulgação
    Atores de "A Gaivota", que tem última sessão neste sábado na Mostra internacional de Teatro de SP
    Atores de "A Gaivota", que tem última sessão neste sábado na Mostra internacional de Teatro de SP

    Descarta cenas à vontade, ao longo de todo o texto, e ao mesmo tempo repisa obsessivamente outras pequenas cenas seminais. Toma os diálogos e solilóquios de Tchékhov e os torna brinquedos seus e dos outros atores.

    Mas não resultam daí -como acontece tantas vezes- exercícios autocentrados e enfadonhos, pelo contrário, "A Gaivota" se oferece ao espectador como experiência despretensiosamente prazerosa.

    O subtexto melancólico da peça e da montagem célebre de Stanislavski, que tirou muitas das suas fórmulas de preparação daquela experiência, dão lugar à derrisão, ao gesto sarcástico quase intermitente. Como parece indicar o nome da companhia, Satiricon, e também a trilha sonora de marcha cômica, um modelo próximo seria Fellini -e também Petrônio.

    O impacto dessa irreverência toda com o clássico, inclusive de movimentos, dança, é libertador para o público, que sai do primeiro ato em estado de graça, como crianças que deixam um playground de pernas para o ar.

    O segundo ato traz elementos de melodrama, o que reduziu o entusiasmo e parte da plateia, mas "A Gaivota" se mantém reveladora até o fim, com suas múltiplas versões para diálogos tão conhecidos.

    Butusov e o cenógrafo Alexander Shishkin, num espetáculo que é quase uma homenagem ao teatro, bebem em referências modernas da encenação. O diretor ainda escala a si mesmo no palco e parece, também ele, brincar.

    Mas o melhor talvez esteja no que consegue de seus atores, que vêm de uma tradição invejável de interpretação, com domínio de tempo de comédia, de seus próprios gestos e vozes e muito mais.

    A GAIVOTA
    quando neste sábado (7), às 16h
    onde Auditório Ibirapuera, av. Pedro Álvares Cabral, s/nº, tel. (11) 3629-1075
    quanto ingressos esgotados
    avaliação ótimo ★★★

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