• Ilustrada

    Saturday, 27-Apr-2024 06:35:11 -03

    'Precisamos de menos filósofos e mais professores', diz Fernando Savater

    SYLVIA COLOMBO
    DE SÃO PAULO

    26/03/2015 02h00

    "Em vez de reclamar que os jovens não gostam de ler, que só querem saber de internet e não estão nem aí para a filosofia, prefiro tentar fazer alguma coisa."

    Assim explica o ensaísta, dramaturgo e professor de ética espanhol Fernando Savater, 67, a razão pela qual lança tantos títulos dedicados a esclarecer a jovens leitores o que é a política, a filosofia e a literatura.

    "No mundo de hoje, precisamos de menos filósofos e de mais professores", diz à Folha, por telefone.

    Josep Lago - 16.out.2008/AFP
    O ensaísta espanhol Fernando Savater
    O ensaísta espanhol Fernando Savater

    Vencedor dos principais prêmios espanhóis (Ortega y Gasset, Planeta, Anagrama) e autor de mais de 50 livros ("Política para Meu Filho" e "Ética Urgente!" foram lançados aqui pela Planeta e pelas Edições Sesc, respectivamente), Savater integra o elenco do ciclo de debates Fronteiras do Pensamento deste ano em São Paulo.

    Também estão na programação o cientista britânico Richard Dawkins, a ensaísta americana Camille Paglia e o poeta e colunista da Folha Ferreira Gullar (leia ao lado).

    CIDADANIA

    Na palestra no Brasil, Savater abordará temas relacionados aos conceitos de cidadania e democracia. Considera que vivemos um período turbulento por causa da persistência de nacionalismos que carregam algo de anacrônico.

    "Nas sociedades cosmopolitas e mestiças dos dias de hoje, em que habitamos espaços virtuais junto aos reais, não faz sentido relacionar a representação política à ideia de nacionalidade. Cidadania não pode dizer respeito a apenas um lugar, mas, sim, a um conjunto de direitos universais. Gostaria que fôssemos mais céticos com relação à ideia de nação."

    Apesar de identificar claras diferenças entre Europa e América, considera que o fervor nacionalista está na raiz de crises políticas em ambos os lados do Atlântico.

    "O nacionalismo é a ideologia mais simples. Para ser comunista ou liberal, é preciso ler alguns livros e conhecer certas teorias. Para ser nacionalista não é necessária nenhuma elaboração mental. Basta dizer: 'Nós somos os melhores e a culpa de nossos problemas é dos outros, eles é que são os maus'. Em países com pouca formação política, é muito eficiente."

    Velho conhecedor do terrorismo –foi ameaçado de morte pelo ETA (movimento separatista basco) e viveu por mais de dez anos com escolta–, Savater considera a milícia radical Estado Islâmico uma ameaça com nova roupagem.

    "É muito mais agressiva porque é diferente das lutas políticas e nacionalistas que já vimos no passado. Trata-se de um terrorismo niilista, que vai contra aquele que é diferente e contra o que construímos no passado."

    CRÍTICAS

    Na Espanha, Savater divide opiniões. Já colecionou ataques de conservadores por defender o aborto e a eutanásia (o primeiro é despenalizado no país, o segundo, não) e críticas de catalães e bascos por defender o castelhano como idioma nacional (Savater é basco).

    "Os nacionalismos na Espanha têm servido para encobrir más gestões, especialmente na Catalunha."

    Recentemente, Savater tem questionado o Podemos (partido de centro-esquerda originado a partir dos protestos dos "indignados", em 2011) e seu líder, o popular Pablo Iglesias. "É uma esquerda que quer voltar ao discurso dos anos 1970, às bandeiras dos anos 1970. É uma viagem no tempo."

    LITERATURA

    Autor de alguns títulos de iniciação à leitura, também provoca incômodo ao recomendar que jovens leitores não sejam necessariamente introduzidos a clássicos como "Dom Quixote" ou "Os Lusíadas", logo no começo de suas formações.

    "Os professores devem ensinar que esses livros são importantes e dizer o motivo, mas também comentar com os alunos os livros que interessam a eles. Senão, não há maneira de competir com meios como a televisão e as redes sociais."

    O espanhol, porém, comandou e apresentou a série de sucesso "Lugares con Genio" para a televisão espanhola, que visitava cidades onde se inspiraram ou viveram autores consagrados, como Praga de Kafka, Londres de Virginia Woolf, Buenos Aires de Jorge Luis Borges e outros (é possível encontrar os episódios no YouTube). Do Brasil, se diz um leitor de Machado de Assis.

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024