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    Últimos trabalhos de Tomie Ohtake ganham exposição em São Paulo

    SILAS MARTÍ
    DE SÃO PAULO

    01/04/2015 02h20

    Tomie Ohtake, morta aos 101, em fevereiro, pintou quase 30 telas nos últimos meses de vida. Ela decidiu parar de trabalhar quando viu que tinha esgotado uma última questão —a relação entre desenho
    e gesto na superfície da tela.

    Na primeira mostra póstuma da artista, agora no centro cultural que leva seu nome, estão pinturas monocromáticas, mais de metade delas branca e outra parte de tons luminosos, como vermelho, azul, verde e amarelo.

    Enquanto as coloridas enfatizam a vibração e a saturação da cor, as brancas parecem mergulhadas num silêncio sepulcral, o que alguns críticos viram como uma espécie de despedida da artista.

    Despedida ou não, Tomie estava preocupada em não se repetir. Sua série monocromática foi um último canal de experimentação antes da morte.

    "Ela não era uma artista de rupturas, de mudar a agenda", diz Paulo Miyada, que organiza a mostra. "Mas ela ia alternando a ênfase entre o gesto, a cor e a matéria, fez isso ao longo de toda a vida."

    De longe, suas últimas telas parecem calcadas na experiência pura da cor. Mas vistas de perto, elas revelam composições discretas, com linhas surgidas dos volumes de tinta que estruturam o quadro.

    "Não há nenhuma variação tonal", diz Miyada. "O desenho nessas telas é o relevo da tinta, que cria figuras muito sutis a partir da sombra. É uma poética das sombras que define o trabalho."

    Essa dualidade entre o traço e sua ilusão ganha corpo na mostra, já que as telas brancas, em que os relevos são quase imperceptíveis, formam a linha de frente, enquanto as coloridas estão penduradas atrás delas, numa espécie de choque visual, com formas mais nítidas que se projetam da superfície dos quadros.

    RELEVOS
    Miyada compara essa estratégia dos relevos usada na última série da artista às conquistas visuais de Da Vinci, que ancorou os avanços de sua obra na indefinição dos contornos. Uma variação sutil da luz aproxima ao máximo as linhas na tela da forma como o olho humano distingue figura e fundo.

    Não há fundo ou figura nos monocromos de Tomie, a não ser as linhas que despontam como acidentes geográficos. Mas Miyada enxerga ali uma vibração semelhante ao silêncio enigmático de uma "Mona Lisa", construído com a técnica renascentista de pincelada porosa, atravessada pela luz.

    Na mesma pegada, as esculturas em aço da artista, todas brancas e vazadas, enfatizam a ideia de presença sutil no espaço. Juntas na mostra, elas constroem um desenho em três dimensões, dotado de uma vibração emudecida.

    TOMIE OHTAKE
    QUANDO abre hoje (1º), às 20h; de ter. a dom., das 11h às 20h; até 7/6
    ONDE Instituto Tomie Ohtake, r. Coropés, 88, tel. (11) 2245-1900
    QUANTO grátis

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