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    Diretor torna drama de Shakespeare em um espetáculo sobre tirania

    IARA BIDERMAN
    DE SÃO PAULO

    10/04/2015 02h19

    O protagonista já diz a que veio na primeira fala. Encarando o espectador, ele conta que quer o poder e avisa que fará qualquer coisa para isso.

    Se você pensou em Frank Underwood, o político sem escrúpulos representado por Kevin Spacey na série "House of Cards", só errou em parte.

    Ricardo 3º, rei da Inglaterra no século 15, inspirou a peça homônima de Shakespeare e o personagem de Spacey –que interpretou o monarca inglês no palco antes de encarnar Underwood.

    O personagem shakespeariano também inspirou o diretor Sergio Módena a montar com o ator Gustavo Gasparani a versão solo de "Ricardo 3º", que estreou na quinta-feira (9), em São Paulo.

    A opção por fazer a montagem, originalmente com mais de 50 atores, com um só intérprete tem vários motivos.

    Além da dificuldade de montar uma produção gigante, é também uma forma de, com linguagem contemporânea, abordar tanto a parte histórica –a Guerra das Rosas (1455-85) e o fim da dinastia Plantageneta, de Ricardo 3º–quanto a atualidade da luta sem limite pelo poder.

    Há também o fato de o texto de Shakespeare ser tão centrado no protagonista que os demais nem são lembrados.

    "Muitos estudiosos dizem que o personagem é um grande ator. Ele avisa que vai se fingir de bonzinho, usar várias máscaras, e o público se torna seu cúmplice. Com um só ator, você tem isso em dobro: o personagem assume diferentes máscaras e o ator também, se desdobrando em outros personagens da peça", diz Módena.
    esquizofrenia

    Na versão em cartaz, o "elenco" foi reduzido a 24 personagens, que o ator Gustavo Gasparani interpreta sem mudar de roupa e com alterações muito sutis de voz.

    "É uma esquizofrenia bacanérrima, mas no começo foi duro, não conseguia ensaiar mais de duas horas, tinha dores de cabeça horríveis, principalmente nas cenas de barracos familiares", conta o ator.

    Depois de quase dois anos em cartaz no Estado do Rio de Janeiro, Gasparani já se acostumou com a pedreira de interpretar sozinho a construção de um tirano e seus antagonistas. Mas às vezes ainda se espanta com a reação da plateia.

    "De vez em quando penso: 'que gente sórdida, estão do lado desse rei sanguinário'. Mas é que as pessoas ficam fascinadas com a inteligência com que ele arquiteta sua escalada ao poder, querem ver até onde ele será capaz de ir", conta Gasparani.

    É também curioso como a plateia entra no clima também histórico da trama sem ter elementos realistas para isso: o cenário minimalista é formado basicamente por um quadro de avisos, uma mesa de escritório, uma cadeira.

    "Criamos soluções que são como brincadeiras de crianças, que transformam uma cadeira em um cavalo, por exemplo. Contamos com a imaginação do público, é quase um pacto: as pessoas se predispõem a acreditar que um abajur é a Torre de Londres", diz Módena. (iara biderman)

    RICARDO 3º
    QUANDO qui. a sáb., às 20h30; até 23/5
    ONDE Sesc Pinheiros, r. Paes Leme, 195, tel. (11) 3095-9400
    QUANTO de R$ 7,50 a R$ 25
    CLASSIFICAÇÃO 12 anos

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