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    Família encontrou relíquias milenares ao cavar o piso de casa na Itália

    DAVIDE MONTELEONE
    DO "NEW YORK TIMES"

    25/04/2015 03h40

    Ao comprar a casa da rua Ascanio Grandi, 56, Luciano Faggiano, 60, só queria abrir um restaurante. O único problema era o banheiro. O esgoto não parava de refluir.

    Por isso, convocou seus filhos mais velhos para ajudá-lo a cavar uma vala e investigar o caso. Ele previu que o trabalho levaria cerca de uma semana.

    Quem dera. "Descobrimos corredores subterrâneos e outros cômodos, por isso continuamos cavando", disse Faggiano.

    Sua busca por uma tubulação de esgoto, em 2000, se tornou uma história de obsessões e descobertas familiares. Ele encontrou um mundo subterrâneo que remontava a antes do nascimento de Cristo: um túmulo messápio, um silo romano, uma capela franciscana e até gravuras dos Cavaleiros Templários.

    O que era para ser uma "trattoria" virou museu, aonde novas relíquias seguem chegando.

    A Itália tem muita história, com impérios e civilizações antigas sendo construídos em camadas superpostas, como um bolo. Ainda hoje, agricultores desenterram cerâmicas etruscas ao arar suas lavouras.

    Situada no calcanhar da bota italiana, Lecce já foi uma encruzilhada crucial na região do Mediterrâneo, cobiçada por todos os invasores -dos gregos aos romanos, dos otomanos aos normandos e lombardos.

    O vereador Severo Martini disse que as relíquias aparecem regularmente e podem se tornar uma dor de cabeça para o planejamento urbano. "Sempre que você cava um buraco séculos de história aparecem".

    A família Faggiano sabe bem como é isso. Luciano planejava instalar o seu restaurante no térreo, para morar no andar de cima. Seu filho mais velho, Marco, estudava cinema em Roma.

    O segundo filho, Andrea, tinha saído de casa para fazer faculdade. Os dois pararam de estudar para trabalhar com o pai. O edifício parecia modernizado, com paredes brancas e um novo sistema de calefação.

    Mas uma semana se passou rapidamente enquanto pai e filhos descobriam um fundo falso que levava a outro andar, medieval e de pedra, que por sua vez levava ao túmulo dos messápios, povo que viveu na região séculos antes de Cristo.

    Logo depois a família descobriu um cômodo usado pelos antigos romanos para armazenar grãos, além do porão de um convento franciscano, onde as freiras preparavam cadáveres para o sepultamento.

    Faggiano inicialmente não contou à esposa sobre a extensão do trabalho, possivelmente porque estava amarrando uma corda ao redor do tórax do seu filho mais novo,
    Davide, então com 12 anos, e baixando-o para escavar as aberturas pequenas e escuras que ia encontrando.

    Pesquisadores interditaram as escavações. Um ano se passou. Faggiano finamente foi autorizado a retomar a busca pelo problema no esgoto, desde que sob a supervisão de funcionários do patrimônio histórico.

    A família descobriu vasos antigos, garrafas usadas pelos romanos para fins religiosos, um anel antigo com símbolos cristãos, artefatos medievais, afrescos ocultos e muito mais.

    "A casa tem camadas representativas de quase toda a história da cidade, dos messápios aos romanos, da época medieval à bizantina", disse Giovanni Giangreco, funcionário aposentado do patrimônio cultural.

    Faggiano continuava sonhando em abrir um restaurante, apesar de esse projeto ter se tornado uma ideia intangível.

    Os anos passaram. Seus filhos conseguiram dar o fora. Os arqueólogos da prefeitura o incentivaram a persistir. Ele admite que também ficou obcecado.

    Hoje, a casa virou o Museu Faggiano.Poucos anos depois da escavação, finalmente achou o cano problemático. Estava mesmo quebrado. Depois disso, comprou outro imóvel e cogita de novo abrir um restaurante. "Sou teimoso demais", disse.

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