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    CRÍTICA

    Autor Osvaldo Peralva demole utopia bolchevista em 'O Retrato'

    REINALDO AZEVEDO
    COLUNISTA DA FOLHA

    30/05/2015 02h30

    Em 1960, o jornalista Osvaldo Peralva começou a publicar, em jornal, capítulos do que viria a ser "O Retrato", ora reeditado pelo Três Estrelas.

    O livro demole o novo homem da mitologia comunista. A última edição era de 1962. O brasileiro estava privado havia 53 anos de uma leitura do comunismo sem retoques. Os esquerdistas não perdoam. Matam pessoas e memórias.

    Peralva sabia do que falava. Havia morado em Moscou e fora o representante do PCB no Kominform, o escritório de informação dos partidos comunistas, com sede na Romênia, que coordenava as ações dos camaradas mundo afora e editava o jornal "Por Uma Paz Duradoura, Por Uma Democracia Popular".

    Fora enviado a Bucareste em 1955, no transe entre a morte de Stálin (1953) e a ascensão de Kruschev.

    Divulgação
    Um dos mais contundentes relatos políticos brasileiros do século 20
    'O Retrato', de Osvaldo Peralva

    Boa parte do livro é dedicada à sua experiência romena. Não esperem encontrar revelações sobre os crimes comunistas. Peralva desenha menos o retrato de homens cruéis do que o de homens medíocres.

    Outro tanto é dedicado aos embates no PCB. Figuras com Luís Carlos Prestes, João Amazonas e Carlos Marighella são reveladas em sua dimensão mesquinha. Em 1946, uma espécie de tabela meritocrática atribuía 50 pontos à adesão de um operário ao partido. Um intelectual, a escória, valia apenas dez. O ódio da esquerda à inteligência é anterior a Marilena Chaui...

    "O Retrato" é a narrativa de uma desilusão sem amargura. Mesmo demonizado em razão do livro, Peralva se conservou um "socialista democrático". O AI-5 o levou para o exílio. Voltou apenas em 1979, com a anistia, e passou a integrar o Conselho Editorial da Folha. Morreu em 1992, aos 74 anos.

    Num "post-scriptum" de 1962, escreve sobre a divisão dos comunistas em dois partidos: "Um [PCB] quer tornar-se legal para ampliar sua participação nas batalhas eleitorais; outro [PC do B] acha que o mais importante é não pôr a cabeça muito de fora, resguardando-se para as lutas revolucionárias que prevê avizinharem-se".

    Pois é. O PC do B promoveu a guerrilha do Araguaia. Com os desdobramentos conhecidos. E não reconhece até hoje os crimes de Stálin.

    O RETRATO
    AUTOR Osvaldo Peralva
    EDITORA Três Estrelas
    QUANTO R$ 69,90 (440 págs.)
    AVALIAÇÃO bom

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