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    Vida familiar inspirou Anthony Doerr em livro premiado com Pulitzer

    FERNANDA REIS
    DE SÃO PAULO

    18/06/2015 02h40

    Escrevendo "Toda Luz que Não Podemos Ver", Anthony Doerr ouviu de um amigo que se pegassem todos os livros sobre a Segunda Guerra, arrancassem as páginas e as jogassem na Alemanha, o país ficaria coberto. "Pensei, meu Deus, por que eu iria acrescentar algo a isso?", ri.

    Doerr seguiu em frente e o livro, lançado dez anos após o episódio, ganhou em abril o prêmio Pulitzer de ficção. É um livro sobre a Segunda Guerra, sim, mas é também a história de duas crianças –uma francesa e um alemão– ligadas por um rádio.

    "Investi na história dos dois e na minha paixão, que é a intersecção entre a natureza e a tecnologia. Não quis falar de Churchill, Roosevelt ou Hitler", disse à Folha por telefone de sua casa em Idaho, EUA.

    Foi em 2004, numa viagem de trem, que teve o lampejo para a obra. Na sua frente, um homem conversava com um amigo ao celular sobre um filme quando passaram por um túnel e a ligação caiu.

    "Ele começou a socar o telefone. Foi engraçado, mas meio assustador. Fiquei pensando no que ele estava fazendo, no que nós dois estamos fazendo agora. É um milagre ouvir a voz de alguém tão longe", diz. "Naquela noite comecei a escrever uma história sobre o rádio."

    Em uma viagem a Saint Malo, na França, foi juntando peças a seu quebra-cabeças. Imaginou naquela cidade destruída pela guerra uma garota lendo uma história pelo rádio, ouvida por um menino a quilômetros dali.

    Toda Luz que Não Podemos Ver
    Anthony Doerr
    Anthony Doerr
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    À trama histórica inicial foi incorporando elementos de sua vida. O livro favorito da francesa Marie-Laure ("20 Mil Léguas Submarinas", de Júlio Verne") foi também um dos que marcaram sua infância. O personagem Frederick, colega de Werner, o alemão, o faz lembrar de um dos filhos gêmeos de 11 anos, Owen.

    O personagem, sensível e segregado pelos colegas de uma escola nazista, serve como contraponto moral a Werner, que, apaixonado pela tecnologia, não vê o contexto político ao seu redor.

    No texto de Doerr não há maniqueísmo. Nem todos os alemães são maus, nem todos os franceses são bons. "Via como meus filhos aprendiam sobre a Segunda Guerra, por meio de videogames ou programas de TV e tudo parece tão simples", diz.

    "É um jeito reducionista de ver a história. Era um período muito complicado. A única forma de impedirmos que se repita é entender que indivíduos tomam pequenas decisões todos os dias que podem contribuir para um grande mal."

    A influência dos filhos também se faz sentir na forma do livro, brinca. "Como tinha só duas horas de trabalho antes de ter que fazer algo com eles, os capítulos ficaram bem curtos", diz. Cada um estende-se por não mais que cinco páginas.

    Na mesma França onde começou a traçar a história do livro, ficou sabendo que havia ganhado o Pulitzer. Tomava sorvete com os filhos quando a mulher o avisou.

    "Nunca pensei que pudesse ganhar. A ficha ainda não caiu", conta. "Meu Deus, tem tantos escritores incríveis que ganharam o prêmio. Não acho que pertença, nem remotamente, a essa lista."

    TODA LUZ QUE NÃO PODEMOS VER
    AUTOR Anthony Doerr
    TRADUÇÃO Maria Carmelita Dias
    EDITORA Intrínseca
    QUANTO R$ 39,90 (528 págs.)

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