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    Alexandre Nero faz análise para entender mundo das celebridades

    LÍGIA MESQUITA
    ENVIADA ESPECIAL AO RIO

    09/08/2015 02h00

    Alexandre Nero, 45, coloca sobre a mesa de uma sala de reunião do Projac, centro de estúdios da Globo, no Rio, uma mochila e uma bolsa que parece uma lancheira de adulto. Desta, retira uma pequena filmadora e pergunta: "Tudo bem se eu gravar [a nossa conversa]?".

    Com a resposta afirmativa, o ator e cantor curitibano ajeita a câmera, confere o enquadramento e aperta o "rec". "Não é pra pensar que tô fiscalizando o trabalho de vocês [jornalistas]", diz.

    Com 25 anos de profissão, ele conta estar registrando o seu dia a dia desde o ano passado, quando protagonizou sua primeira novela.

    A "pesquisa", como define, poderá virar um documentário. "Quero ver o que é essa maluquice de ser protagonista de uma potência como a novela das nove."

    Seu comendador José Alfredo de "Império", trama de Aguinaldo Silva acabada em março, conquistou milhares de fãs e lhe garantiu contrato de cinco anos com a Globo. Em julho, passou a ser agenciado comercialmente pela agência do ex-jogador Ronaldo.

    Com a superexposição, Nero, que chegou a cantar com Roberto Carlos no especial de Natal do ano passado, se viu, a contragosto, em uma posição de celebridade –algo que ele diz não saber ser, mas inveja quem tem esse talento. "Tem gente que chega em camarote, tira foto e se sente bem. Eu fico envergonhado."

    Com as filmagens que anda fazendo e que pretende mostrar para antropólogos e jornalistas, Nero quer entender que "surto" é esse que faz com que as pessoas o amem ou odeiem gratuitamente.

    "E por que é tão importante ou tão desimportante a opinião desse cara de uma hora para outra? E por que as pessoas querem tanto chegar perto de mim e antes não queriam?", indaga.

    Até o momento, não encontrou respostas. Mas nos próximos meses terá um vasto material para registro, já que aceitou o que define como "insanidade": protagonizar uma segunda trama das nove em um intervalo de seis meses no canal de maior audiência do país.

    Nero será Romero Rômulo em "A Regra do Jogo", que estreia no dia 31/8. O folhetim de João Emanuel Carneiro, com direção de Amora Mautner, é o mais aguardado do ano, afinal trata-se do autor e diretora do sucesso "Avenida Brasil". A trama de 2012 foi vendida para 130 países.

    O ator não estava cotado para o papel, mas, com a desistência de Murilo Benício, Amora implorou literalmente para ele fazer um teste.

    ANTIVILÃO

    Nero havia dito para si mesmo que seu próximo personagem principal de uma novela seria daqui a sete anos. "Não porque eu não quero ou não goste, mas porque fisicamente não dá!"

    Depois de muita insistência e de "conhecer melhor" o personagem, aceitou o convite. O fato de Romero ser divertido, ao contrário do comendador, ajudou no sim.

    "Existe algo de achar que o protagonista da novela é algo maior que os outros personagens. Quem diz isso não entende do ofício. Ninguém faz novela sozinho", fala.

    O personagem principal de "A Regra do Jogo", novela que abordará uma questão filosófica do que é certo e errado, do que é passível ou não de punição, é um ex-vereador que possui uma ONG de fachada para recuperação de presos. Mas é ele mesmo, na verdade, um criminoso.

    "Se o comendador foi um anti-herói, eu sinto que o Romero será um antivilão. A coisa peculiar nele é que ele não sabe muito bem quem é", conta. "Ele quer ser o bandidão, mas é um fracassado. É um bandido incompetente, uma ironia."

    O desafio, diz, será construir a dualidade de Romero. "O bacana é que o João Emanuel não subestima o público, vai dar rasteira o tempo inteiro", avisa. "E eu também não quero subestimar, dar de mão beijada: 'ah, agora ele está mentindo'."

    Nero não acredita que, de maneira geral, muitos novelistas desdenhem da capacidade de compreensão do telespectador. Para ele, se isso acontece, está relacionado ao trabalho do ator.

    Se o texto apresentar um personagem maniqueísta, que seja bonzinho, por exemplo, "por que precisa falar sempre de maneira princesinha? O ator é quem decide como dizer o texto".

    Em todas as novelas das quais participou, garante ter tido liberdade para imprimir seu tom. "O ator é um coautor. O autor que subestima isso está equivocado."

    A superexposição que ganhou com o comendador levou Nero ao divã. Desde o ano passado, além de filmar seu dia a dia, faz análise.

    NO DIVÃ

    "Eu estava enlouquecendo com a invasão da minha vida, as invenções", afirma. "Voltei pra análise para isso não invadir a minha vida, influenciar o meu trabalho. Porque senão você começa o tempo inteiro a querer agradar as pessoas."

    A maior armadilha para um artista, diz, é querer que as pessoas gostem de seu trabalho. "Tenho que gostar antes. Eu entrei no 'mainstream', mas continuo com o trabalho artesanal."

    A terapia tem ajudado Nero a se conter nas redes sociais, território em que é totalmente irônico e verborrágico. Recentemente, postou que passaria a cobrar por suas opiniões.

    "Acho que tô mais calmo, falando menos", diz. E não só via redes sociais. "Via vida! É importante falar menos, e olha que falei bastante aqui. Antigamente eu podia falar o que fosse e a coisa ficava na minha tribo, no meu universo. Agora meu universo aumentou." Imagina depois que a novela estrear...

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