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    'Funk candomblé' da banda Aláfia coloca o dedo na ferida do racismo

    GABRIELA SÁ PESSOA
    DE SÃO PAULO

    05/09/2015 02h53

    De Exu a Oxalá. Em cada música de seu segundo disco, "Corpura", a big band paulistana Aláfia saúda 11 orixás, como em uma festa pública do candomblé.

    Fé, política e raça são questões indissociáveis no som do grupo, formado em 2011. Se a melodia e o suingue são uma afirmação das matrizes africanas –dos toques do candomblé ao soul e ao rap–, as letras não fogem da treta e colocam o dedo na ferida aberta do racismo.

    "Nosso fio desencapou e você não escapa do choque/ Com a nossa rapa você não é capaz", decretam os versos de "Salve Geral", que abre os trabalhos de "Corpura". O álbum sai em 11 de setembro pela YB Music/Natura Musical e ganhará show de lançamento, no dia 20, no Auditório Ibirapuera.

    Pedro Matallo/Divulgação
    A big band paulistana Aláfia, que lança o seu segundo álbum, 'Corpura
    A big band paulistana Aláfia, que lança o seu segundo álbum, 'Corpura'

    Eduardo Brechó compõe o trio de vocalistas da banda, com Jairo Pereira e Xênia França. Para conversar com a reportagem, os três sentam-se com os sete músicos da big band na sala de dona Sueli, mãe do baixista Gabriel Catanzaro, o "QG" do grupo na zona oeste da capital paulista.

    Eles contam que a proposta artística do Aláfia é colocar em xeque a noção de conciliação das raças no Brasil.

    "Vejo que a partir dos anos 1990, principalmente com o rap em São Paulo, acontece uma negação da mestiçagem –uma 'negração' da mestiçagem", diz Brechó. "Agora, a gente chega em um momento em que as pessoas estão se identificando com isso."

    Sentimento semelhante diz ter Xênia França nos shows. "Quando vejo o público, nada me tira da cabeça que os negros querem saber das suas coisas. A gente sabe para quem está falando."

    Para os músicos –ligados aos saraus das periferias paulistanas e ao movimento negro–, não dá para falar de sua arte sem falar de política.

    Uma pergunta sobre como é conceber um disco em quase uma dúzia de pessoas sutilmente envereda para uma longa discussão sobre violência policial ("Mais um moleque que morre, para nós desespero, para eles notícia. Mais um riscado pela polícia", diz "Preto Cismado").

    Preto Cismado

    E sobre ataques a terreiros de religiões de matriz africana: "Não posso acreditar que existe um deus que feche com a segregação", canta o refrão dessa mesma música, numa levada que lembra o som do Parliament-Funkadelic.

    O funk, aliás, é uma grande referência para o Aláfia. Avesso a classificações –como quase toda banda–, aceitou o termo "funk candomblé", cunhado por um jornalista da BBC britânica, justamente pela conotação religiosa. "O funk é um estado de espírito, presente em outros gêneros", diz Brechó.

    Em tempo: o nome Aláfia, que os acompanha desde o início, é de origem iorubá. Significa "caminhos abertos".

    CORPURA
    ARTISTA Aláfia
    GRAVADORA YB Music/Natura Musical
    QUANTO R$ 25

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