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    ANÁLISE

    No teatro do Sesi, Plínio Marcos deu início a musicais biográficos

    NELSON DE SÁ
    DE SÃO PAULO

    16/09/2015 02h00

    Não sem ironia, Plínio Marcos descrevia o musical "O Poeta da Vila e seus Amores" como sua peça mais bonita. Aquela que permitiu furar a censura em pleno 1977 e voltar a ganhar algum dinheiro. Inaugurou o teatro do Sesi SP, com apoio de empresários ligados à repressão, e permaneceu em cartaz até 1979.

    Vista então, não tinha o poder do diálogo de seus clássicos dos anos 1960, "Dois Perdidos numa Noite Suja" e "Navalha na Carne", mas era de fato bonita, com cenários exuberantes de Flávio Império, elenco de 26 atores e as canções de Noel Rosa, Vadico, Wilson Batista, Chiquinha Gonzaga e Lamartine Babo.

    O dramaturgo, a partir de extenso material fornecido pelo historiador José Ramos Tinhorão, enfatizou uma dramaticidade pouco explorada. Em cena, Noel era um protagonista romântico, que começa e termina na cama, consumido por tuberculose e alcoolismo, filho e neto de suicidas. Para Plínio, um suicida.

    Dois quadros se destacavam. O da morte, mesclando versões conflitantes que existem, inclusive aquela em que ouve a canção "De Babado". E sobretudo uma sequência de 12 músicas com que ele e Wilson Batista se enfrentam, inclusive aquela em que o adversário o chama de "Frankstein", pelo defeito no queixo.

    Não foi o primeiro musical de Plínio. Já havia se arriscado no gênero em 1970, com "Balbina de Iansã", que escreveu inspirado em "Romeu e Julieta" e que, ao dirigir, transformou em musical com canções de seus amigos, como Zeca da Casa Verde.

    Os anos 70, com quatro musicais, um balé e os shows em que ele apresentava os mesmos amigos sambistas, são intermediários em sua obra –entre o início, dos personagens marginais, e o final, das peças místicas. Para muitos, um intervalo superficial, a que teria sido obrigado pelo veto às peças mais sérias.

    A visão é reducionista e algo preconceituosa com o gênero. "O Poeta da Vila" foi um experimento narrativo do autor, que buscou a forma histórica dos musicais no Brasil, com os quadros mais ou menos autônomos do teatro de revista, e a aproximou dos enredos de escola de samba, com a biografia de Noel.

    É possível localizar ali o nascimento de um subgênero nacional, os musicais biográficos –que tiveram sequência nos anos 1980 com "Ó Abre Alas" no mesmo Sesi, sobre Chiquinha Gonzaga, texto de Maria Adelaide Amaral, e que prosseguem até hoje com sucessos como "Vale Tudo, o Musical", sobre Tim Maia, texto de Nelson Motta.

    São espetáculos em que, como ocorre até nos musicais da mais alta qualidade, de Chico Buarque ou Stephen Sondheim, a dramaturgia –o roteiro ou "book", como se costuma chamar– vai para segundo plano, vencida por música, letras e encenação.

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