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    Artista usa Google Street View para refletir sobre a internet em exposição

    PHILIP GEFTER
    DO "THE NEW YORK TIMES"

    19/09/2015 02h13

    "Há um absurdo em viver numa época em que tudo é fotografado", disse o artista de origem belga Mishka Henner, enfatizando que cada pedaço de chão parece já ter sido registrado e que tudo isso está acessível on-line -incluindo alguns dos lugares mais secretos do mundo.

    Henner abraça esse absurdo para criar suas próprias imagens. Ele é parte de um crescente contingente de artistas que vem fazendo uso da capacidade de vigilância dos satélites de imagem e do Google Street View em trabalhos que refletem a forma como a era da internet alterou a nossa experiência visual.

    Ele se dispõe a enxergar à distância as múltiplas atividades humanas no planeta -seja em pastos ou em instalações militares americanas. Vistos em fotografias que cobrem paredes inteiras, esses terrenos se tornam registros do impacto humano na paisagem global.

    Henner salienta a forma como os espectadores estão cada vez mais condicionados a enxergar um mundo mediado por câmeras de vigilância. "Meu trabalho não trata apenas da vigilância", disse Henner, 39. "Trata também de estética, do surrealismo."

    É o caso de uma série que será incluída em "Semi-Automatic" -primeira exposição individual de Henner, em cartaz até 24 de outubro na Galeria Bruce Silverstein, em Nova York,- que cataloga instalações militares americanas no mundo todo.

    Henner ficou impressionado com a perversidade decorrente de expor bases ditas "protegidas". Como prova de sua acessibilidade, ele incluiu a localização de cada instalação, com sua respectiva cidade e país.

    Andy Haslam/The New York Times
    -- PHOTO MOVED IN ADVANCE AND NOT FOR USE - ONLINE OR IN PRINT - BEFORE AUG. 30 2015. -- Mishka Henner, whose exhibit “51 U.S. Military Outposts” examines some of the world’s most secretive facilities, in Manchester, England, Aug. 17, 2015. The Belgian-born artist is fascinated by the ubiquity of aerial imagery its exposure of so-called secure bases. “My work is not just about surveillance,” Henenr said. “It’s also about aesthetics, it’s about surrealism.” (Andy Haslam/The New York Times)
    O artista Mishka Henner, cujo trabalho usa satélites para revelar o impacto da ação humana na Terra

    As imagens e livros de Henner são desenvolvidos com meticuloso cuidado estético, exemplificando um desafio que museus, galerias e casas de leilões enfrentam: como categorizar a produção artística surgida na internet? Para Quentin Bajac, curador-chefe de fotografia no Museu de Arte Moderna (MoMA) de Nova York, a obra de Henner está "na encruzilhada de muitos gêneros e práticas diferentes" e, sendo assim, é "parte de uma estratégia de neoapropriação que você encontra atualmente na fotografia".

    Usando a tela do computador como ateliê, Henner abre o Google Earth, marca um local no mapa e posiciona a altura de acordo com a área que deseja incluir na imagem. Ele faz centenas de capturas de tela e as junta cuidadosamente para compor a imagem final. As fotos parecem desenhos sobre um mapa, com detalhes meticulosos que aproveitam a precisão cartográfica.

    "De início foi um gesto zombeteiro", disse Henner sobre a série "51 Postos Militares Avançados dos EUA", explicando que se inspirou nas séries "26 Postos de Gasolina" (1963) e "34 Estacionamentos" (1967), de Ed Ruscha, que cataloga a banalidade suburbana fingindo seriedade. A documentação das bases militares, no entanto, se tornou aos poucos para ele uma tipologia da hegemonia global dos EUA.

    Henner começou a usar imagens de satélite em 2010, quando ele e sua companheira, Liz Lock, documentavam as prostitutas de Manchester (Reino Unido). Ao pesquisar na internet, o artista descobriu que algumas dessas mulheres apareciam nas imagens do Street View, o que o levou a produzir a série "No Man's Land".

    Com um olho no Espaço, disse Henner, ele pôde enxergar coisas que nunca encontraria com uma câmera no solo.

    "Semi-Automatic" inclui imagens de "No Man's Land" e "Feedlots" ("pastagens"), imagens de fazendas de pecuária, incluindo uma que mostra um claro padrão de linhas quadriculadas (estábulos) e pontos (vacas) interrompido por uma massa oval e vermelha. Essa irrupção impressionista é um lago composto por esterco, contendo nitratos e antibióticos.

    "Astronomical" ("astronômico"), talvez o trabalho mais ambicioso de Henner, é uma reprodução em escala do Sistema Solar, com 12 volumes e 6.000 páginas, a ser incluído no MoMA.

    Uma imagem de cada um dos nove planetas (ele inclui Plutão) aparece em sua própria página como um pontinho na vastidão do espaço. A Terra só aparece na página 155 do primeiro volume; Júpiter, na página 283 no volume 2. O espaço entre os planetas é ocupado principalmente por páginas negras, cada uma representando uma parte da distância entre o Sol e Plutão.

    Artistas como Henner, que aproveitam cada vez mais o olhar da câmera do Google Street View, chamam nossa atenção para as questões relativas a privacidade e vigilância.

    Katrina Sluis, curadora de arte digital da Photographers' Gallery, de Londres, se refere a eles como "arqueólogos da web", navegando em "uma cultura cada vez mais informatizada" atrás de elementos da experiência humana.

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