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    Salman Rushdie condena repressão do 'politicamente correto' em Frankfurt

    DE SÃO PAULO

    13/10/2015 11h20

    Um clima de déjà-vu amargo pairou sobre a Feira do Livro de Frankfurt nesta terça (13), véspera da abertura do principal evento do mercado editorial do mundo.

    Vinte e seis anos depois de ser sentenciado à morte por um decreto religioso emitido no Irã pelo aiatolá Khomeini, por causa do seu romance "Os Versos Satânicos", considerado ofensivo a Maomé e ao islã, o escritor anglo-indiano Salman Rushddie voltou a ser alvo dos iranianos.

    Embora o governo iraniano tenha desistido, em 1998, de incentivar o cumprimento da "fatwa", em Frankfurt ficou claro que as feridas do episódio permanecem abertas.

    O anúncio de que Rushdie faria um dos discursos de abertura levou o Irã a boicotar a feira. O país alegou que convidá-lo era um desrespeito ao mundo islâmico.

    O estande oficial do Irã foi montado, mas nenhum editor apareceu. Apesar de o país oficializar a ausência na feira, alguns editores independentes, com estandes próprios, estavam presentes, conforme afirmou à Folha Marifé Boix García, vice-presidente da Feira de Frankfurt na América Latina.

    Na manhã de terça, Rushdie, que acumula uma bibliografia de crítica ao papel da religião na sociedade, contra-atacou com um discurso duro, endereçado a governos extremistas que reprimem a liberdade de expressão.

    "Publicar começa a parecer uma guerra", disse o escritor, em meio a um forte esquema de segurança.

    "Editoras e escritores não são guerreiros. Nós não temos armas ou tanques. Mas cabe a nós manter a linha, não bater em retirada, entender que esta é uma posição da qual não podemos retroceder."

    Ao lado do presidente da Feira de Frankfurt, Juergen Boos –que lamentou a ausência do Irã, mas disse que a liberdade de expressão "é inegociável"–, Rushdie exaltou o papel das editoras no combate. "Os guardiões da liberdade de expressão estão no mercado editorial. A ficção é a narrativa que contesta o mundo."

    A fala de Rushdie foi um chamado a escritores de todo o mundo para que não se abatam por mordaças –mesmo que a própria sociedade os recrimine. Ele citou alunos da Universidade de Duke (EUA) que criticaram o programa de leitura da instituição por usar uma história em quadrinhos com temática gay.

    "Os estudantes sentiram a sua educação religiosa seria ofendida por esse livro", disse. "Acho que a ideia de não desafiar intelectualmente os alunos de uma universidade é o exato oposto do que as universidades devem fazer."

    Na feira, que prossegue até domingo, Rushdie lançou seu novo romance, que chega ao Brasil em 2016 pela Companhia das Letras. "Two Years, Eight Months and Twenty-Eight Nights" (dois anos, oito meses e 28 noites) pode ser lido como fábula na linha do "Livro das Mil e Uma Noites".

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