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    Angélica Liddell revê massacre de infância em 'Hysterica Passio'

    GABRIELA MELLÃO
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    16/10/2015 02h23

    Após uma introdução em que resume sua tragédia familiar, o protagonista de "Hysterica Passio", espetáculo de Angélica Liddell que estreia sábado (17), pergunta à plateia: "E vocês, são felizes?".

    Trata-se de uma ironia. Na visão desta espanhola –uma das artistas daquele país mais cultuadas do teatro contemporâneo mundial, ao lado de Romeo Castellucci e Rodrigo García–, não há felicidade possível.

    "Sinto profunda inclinação para falar sobre a lama na qual estamos presos. A vida é uma história de terror", diz, em entrevista à Folha.

    O espetáculo, montado aqui pela Teatro Kaus Companhia Experimental, integra o Tríptico da Aflição, sobre as dores da primeira idade. "Esta trilogia é minha tentativa de discutir a tirania do sangue, o amor obrigatório que gera abuso, terror e tensão", explica a artista.

    Lenise Pinheiro/Folhapress
    Sao Paulo, SP, Brasil. Data 12-10-2015. Espetáculo Hysterica Passio. Atores Amalia Pereira e Alessandro Hernandez. Espaço dos Parlapatoes. Foto Lenise Pinheiro/Folhapress
    Amália Pereira e Alessandro Hernandez em "Hysterica Passio"

    Como toda obra de Liddell, "Hysterica Passio" tem tintas autobiográficas. Nela, a autora ficcionaliza o que chama de massacre da infância. "Todo crescimento é um trauma, uma marca. E, quando você se transforma em adulto, tenta se vingar de toda a sacanagem que viveu", diz.

    A peça apresenta um acerto de contas familiar realizado por um filho (Hipólito) que foi violado pela mãe (Thora).

    No espaço dividido em três nichos, um habitado por cada personagem, a mãe surge presa em uma jaula, símbolo de seu aprisionamento físico e psicológico. Nela, revive memórias e é vingada pelo filho.

    Para Amália Pereira, atriz que vive o papel, a personagem é resultado de rejeições sofridas por sua mãe e seu marido. "A dor de não conseguir amar, ser amada ou sentir prazer reverbera em Thora um inflar de sentimentos contidos que são descarregados em seu filho", conta.

    A atriz busca uma interpretação marcada por sentimentos ambíguos como ódio e amor, desejo e frigidez, vida e morte.

    Em sua pesquisa, o diretor Reginaldo Nascimento traça um paralelo entre a história da família de Thora com a de pacientes do século 18 diagnosticadas com histeria feminina –que recebiam, como tratamento, estimulação manual dos genitais até atingirem o orgasmo.

    "Buscamos esse estado de histeria na construção de Thora. Com toda sua fúria, ela penetra o filho com objetos e com sua própria carne, deixando marcas que geram o desejo de vingança", explica.

    Para Nascimento, Angélica Liddell revela o veneno escondido da humanidade. Grita a tragédia do homem, cujo fim inevitável é a morte. "Que pelo menos possamos tocar nos monstros de nós mesmos, enquanto ainda caminhamos vivos", diz o diretor.

    HYSTERICA PASSIO
    QUANDO sáb. e dom., às 20h; até 13/12
    ONDE Espaço Parlapatões, pça Franklin Roosevelt, 158, tel. (11) 3258-4449
    QUANTO R$ 40
    CLASSIFICAÇÃO 14 anos

    Edição impressa

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