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    RÉPLICA

    Crítico perdeu a chance de ver onde reside a obra de Piccinini

    MARCELLO DANTAS
    DE ESPECIAL PARA A FOLHA

    22/10/2015 02h45

    Surpresa não é a palavra com que recebi a crítica de Fabio Cypriano sobre a exposição "ComCiência". ["Patricia Piccinini exibe obras realistas com discurso imbecil", Ilustrada, 18.out, pág. C8].

    Em 2014, o jornalista escreveu uma crítica similar em relação à mostra "Ciclo", também curada por mim e outro sucesso de público no Centro Cultural Banco do Brasil.

    Em ambos os casos, me surpreende o desinteresse em ouvir o que os autores, artistas e curadores têm a dizer, não deixando brecha para o adensamento de uma discussão tão atual quanto essa de construção de público no contexto brasileiro.

    Minha prática como curador já soma 25 anos e mais de 200 exposições pelo mundo afora.

    Rahel Patrasso/Xinhua
    (151012) -- SAO PAULO, octubre 12, 2015 (Xinhua) -- Una persona toma una fotografía de la obra "The comforter" durante la inauguración de la exhibición individual de la artista Patricia Piccinini llamada "ComSciencia", en el centro de Sao Paulo, Brasil, el 12 de octubre de 2015. De acuerdo con los organizadores, esta es la primera exhibión individual de la artista en Brasil, en donde se presentan esculturas, videos, fotografías y dibujos que reflejan los últimos 15 años de su trabajo. (Xinhua/Rahel Patrasso) (rp) (da) (sp)
    "The Comforter", obra de Patricia Piccinini exposta no CCBB

    O Brasil pôde conhecer a obra de artistas como Anish Kapoor, Laurie Anderson e Brian Eno, dos tantos que confiaram a mim a tradução de seu trabalho para o público. Além disso, sou responsável pela direção artística de 11 museus de sucesso, como o Museu da Língua Portuguesa e o Museu do Caribe (Colômbia).

    Tenho consciência de que minha prática multidisciplinar não se encaixa nos discursos tradicionais da crítica, contudo o jornalista demonstra desconhecer o cerne da minha ação cultural, que é exatamente o que parece lhe gerar a maior desconfiança: a construção de público, a criação de novas narrativas e a extensão de uma ponte generosa entre a arte contemporânea e os brasileiros que não tiveram oportunidade de se aproximar desse circuito.

    Faço questão de simplificar códigos cifrados para criar uma porta convidativa ao grande público. Isso com o aval dos artistas e usando suas próprias palavras, adequadas à linguagem do público jovem, que é o meu foco.

    Essa é uma das razões da receptividade das exposições e museus feitos por mim: as pessoas se sentem parte daquilo. Encher museus é um mérito em qualquer lugar do mundo. Os museus e centros culturais brasileiros despontaram na percepção mundial e em números de visitação porque ousaram criar linguagens mais inclusivas.

    Curioso ver como o jornalista muda de opinião: em 2003, escreveu artigo na Folha em que exalta a obra e a capacidade de Piccinini de gerar interesse no grande público. O que claramente era valor para o autor antes por alguma razão se apresenta agora como defeito. Por que será?

    O crítico perdeu a oportunidade de observar onde reside de fato a obra de Patricia: na transformação do público.

    É vendo que lhe desagradei que confirmo a certeza do que estou fazendo. Não se cria o novo sem ultrajar alguns feudos antigos. Enquanto ele usa termos rasos e desatentos, eu abraço o público legitimamente ansioso por vivenciar arte sem os preconceitos na cabeça. Sei que você não gosta de mim, mas seus alunos gostam.

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