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    'Hamlet' de Benedict Cumberbatch causa histeria em Londres

    LUCAS NEVES
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM LONDRES

    23/10/2015 02h25

    Há algo de eufórico no reino da Dinamarca.

    No palco do Barbican Centre, em Londres, onde uma badalada montagem de "Hamlet" cumpre temporada até o dia 31 de outubro, o luto pelo assassinato de seu pai e a alternância entre melancolia e fúria ainda carcomem o personagem-título, herdeiro do trono nórdico.

    Fora dali, no entanto, a atmosfera é mais solar –até onde o adjetivo cabe num contexto londrino.

    A encenação, em cartaz desde agosto, bateu recordes de compra antecipada de ingressos e fez parte da crítica inglesa mandar às favas a praxe de só publicar críticas no dia de estreia (e não durante a fase anterior de ensaios abertos, em que se realizam ajustes).

    Tampouco passou incólume a escolha da diretora Lyndsey Turner de adiantar o solilóquio "ser ou não ser" do terceiro ato para a abertura. A grita foi tamanha que ela capitulou, devolvendo a fala ao meio do texto –mas, "haters gonna hate" (odiadores odiarão), ainda fora de sua posição original (ato 3, cena 1).

    Johan Persson
    HAMLET by Shakespeare,, Writer - William Shakespeare, Director - Lyndsey Turner, Set design -Es Devlin, Lighting - Jane Cox, The Barbican, 2015, Credit: Johan Persson/ Cena de Hamlet, peca com Benedict Cumberbatch. ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    Benedict Cumberbatch em "Hamlet"

    Preciosismos artísticos à parte, a causa real da celeuma é Benedict Cumberbatch, 39, ator inglês catapultado ao "tietismo" global por filmes como "O Jogo da Imitação" (2014), mas sobretudo pelo papel-título da série da BBC "Sherlock".

    Foi por causa dele que hordas de fãs se depararam com mensagens como "há 34 mil pessoas à sua frente na fila" ao acessar o site do Barbican em 11 de agosto de 2014 para tentar garantir tíquetes do primeiro lote.

    As entradas para as 12 semanas de temporada, cada uma com sete sessões (num teatro de 1.166 assentos), evaporaram em sete horas.

    Há relatos de "Cumberbitches" (ou "Cumberbabes", na versão mais leve, apelido que se dá às fãs do britânico) saindo do Japão, da Nova Zelândia, do Peru e de outras lonjuras só para ver o ator em carne, osso e ruividão.

    O frenesi motivou um editorial do jornal britânico "The Guardian", "Hora de acalmar a histeria" (publicado em 14 de agosto). Não surtiu grande efeito, a julgar pela bilheteria da transmissão ao vivo da sessão da última quinta (15) para 1.400 cinemas de 25 países.

    Cerca de 225 mil pessoas testemunharam na tela grande a espiral trágica do príncipe, um recorde na série National Theatre Live, da qual a transmissão fazia parte.

    ACAMPAMENTO CUMBER

    O Barbican guardou 30 ingressos para venda in loco horas antes de cada sessão. Leva quem chega primeiro. Às 10h da manhã do último sábado (17), quando abriram os guichês, um dos primeiros da fila (formada por quase 120 pessoas) era Samuel Gilstrap, 43, empresário.

    Ele chegara às 17h do dia anterior, liderando 18 mórmons "dos 12 aos 50 anos" vindos de Guildford, no sul do país –a tropa toda munida de sacos de dormir, cadeiras, cookies e computador para ver futebol americano e remediar os 9 graus Celsius da madrugada ao relento.

    "Me sinto mal pelas outras pessoas na fila [risos]. Em nosso grupo, alguns adoram o Cumberbatch, outros o Shakespeare", disse ele, sem dar nome aos bois. "Mas, para a molecada, vale sobretudo pela aventura [de acampar na porta do teatro]."

    Não longe dali estavam Tasnia Nizam, 24, que trabalha no ramo da edição, e três amigas. "Cumberbatch não é a principal razão para eu estar aqui. Gosto da peça, li críticas sobre essa montagem e fiquei curiosa. Jamais acamparia por ele", afirmou, para logo ser cortada por uma das colegas, Oalda Clemente, 24. "Vou ser sincera: para mim, Benedict é, sim, a principal razão para estar aqui."

    O quarteto só conseguiu ingressos para assistir de pé às mais de três horas de espetáculo.

    No fim, correu (Tasnia inclusive) para a entrada do Barbican reservada a atores e técnicos para tentar ver Cumberbatch de perto, que deu bolo na multidão. Suspiros audíveis e expressões de desolação tomaram a cena quando um membro da produção anunciou que a estrela não daria o ar da graça – descansava para a sessão noturna.

    O resto é silêncio.

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