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    DEPOIMENTO

    Meu trauma em ensaio de grupo teatral foi beijar um peixe na boca

    GUSTAVO FIORATTI
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    28/10/2015 02h20

    Não era uma festa estranha exatamente, era um ensaio da Mundana Companhia, parte do processo de criação do espetáculo "Na Selva das Cidades - Em Obras", com texto de Bertolt Brecht (1898-1956), em um galpão na região da Luz, centro de São Paulo.

    Ok: tomada hoje alguma distância daquela tarde em fevereiro, talvez dê para chamar de festa estranha, ao menos para um jornalista habituado à rua Augusta e, no máximo, a algumas situações de sobredosagem. Convidado para o papel de testemunha, acabei em uma roda de artistas que massageavam um os pés dos outros entre goles de Catuaba.

    Para criar um espetáculo, a Mundana experimenta –no sentido mais intransitivo que esse verbo possa ter. Leva coisas à boca, navega por lugares desconhecidos da cidade, propõe uma farra em um lugar imaginário, naquela ocasião batizado como Taiti e orquestrado com menções ao texto original de Brecht.

    Meu primeiro trauma com o Taiti foi o beijo na boca de um peixe morto, que dançava como marionete nas mão do ator Lee Taylor, momento antes de ser descamado e ir à panela. Todos beijaram, não seria eu o único a recusar.

    A performance para descamar o peixe recompensou o sabor azedo, foi de uma beleza primitiva. Passavam o facão sem cuidado enquanto dançavam ao som de instrumentos percussivos. Escamas voavam para todos os lados, refletindo no ar estalos da luz do sol.

    Passados alguns dias do ensaio, perguntei a Aury Porto, ator e um dos fundadores do grupo, se algo daquela passagem sobrava no palco. Impreciso, disse que tudo poderia acontecer. Cenas poderiam ser transpostas. Se nada restasse, tudo bem. "Mas alguma coisa sempre resta."

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