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    Andrucha Waddington leva rotina caótica de hospitais cariocas ao cinema

    LUIZA FRANCO
    DO RIO

    29/10/2015 02h50

    Na sala de emergência de um hospital público no Rio, o médico de plantão atende um soldado e um traficante, ambos baleados numa operação policial numa favela vizinha.

    Precário, o hospital não tem pessoal nem equipamento para operar os dois. Quem o médico escolhe salvar?

    A escolha de Sofia parece uma pergunta de pesquisa acadêmica sobre ética, mas é factível que médicos cariocas tenham que encará-la na tensa rotina dos hospitais públicos. É sobre esta e outras encruzilhadas que fala o filme "Sob Pressão", de Andrucha Waddington, previsto para o segundo semestre de 2016.

    O longa é inspirado no livro "Sob Pressão - A Rotina de Guerra de Um Médico Brasileiro" (ed. Foz, 2014), escrito pela jornalista Karla Monteiro a partir de depoimentos do médico carioca Márcio Maranhão. Ele relata como seu idealismo profissional foi corroído pela rotina nos hospitais em que trabalhou por 15 anos.

    DECADÊNCIA

    A Folha acompanhou a filmagem da cena descrita. As gravações começaram no domingo (25), em um hospital que tem uma história parecida com a que o longa narra.

    É público, serviu bem seus pacientes no início do século 20, mas está em decadência, parcialmente desativado. Trata-se do Hospital Nossa Senhora das Dores, da Santa Casa, em Cascadura, zona norte do Rio. Todo o filme será rodado lá. "Queríamos dar o máximo de realismo possível", diz Waddington.

    Maranhão é o consultor técnico do filme –uma espécie de fiscal do realismo das cenas. Antes do início das filmagens, ele conduziu os atores por plantões na cidade.

    Enquanto o livro é um desabafo em primeira pessoa sobre mais de uma década de serviço, o longa é um retrato de 24 horas num plantão.

    Além do policial e do traficante, também chega ao hospital uma criança baleada, filha de um dono de jornal. Com os parcos recursos da clínica, o drama está montado.

    Júlio Andrade, que já foi Paulo Coelho, Gonzaguinha e Raul Seixas no cinema, interpreta o protagonista, o médico Evandro. Seu parceiro é vivido por Ícaro Silva, que por sua vez viveu Wilson Simonal no musical sobre o cantor. Stepan Nercessian, de "Chacrinha, o Musical", faz o diretor do hospital, Samuel. "Lá, tudo se opera quase como milagre", diz Nercessian. A administradora do local é Andrea Beltrão.

    Escolhas de vida ou morte em situações extremas não são exclusividade da medicina brasileira. A própria palavra "triagem" –seleção– tem origem na francesa "triage", que era usada nesse contexto pelo cirurgião-chefe do exército de Napoleão (1769-1821).

    A jornalista americana Sheri Fink ganhou o prêmio Pulitzer por uma reportagem sobre as escolhas que médicos americanos tiveram que fazer após a tragédia do furacão Katrina, que arrasou a cidade de Nova Orleans, em 2005.

    A diferença é que, no Brasil, a precariedade faz parte da rotina. "Num contexto de saúde pública sucateada, decisões do tipo que o filme narra fazem parte do dia a dia do médico. Elas são feitas à beira do leito, olhando na cara do doente", diz Maranhão.

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