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    Com raridades, mostra inédita marca 80 anos da morte de Fernando Pessoa

    MARIA CLARA MOREIRA
    DE SÃO PAULO

    06/11/2015 17h30

    O estreia da revista "Orpheu" atesta a máxima da genialidade incompreendida por sua geração. Em 1915, ano de sua concepção, foi com escárnio que os círculos portugueses de artistas e literatos receberam a publicação de Mário de Sá-Carneiro, Almada Negreiros e Fernando Pessoa –tachados de loucos.

    Um século mais tarde, seus dois únicos volumes são o ponto de partida da mostra "Fernando Pessoa: Uma coleção", aberta ao público no Mepe (Museu do Estado de Pernambuco) a partir desta sexta (6).

    A exposição marca os 80 anos da morte do poeta pioneiro do movimento modernista, em 30 de novembro de 1935. Ela reúne a coleção pessoal do advogado e escritor pernambucano José Paulo Cavalcanti, 67, autor de "Fernando Pessoa - Uma Quase Autobiografia" (editora Record, 2011), vencedor do Prêmio Jabuti na categoria.

    Divulgação
    Retrato do poeta português Fernando Pessoa na infância, parte do coleção do escritor e advogado José Paulo Cavalcanti exposta no Museu do Estado de Pernambuco ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    Retrato do poeta português Fernando Pessoa aos 5 anos, parte do coleção do escritor e advogado José Paulo Cavalcanti exposta no Museu do Estado de Pernambuco

    O amor ao poeta português e seus 127 heterônimos data de 1966. À Folha, Cavalcanti relembra a descoberta de Pessoa como um de três momentos "de terror" em que percebeu estar diante de algo único: o primeiro foi ao descobrir Bach; o segundo, a leitura de "Cem Anos de Solidão"; o terceiro, ao ouvir o poema "Tabacaria" na voz de João Villaret. "Foi como se Deus, enjoado do paraíso, decidisse viver essa tragédia urbana com eles", explica.

    Há 15 anos, os exemplares da "Orpheu" deram início à coleção de raridades do escritor. Hoje, ela reúne peças como o caderno com manuscritos originais do poeta, a assinatura de Ricardo Reis, o lorgnon –óculos antigos com apenas uma haste— dourado que ele usava e cartas que escreveu ao editor e poeta Antônio Botto e ao escritor Luís de Montalvor —pseudônimo de Luís Felipe da Gama da Silva Ramos. Com curadoria de Renata Pimentel e projeto expositivo de Otávio Falcão e Rinaldo Carvalho, eles ficarão expostos no Mepe até 6 de dezembro.

    "A intenção da iniciativa é mostrar um pouco o homem, já que o poeta já é reconhecido. Tanto que não são só artigos dele, mas outros que o influenciaram", explica Cavalcanti. Entre os últimos está a primeira edição de "Os Lusíadas", de Camões, um dos favoritos de Pessoa.

    Entre os tesouros, colecionador exalta seus preferidos: "Há a mesa em que ele trabalhava, sua máquina de escrever e o livro que carregava no bolso do pijama ao morrer, 'Sonetos Escolhidos', de Bocage", conta. "Há também a edição de prova do livro 'Mensagem', que Pessoa presenteou a seu primo. É repleto de anotações, mas o livreiro que me vendeu não abriu o livro para ver e me cobrou só pela dedicatória", ri.

    Completos quase 50 anos desde que foi apresentado ao poeta português, o escritor brasileiro diz estar na hora de se dedicar a outros projetos. "Não posso ser viúva dele pelo resto da vida", brinca.

    Divulgação
    Lorgnon (óculos antigos com apenas uma haste) dourado do poeta Fernando Pessoa, parte da coleção do escritor e advogado brasileiro José Paulo Cavalcanti, exposta no Museu do Estado de Pernambuco ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    Lorgnon (óculos antigos com apenas uma haste) dourado do poeta Fernando Pessoa, também exposto na mostra do Museu do Estado de Pernambuco

    Cavalcanti diz ter a intenção de doar todos os itens do poeta que possui a uma instituição após sua morte. "A unidade é o que mais importa. Não passei anos reunindo esses artefatos para que meus filhos repartam entre si. Não tem graça nisso. A coleção tem valor inestimável, mas junta", declara. "Desconfio que ele [Pessoa] é mais amado no Brasil que em Portugal, então [a coleção] deve ficar por aqui."

    Por enquanto, as raridades ficam no Recife até que a mostra desembarque em outras capitais do país, o que o escritor tem certeza que acontecerá, mas depois do Carnaval. "Antes disso, tudo para", ri.

    Seu bom humor foi traduzido na "Pessoamania", parte final da exposição, que reúne objetos com a cara do poeta, como canetas e suvenires.

    "É a parte profana. Minha mulher não queria que eu a incluísse, mas eu gosto. As pessoas param para tirar fotos abraçadas com uma representação do Pessoa no cenário da casa dele e saem rindo. É bom quando é assim."

    O Mepe também recebe a exposição "Fernando Pessoa - Vida e Obra", no hall do Espaço Cícero Dias. Ao todo, são 50 obras de artistas plásticos inspiradas no poeta português. A iniciativa conta com nomes como José Cláudio, Mane Tatu, Mauricio Arraes, Roberto Ploeg, Pragana, Margot Monteiro, Álvaro Caldas e Rinaldo Carvalho.

    FERNANDO PESSOA - UMA COLEÇÃO
    QUANDO de 6 de novembro a 6 de dezembro de 2015; de terça a sexta, das 9h às 17h, sábados e domingos das 14h às 17h
    ONDE Museu do Estado de Pernambuco (Mepe), av. Rui Barbosa, 960 - Graças, Recife
    QUANTO de R$ 3,00 (meia) a R$ 6,00 (inteira)

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