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    CRÍTICA

    Espaço à imaginação e elenco sustentam o delicado 'Ausência'

    ANDRÉ BARCISNKI
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    27/11/2015 02h55

    Não é fácil a vida de um filme pequeno e delicado em meio a um circuito comercial dominado por títulos como "007" e "Jogos Vorazes". "Pequeno" em termos, porque "Ausência" tem muito a dizer, embora o faça com economia de recursos e simplicidade.

    Dirigido por Chico Teixeira, (des)conhecido do grande público pelo surpreendente "A Casa de Alice" (2007), "Ausência" gira em torno da história de um adolescente, Serginho (Matheus Fagundes) e dos personagens que orbitam seu mundo.

    O principal deles, e um que vai marcar a vida do menino, é justamente o "ausente" do título do filme: o pai, que abandona a família e deixa Serginho morando com a mãe (Gilda Nomacce) e um irmão menor. O pai só aparece no início, tirando seus pertences de casa. Dali em diante, o menino faz de tudo para superar a perda da figura paterna.

    Divulgação
    Cinema: os atores Matheus Fagundes (esq.) e Thiago de Matos em cena do filme "Ausência", de Chico Teixeira. (Foto: Divulgação)***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    Matheus Fagundes (esq.) e Thiago de Matos em cena do filme "Ausência", de Chico Teixeira

    Serginho torna-se o verdadeiro "homem" da casa: ajuda nas despesas familiares trabalhando numa feira livre com um tio, toma conta do irmão e socorre a mãe depois de suas habituais ressacas pós-bebedeira (em uma cena particularmente bonita, o menino a consola como se fosse ele o adulto).

    A falta do pai leva o menino a se envolver com uma figura um tanto misteriosa, Ney (Irandhir Santos), um cliente que vira amigo e confidente.

    É na feira que vira adulto: ele sofre bullying e pequenas violências nas mãos de um feirante, se interessa por Silvinha (Andreia Mayumi), que trabalha em uma barraca de peixe, e faz amizade com Mudinho (Thiago de Matos), um rapaz que vive de biscates.

    O tio, Lazinho (Antonio Ravan), menciona que o pai de Serginho ainda deve dinheiro a muita gente. O roteiro não se preocupa em detalhar essas histórias, porque não é necessário: o caos da vida do menino está evidente.

    Uma das maiores qualidades do filme é justamente a de não explicitar tudo para o espectador e deixar muito a cargo da imaginação.

    Há cenas que sugerem certas coisas –o sangramento no nariz de Serginho, a maneira mais do que carinhosa com que o professor Ney olha para o menino, os atalhos que ele usa para não esbarrar com o chucro que o ameaça– que estão ali para complementar e enriquecer a história.

    CIDADE CINZA

    O cenário de "Ausência" é a São Paulo suburbana da classe média baixa, uma cidade cinza, feia e poluída, que parece não trazer nenhuma esperança de dias melhores. A fotografia realista e crua de Ivo Lopes Araújo não adiciona verniz ou brilho à aridez da metrópole, realçando seu clima melancólico.

    Outro ponto forte de "Ausência" é o elenco. Gilda Nomacce e Irandhir Santos são grandes atores e estão perfeitos. Mas o elenco jovem surpreende, especialmente Matheus Fagundes, que leva cenas longas e dramáticas ao lado de Nomacce e Santos com segurança. Enfim, um filme de muita qualidade e que merece encontrar seu público.

    AUSÊNCIA
    DIREÇÃO Chico Teixeira
    ELENCO Matheus Fagundes, Irandhir Santos, Gilda Nomacce
    PRODUÇÃO Brasil, Chile, França, 2015, 12 anos
    QUANDO em cartaz
    AVALIAÇÃO muito bom

    ANDRÉ BARCINSKI é jornalista e autor do livro "Pavões Misteriosos" (Três Estrelas)

    Edição impressa

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