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    'The Pickle Index' é livro-aplicativo feito para confundir os leitores

    ANGELA BOLDRINI
    DE SÃO PAULO

    28/11/2015 03h20

    Em uma sociedade distópica, um diretor de circo é preso pelo governo totalitário e a trupe parte em seu auxílio. Nas buscas, Flora Bialy, uma das circenses, faz um diário secreto usando um aplicativo para celulares cujo uso é obrigatório para os cidadãos.

    Apresentado dessa forma, "The Pickle Index" (o índex do picles) poderia ser um livro comum, com uma trama (de insurreição contra um governo) que segue a onda do best-seller "Jogos Vorazes".

    Mas seu formato, ao menos, é inusitado. Trata-se de um livro-aplicativo, criado pelo britânico Russell Quinn e pelo americano Eli Horowitz, que mistura uma espécie de game com a leitura.

    Divulgação
    O livro 'The Pickle Index', na versão capa dura
    O livro 'The Pickle Index', na versão capa dura

    "A ideia surgiu no meio do debate sobre as novas tecnologias", conta Horowitz à Folha. "Nós queríamos fazer uma história que pudesse ser contada nos dois formatos e que realmente os utilizasse como parte do enredo."

    O livro foi lançado em três versões: brochura (um tomo), capa dura (dividido em dois volumes) e o aplicativo.

    No app, o leitor é transformado em membro daquela sociedade. Como se fosse um morador, recebe notificações diárias do local fictício.

    O "índice", que leva aos capítulos da trama, é ainda um compartilhador de receitas –como "picles fermentados"–, e o usuário recebe uma nota do governo baseada na quantidade que compartilha (por e-mail, redes sociais etc).

    "É como se fosse um dispositivo de propaganda, para manter a moral do povo", explica Quinn. "Mas Flora percebe que ninguém lê, só compartilham automaticamente e decide usá-lo como diário."

    Estranhou? É exatamente esse o objetivo dos autores. "É uma experiência de imersão total", diz Horowitz.

    Assim, a história dura dez dias no mundo ficcional e é contada no mesmo intervalo de tempo no mundo real, por meio dos boletins diários e das "receitas" de Flora. Não há instruções, o que torna "Pickle" bastante confuso para usuários de primeira viagem.

    "É uma questão de quebra de expectativa: com o livro, faz parte da diversão ler e descobrir o que está acontecendo só no meio do caminho", diz Quinn, responsável pela programação do app.

    "Já um aplicativo é uma ferramenta, então normalmente você não espera ter que descobrir nada nele."

    Menos imersiva, a versão capa dura também é feita para confundir a princípio.

    Segundo Quinn, os textos são "95% iguais". Separados em dois volumes, contam a história pela versão oficial e de Flora, fazendo o leitor pular de um livro ao outro.

    MERCADO

    Livros em aplicativo de celular não são exatamente novidade: em 2010, uma versão de "Alice no País das Maravilhas", de Lewis Carroll, fez estourar o formato nos EUA. No ano seguinte, "On The Road", de Jack Kerouac, também foi parar em celulares e tablets.

    Há inúmeros livros transformados em aplicativo, com mapas, vídeos e outros penduricalhos. No entanto, ainda são poucos os feitos especificamente para esse formato, como "The Pickle Index".

    "Os leitores estão muito mais ávidos por um novo formato que o mercado", afirma Horowitz, que, antes de se juntar a Quinn e criar o selo Sudden Oak, trabalhava editando livros (em papel) na McSweeney, editora independente de São Francisco. "O mercado sempre quer conservar as coisas como estão –e ninguém sabe como fazer dinheiro com isso ainda."

    Um dos poucos exemplos de aplicativos do tipo lançado antes de "Pickle" é um trabalho da dupla. "The Silent History", de 2012, a primeira incursão dos dois ao mundo digital.

    "Aprendemos muito de lá para cá", diz Horowitz. "Em 'Pickle', por exemplo, queríamos que a história tivesse um motivo interno para ser em porções, o que não acontecia no 'Silent History'."

    E, afinal, por que escolher picles como alimento central de um aplicativo de receitas?

    "Ele pode ser feito a partir de quase qualquer alimento, e você só faz conserva quando sabe que aquilo vai ficar em falta. É uma forma de mostrar a situação precária daquela sociedade", explica o editor. "Além disso, eu adoro picles", ri.

    THE PICKLE INDEX
    AUTORES Eli Horowitz e Russell Quinn
    EDITORA Sudden Oak
    QUANTO US$ 4,99 (na Apple Store); US$24 (capa dura) e US$ 9 (brochura)

    Edição impressa

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