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    crítica

    Início de Garrel como diretor vislumbra carreira marcante

    RICARDO CALIL
    CRÍTICO DA FOLHA

    01/12/2015 02h00

    Há algumas razões para que o ator francês Louis Garrel estreie como diretor de longas, em "Dois Amigos", com a maturidade de um veterano.

    A primeira é, digamos, hereditária. Ele é filho de Philippe Garrel, notável cineasta, e foi dirigido pelo pai em "Amantes Constantes" (2005) e "O Ciúme" (2013), entre outros.

    A segunda é curricular. Com apenas 32 anos, Louis já trabalhou com uma lista bastante respeitável de diretores, como Bernardo Bertolucci ("Os Sonhadores", 2003), Bertrand Bonello ("Saint Laurent", 2014) e Christophe Honoré ("A Bela Junie", 2008).

    Divulgação/Imovision
    Os atores Louis Garrel e Golshifteh Farahani em cena de "Dois Amigos", primeiro longa dirigido por Louis Garrel. Divulgação Imovision ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    Garrel e Goldshifteh Farahani em cena de 'Dois Amigos'

    A terceira, sem a qual as outras duas seriam inúteis, é a sensibilidade para absorver essas influências variadas e oferecer um olhar particular para o universo que aborda.

    Talvez a principal lição aprendida com esses mestres do cinema contemporâneo tenha sido a de preservar o mistério de seus personagens.

    Com roteiro escrito em conjunto com Honoré, "Dois Amigos" tem uma premissa simples: um triângulo amoroso entre uma mulher, um homem e seu melhor amigo.

    Ela é Mona (a luminosa iraniana Golshifteh Farahani), uma condenada que tem permissão de deixar a prisão para trabalhar em um quiosque de uma estação de trem.

    O apaixonado é Clément (Vincent Macaigne), um ator tímido e psicologicamente instável. E seu melhor amigo é Abel (Louis Garrel), um vigia extrovertido e com pretensões de se tornar escritor.

    O filme nunca esclarece o motivo da prisão de Mona. Nem a razão da fragilidade mental de Clément. Nem o que uniu seres tão díspares quanto ele e Abel em uma amizade tão longeva quanto imperfeita. Esses enigmas só aumentam o encanto do filme.

    O ponto de partida lembra a peça "Cyrano de Bergerac", mas com uma inversão: aqui o belo (Abel) é ainda o que domina as palavras e irá ajudar Clément a conquistar Mona.

    Claro, as coisas dão errado: por causa dos dois amigos, Mona não consegue retornar à prisão depois do trabalho, interessa-se por Abel e abala a amizade deste com Clément.

    O filme vai acompanhar dois dias e duas noites em que os três erram por Paris –o que dá a Garrel a chance de nos oferecer alguns belos momentos.

    O maior deles é quando Clément leva Mona e Abel para atuarem como extras em um filme sobre uma manifestação de maio de 1968 –o que remete a "Amantes Constantes" e a "Os Sonhadores".

    Ali, em meio à reencenação desse momento central da história francesa, Garrel consegue criar um balé de sedução e de negação sutil e sofisticado.

    Nem tudo é perfeito: a errância dos personagens acaba por contaminar o filme –e, em seu terço final, a sensação é de uma narrativa girando em falso, repetindo situações e conflitos.

    Ainda assim, essa bela e estranha ode à amizade é uma estreia alentadora, que vislumbra uma carreira marcante de Garrel também na direção.

    DOIS AMIGOS
    (LES DEUX AMIS)
    DIRETOR Louis Garrel
    ELENCO Golshifteh Farahani, Vincent Macaigne, Louis Garrel
    PRODUÇÃO França, 2014, classificação não informada
    QUANDO estreia nesta quinta (3)

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