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    CRÍTICA

    Filme sobre cozinheiro neurótico reduz gastronomia a figurante

    ALEXANDRE AGABITI FERNANDEZ
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    10/12/2015 02h18

    Elevados à condição de gênios, cozinheiros viraram celebridades, são tratados pela afetada denominação de "chefs" e estão em todo lugar, dos programas de TV ao cinema.

    "Pegando Fogo" conta a história de Alan Jones (Bradley Cooper), que quer abrir simplesmente "o melhor restaurante do mundo" e conseguir as sonhadas três estrelas do guia "Michelin".

    Jones conquistou a segunda estrela em um restaurante parisiense. Mas o sucesso subiu-lhe à cabeça, e ele se tornou irascível com seus comandados e se afundou no álcool e nas drogas. Anos depois, livre dos vícios, tenta reconstruir sua reputação em Londres –algo pouco verossímil na alta gastronomia.

    Divulgação
    Créditos: Divulgação Legenda: Cena do filme "PEGANDO FOGO" ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    Bradley Cooper em cena de "Pegando Fogo"

    Na capital inglesa, ele monta uma equipe com jovens cozinheiros e começa a busca pelo Santo Graal. Mas os fantasmas do passado não tardam a reaparecer: credores de Paris ressurgem para cobrar uma vultosa dívida, e Jones mostra que continua arrogante e irritadiço.

    O filme, aliás, dá muito mais espaço ao temperamento neurótico desse cozinheiro narcisista, arrogante e pretensioso do que às supostas maravilhas gastronômicas que é capaz de produzir. Em suas frequentes explosões de ira, Jones berra, xinga, quebra pratos, atira panelas e humilha quem estiver pela frente.

    Esses surtos e a predileção pela intimidação lembram muito o britânico Gordon Ramsay –estrela de uma série de programas de televisão. Não é coincidência, já que Bradley Cooper conversou bastante com Ramsay para compor o personagem.

    O grande rival de Jones também se caracteriza pelos acessos de fúria, destruindo mesas e cadeiras de seu próprio restaurante, cego de raiva e inveja do concorrente. É claro que a busca da excelência pode ser estressante, mas o exagero é levado ao extremo.

    A obsessão pela perfeição que o filme celebra é outro tolo excesso, pois ela se faz por meio da apologia da violência, da adrenalina. Obedece à motivação contemporânea do sucesso a qualquer preço.

    A cozinha é o principal cenário do filme e não se vê ninguém tendo prazer em cozinhar. A elaboração dos pratos, a discussão sobre ingredientes e outras especificidades da gastronomia, que seriam um aspecto importante em um filme com essa temática, brilham pela ausência.

    Frenéticas, fatiadas por uma montagem agitada, as cenas dos "chefs" em ação não mostram nada além de tensão e correria. Os alimentos aparecem em rápidos primeiros planos, são meros figurantes e não um deleite para os olhos.

    No meio dessa balbúrdia, a historinha de amor de Jones com Helène (Sienna Miller), sua assistente, é mais uma gota num oceano de mediocridade. Redutor, cheio de clichês e sem uma história para contar, o filme é intragável.

    Pegando Fogo (Burnt)
    DIREÇÃO John Wells
    ELENCO Bradley Cooper, Sienna Miller, Daniel Brühl, Omar Sy
    PRODUÇÃO EUA, 2015, 12 anos

    Edição impressa

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